Terraço, Avenida da Índia
Agora está fragilizado, quase abafado em publicidade, mas o Terraço já foi um dos painéis de azulejos modernos mais admirados de Lisboa. Começou com a oferta de uma sociedade farmacêutica à edilidade, então dirigida por João Soares. O político contactou o artista, que recorda: "Ele acabou por me propor aquele muro do recinto onde se recolhiam as camionetas do lixo, na Avenida da Índia. Eu fiquei logo um bocado desconfiado, a pensar que aquilo um dia vinha abaixo". Bom, a parede, que é muito antiga e se encontra bastante deteriorada, ainda está de pé, mas tudo o resto em volta foi demolido a pretexto de um projecto de Jean Nouvel que, afinal, nunca arrancou.
O certo é que o Terraço está por um fio e não há sequer possibilidade de transferi-lo para outro lado. A vantagem da azulejaria, no entanto, é que se pode reproduzir e é precisamente o que Querubim planeia fazer numa parede do novo edifício dos Serviços Sociais, que a edilidade abriu recentemente nas Olaias (2008). Faz sentido quando se trata de uma composição construída a partir de figuras avulsas e salpicadas (uma menina a brincar, um homem a tocar guitarra) que apelam a uma visão instantânea, não descritiva. O tipo de piscar de olhos que se realiza quando se passa em movimento, sem possibilidade de parar para ver, que é o que acontece na Avenida da Índia, ou nas Olaias, onde praticamente só se circula de carro. Claro que apostar nesta dinâmica de 'salpicos' é também recriar a história azulejar à medida da geração do clip e do zapping.
Estação de metro da Bela Vista e Escola António Arroio
Estas são as últimas intervenções de vulto de Querubim em espaços públicos da capital, o culminar do desenvolvimento de uma linguagem pessoalíssima, baseada na memória e na subversão da azulejaria portuguesa. Na Estação da Bela Vista do Metropolitano de Lisboa (1996), projectada pelo arquitecto Paulo Brito da Silva, coube-lhe todo o revestimento azulejar, um trabalho colossal, que ocupa desde os corredores de acesso até às bocas dos túneis onde transitam os comboios. Há figuras e paisagens diluídas, alternando com motivos abstractos e construções geométricas inverosímeis, pontos de partida ou de chegada para diagonais caprichosas, traçadas entre losangos que invocam o enxaquetado tradicional. Há manchas de cores vivas dispersas em grandes superfícies brancas, mas também figuras que projectam sombras e provocam a sensação de profundidade. Não será das decorações mais populares do Metropolitano de Lisboa é demasiado "fria" e conceptual para isso mas é o tipo de obra que exige tempo e diligência para se revelar como um condensado único da história do azulejo português.
O revestimento da estação da Bela Vista ganhou uma espécie de corolário na escola António Arroio. A linguagem de desconstrução da azulejaria é a mesma, a diferença é que na escola das Olaias se declina sob a forma de um painel vertical, ocupando toda uma parede do estabelecimento. À semelhança do que sucedeu na Avenida da Índia, este equipamento já foi demolido, mas o painel permanece de pé, apoiado numa base de cimento e vigas de ferro. O projecto de arquitectura não previa a manutenção da parede, mas o artista foi-se informar e acabou descansado: o painel da António Arroio está classificado como obra de interesse municipal, ou seja, é em princípio intocável. Resta saber o que falta para atribuir a mesma classificação ao conjunto da obra pública de Querubim Lapa, ou criar uma fundação dedicada à sua preservação.