Fugas - Viagens

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Regresso a Dublin, a capital do futebol português

Agora, diz, muitos dos que compraram esses bilhetes estão a tentar vendê-los. E o interesse não parece ser grande. "Eu a ir, só se fosse oferecido ou se baixassem muito os preços", confessa Joe Spence, outro vendedor nos mercados de fim-de-semana de Temple Bar - "até porque nós nem gostamos de apoiar a FAI [Football Association of Ireland]", interrompe Barry Gormley, cliente habitual, que "aumentou terrivelmente os preços no novo estádio". E ele, continua Joe Spence, até é "um adepto atípico" - "Eu gosto de futebol. Mas a maioria dos adeptos tem paixão por uma equipa e aqui segue-se a liga inglesa".

Lansdowne Road para os amigos

A previsão meteorológica para o fim-de-semana era "catastrófica", chuva intensa na sexta e sábado - aguaceiros daí para a frente. Chegamos sem chuva e sábado compõe um típico dia irlandês: ora faz chuva (mais aguaceiros) ora ameaça chuva; ora espreita o sol, ora esconde-se o sol - e sem esta ordem linear. Pelo sim, pelo não, muitos transeuntes pelo centro de Dublin - na zona sul - nem sequer tiram os óculos escuros ou abrem os guarda-chuvas. Um dia como outro qualquer.

No Phoenix Park, um dos maiores parques urbanos da Europa, é um sábado de desporto - muito desporto. Râguebi e futebol, mas muitos preferem a "combinação" de ambos que é o futebol gaélico (falando com um irlandês sobre o tema percebemos que o football é gaélico, o futebol é "à americana", soccer): vemos os jogadores a correr em direcção a "balizas" como as de râguebi, bola nas mãos, a bater no chão, a ser pontapeada e novamente agarrada, a ser passada, a ser rematada acima e abaixo - e continuamos sem perceber bem. O hurling (comparar com o hóquei em campo é comum, mas parece mais "aéreo") também é popular - e estes são os jogos gaélicos, um fenómeno nacional e nada menosprezável. Se o futebol é o desporto mais praticado na Irlanda, é o futebol gaélico que atrai as massas - e mais ainda o râguebi: com outra projecção internacional, tem boas equipas com os melhores jogadores nacionais.

Em compensação, explica o jornalista, os grandes jogadores de futebol irlandeses jogam em Inglaterra ou Escócia - a Liga da Irlanda, a "primeira divisão" (há uma segunda - no total, 22 equipas) é semiprofissional. "Até há dois anos, era profissional mas, com o colapso da economia, os patrocinadores voltaram as costas ao futebol". Há cinco anos, com o ranking dos clubes a subir na FIFA, havia um "sentimento de mudança"; agora restam os Sligo Rovers como a única equipa assumidamente profissional - até os Shamrock Rovers, uma das quatro equipas da capital e a mais vitoriosa da história, deixaram oficialmente esse estatuto.

É, então, num país um pouco de costas voltadas para o futebol jogado nas suas fronteiras - apenas a selecção nacional parece animar os ânimos - que se vai disputar a primeira final portuguesa de uma competição europeia. Só nas imediações do estádio vemos "anúncios" ao jogo (também os vimos, depois, junto ao rio Liffey) - discretos cartazes pendurados em candeeiros, muitas vezes encobertos pelas ramagens das árvores. Estamos numa zona residencial calma da cidade - e "posh", sublinha Emmet Malone. É fácil percebê-lo - pelas grandes casas georgianas, com a tijoleira vermelha a exibir a patine do tempo em doses exactas de charme e as grandes janelas de guilhotina e as chaminés maciças a emprestarem um ar quase aristocrático ao bairro -, mas o jornalista refere-o para explicar a forma do estádio. Quem se aproxima pela Lansdowne Road (Bóthair Lansdúin, no gaélico que aparece sempre inseparável do inglês nas placas), a entrada principal, vê-o só muito perto, o topo a espreitar ondulante por detrás das casas - não é feitio, é imposição (e isso vê-se melhor do lado Norte e do Grande Canal). Desses tais vizinhos posh - e quem diz posh diz influentes, que não queriam a reconstrução do estádio e acabaram a impor restrições quanto à sua forma (e tamanho).

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