Fugas - Viagens

Fernando Veludo/Nfactos

Por que não largar tudo e começar a viajar?

Por Andreia Marques Pereira

Iniciamos uma nova série dedicada aos viajantes com um primeiro retrato: o de Filipe Teixeira, que decidiu "largar tudo" e passar os próximos meses por onze países entre a Ásia, Oceânia e América do Sul. "Eu sou novo, tenho 27 anos, por que não arriscar tudo?"

Acompanhe a viagem de Filipe Teixeira no blogue Correr Mundo

Quando entrou na licenciatura em matemática, Filipe Teixeira rapidamente percebeu que não era aquilo que queria. Seguiu, então, arquitectura, fez um estágio de três meses na Alemanha (onde há um edifício desenhado por ele), com um bom salário, e percebeu que aquilo não o preenchia. Voltou a Coimbra e à universidade, a um mestrado em bioquímica, que lhe deu entrada para o Centro de Neurociências poucos meses depois do início, com uma bolsa de investigação. Acabou o mestrado no final de Junho, defendeu a tese e no mesmo dia voltou as costas ao Centro de Neurociências "Não me estimulava" e, no processo, a um doutoramento em Estocolmo (com uma bolsa de vários milhares de euros mensais). "O problema é que não era suficiente", reflecte, "e eu não quero chegar aos 50 anos e pensar que perdi tudo".

Agora, diz, é fácil "desistir de tudo". "Eu sou novo, tenho 27 anos, por que não arriscar tudo? Por que não largar tudo e começar a viajar?" Trabalhou um mês a apanhar lixo no Jardim Botânico de Coimbra, vendeu o carro, a mobília, a bicicleta (quase) tudo o que pôde e anda a correr mundo.

Tem barba, cabelo indisciplinado e sorriso de miúdo. Encontramo-lo com traje de viagem, mochila incluída ("espero que vá ficando mais leve, que eu perceba que não preciso das coisas"), uma vez que está em trânsito pelo Porto: no dia seguinte apanha o avião para Bruxelas, dois dias depois segue para a Tailândia. Aí encontra-se com a namorada belga, Sarah, que partiu um mês mais cedo. Na verdade, esta é a viagem "dela"; Filipe acabou por tornar-se um passageiro entusiasta. Porque até já tinha pensado em fazer uma volta ao mundo. Faltava-lhe o catalisador.

Na realidade, tudo começou em 2009, na estadia na Alemanha, quando descobriu o couchsurfing. Primeiro estranhou "como vou ficar em casa de desconhecidos" depois entranhou "mudou a minha vida". Já viajava desde muito novo, com o pai, Portugal, Espanha e muita montanha pelo meio, depois começaram as viagens com os amigos, a primeira em 2004, Paris "sempre em férias, uma semana, por hostels ou bed and breakfasts".

Com o couchsurfing abriu-se-lhe um admirável mundo novo: começou a receber viajantes em casa e descobriu que isso lhe "enchia a vida". "Percebi que o problema não estava naquilo que estava a fazer, podia ser o que quisesse e mesmo assim falta alguma coisa", recorda. Alguma coisa que conseguia com o couchsurfing. "Com a arquitectura e a bioquímica é só um desafio e acho que qualquer pessoa pode fazer tudo o que quiser", considera, "com os couchsurfers é diferente.

Eles chegam, ensinam-me coisas, partilham experiências, são pessoas que ali estão. É algo real". Descobre que não é o único: "O único a pensar assim, a ver aquele filme, coisas desse género." A primeira viagem a solo foi, portanto, como couchsurfer, à Islândia. "Mudou um pouco a minha vida", assume. Porque uma noite escapou por pouco a um acidente e a partir daí decidiu "que ia mudar mesmo, que ia começar a aproveitar as coisas ao máximo". E começou a viajar mais e começou a ser viciante.

Por enquanto, o vício vai ser alimentado durante seis meses. Onze países na rota definida por Sarah, à qual Filipe fez algumas concessões "A Ásia nunca me estimulou muito, mas acho que vou ter muito para aprender lá. O valor do dinheiro, por exemplo" e poucas alterações uma delas é que vai percorrer a Malásia enquanto a namorada vai à Indonésia. "Mas muita coisa mais pode mudar", sublinha.

E muita coisa há para decidir. Que trabalhos vai fazer pelo caminho, por exemplo "três ou quatro horas" diárias de trabalho (no sistema de Work Exchange, mas "mais físico" do que o habitual, para o ajudar a perceber os seus limites, diz.

Na Malásia prevê trabalhar em organic farming, falta escolher entre uma quinta ou um resort; na Austrália está divido entre uma escola de mergulho ("quero aprender"), uma escola de equitação ou tomar conta de duas crianças ("seria muito interessante porque estaria com uma família").

Ou que experiências não quer perder: pára-quedismo na Nova Zelândia, trekking de elefantes no norte da Tailândia, alimentar tartarugas na Malásia... Daqui a seis meses, prevê: "Vou fazer outra coisa maluca, já pensei, por exemplo, juntar-me aos Médicos Sem Fronteiras. Tenho a certeza de que vou estar sempre à procura de alguma coisa. É impossível para mim estar parado."

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