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Gdansk: Memória e reinvenção

Por Luís Maio (texto e fotos)

As jóias da cidade hanseática, os bunkers da Segunda Grande Guerra, os estaleiros navais onde nasceu o Solidariedade: Gdansk junta essas histórias todas e o futuro que está a construir na sua cauda. Poucas cidades europeias estarão hoje a sofrer uma transfiguração tão estimulante.


As cidades Euro na Polónia | As cidades Euro na Ucrânia


Esqueletos de embarcações, gruas e guindastes, maquinaria pesada e pilhas de despojos industriais - esse é o imaginário, a lenda, mas também a realidade prevalente nos estaleiros navais de Gdansk. Mesmo se não tem (para já) os dias contados, o sítio onde tudo aconteceu em 1980 - onde nasceu o sindicato Solidariedade e começou o fim do comunismo - vai precisar de encolher. Financiados por dinheiros comunitários desde a entrada da Polónia na União Europeia, mais recentemente comprados por uma empresa ucraniana, os estaleiros mais famosos do Báltico devem agora obedecer ao parecer comunitário e ser reduzidos de três para um.

Ninguém sabe ao certo o que fazer com o que hoje já são vastas áreas devolutas e esqueletos industriais à beira do canal Radunia, na chamada Cidade Velha (na verdade, um antigo bairro marginal ao centro da cidade). Um parque da ciência, um centro de artes, um lugar da memória industrial, ou talvez um misto dos três são hipóteses em discussão na Internet.  Para já, no entanto, o cenário de resistência anticomunista que o mundo inteiro associa a Gdansk continua a ser um estaleiro em que se fabricam barcos.


Entre estaleiros e bunkers

O acesso aos estaleiros é, portanto, estritamente reservado. Já a Porta 2, palco de todas as tensões na histórica greve de Agosto de 1980, converteu-se em santuário turístico. À sua beira foi erigido, ainda no final desse ano de greve, um monumento à memória dos 45 trabalhadores revoltosos, mortos durante os protestos anticomunistas dez anos antes. As três cruzes gigantes de 42 metros de altura, decoradas com grandes painéis escultóricos, envelheceram com pouca graça, concordando no desuso com as imagens amarelecidas de João Paulo II e da Virgem que decoram o próprio gradeado da Porta 2 e a espartana sala de reuniões onde foi assinado o Acordo de Gdansk, hoje convertida num descuidado memorial ao primeiro grande triunfo do sindicato democrata.

A política de deixar as coisas praticamente tal qual estavam em 1980 contrasta com o gigantesco complexo que está a nascer mesmo ao lado: o chamado Centro Europeu de Solidariedade (ECS) é um conjunto de volumes inclinados, que lembram a proa de um navio, construídos em betão translúcido, novo material empregue para simbolizar a queda de barreiras, e coberto de folhas de ferro enferrujado, certamente para acentuar a conotação náutica. O projecto, da autoria do arquitecto local Alexandre Piacsek, ocupará uma área de quase 26000 m2 e terá por recheio principal uma versão modernizada da exposição sobre o Solidariedade agora em exibição na cave do prédio do sindicato. Quando abrir, algures em 2013, o centro promete inaugurar um novo ciclo na vida dos estaleiros, se não vier mesmo a ofuscá-los em grandeza e protagonismo.

O ECS deve ficar pronto uns meses antes de inaugurar essa outra grande catedral da memória do século XX que é o Museu da Segunda Grande Guerra. Será também construído à beira do canal de Radunia, desta feita segundo um projecto minimalista da autoria do atelier Kwadrat (da vizinha Wroclaw), entretanto já galardoado na especialidade de design conceptual. O novo museu destina-se a  complementar o circuito de capelinhas da última grande guerra, que constitui outra das rotinas de visita na maior cidade polaca do Báltico.

O destino principal é, por enquanto, a península de Westerplatte, sete quilómetros a norte do porto de Gdansk, onde a 1 de Setembro de 1939 foram disparados os primeiros tiros de canhão da Segunda Grande Guerra. Lá se encontram as casernas dos soldados polacos, ou o que delas restou depois do ataque alemão, e um monumento à sua memória, que mais parece um totem de índios americanos. Westerplatte visita-se usualmente em excursão de barco a partir do centro da cidade, que é também a melhor maneira de espiar os estaleiros navais.

Na cidade a que os alemães chamavam Danzig visitam-se ainda o quartel general da Gestapo (Okopowa, 9), a casa onde o sinistro Dr. Spanner fabricou sabonetes com gordura humana (Academia de Medicina), vários bunkers nazis e essa coisa rara na Polónia que é um cemitério inteiro dedicado às vítimas russas do conflito (Maja, 9).


Da periferia ao centro

O Centro Europeu de Solidariedade e o Museu da Segunda Grande Guerra - a que se poderá juntar a PGE Arena, construída de propósito para o Euro 2012 -, são os projectos mais emblemáticos da Gdansk do século XXI. Mas há outros focos de requalificação na cidade, nomeadamente na ilha dos Celeiros e na margem direita do rio Motlawa: uma vasta zona de docas em ruínas, desde 1945, agora na iminência de se tornar numa versão local do Parque das Nações. Gdansk é, em qualquer caso, uma das cidade europeias que mais promete transfigurar-se nas próximas décadas.

Parte do processo consiste em reciclar manchas de cinzentismo e zonas degradadas. Apontam neste sentido as reconversões de dinossauros industriais em museus e galerias de arte, como o Instituto Wyspa, sediado num antigo armazém dos estaleiros, e a Laznia, que ocupa uma casa de banhos centenária na margem direita do Motlawa. O Wyspa deixou as paredes descarnadas, o Laznia pintou tudo de branco, mas ambos apostam em programações ousadas, alinhadas com as franjas internacionais das artes e da cultura.

O que Gdansk oferece de mais original na área da reabilitação é, porém, o bairro de Zaspa. Ocupando terrenos deixados vagos pela transferência do aeroporto para fora da cidade, nos anos de 1970, este é um bairro de grandes blocos de apartamentos, isolados entre descampados, o maior dos quais se alonga por quase 800 metros. Uma paisagem urbana desqualificada, agora tornada um pouco mais fantasista, ou não tão deprimente graças às pinturas monumentais com que jovens artistas locais têm vindo a cobrir as empenas desses blocos, desde há dois anos a esta parte. A maior parte são leituras pouco ortodoxas das grandes datas que marcaram a história da cidade, comemorando acontecimentos como os 70 anos de eclosão da Segunda Grande Guerra, ou os 20 anos dos acordos de Gdansk.

Algures entre os muralistas mexicanos e os artistas de rua pós-graffiti, Zaspa está a tornar-se um museu a céu aberto e uma insuspeita sensação alternativa de Gdansk. Claro que depois há atracções mais convencionais, nomeadamente na Cidade Principal (Glowne Miasto), rede de ruas paralelas que desembocam no rio Motlawa e correspondem à zona nobre do que foi uma das mais poderosas cidades da Liga Hanseática.

Muito danificado durante a Segunda Grande Guerra, este centro antigo veio a ser zelosamente restaurado depois disso, à semelhança do que sucedeu noutras cidades históricas polacas. A artéria principal é a Estrada Real, assim chamada por outrora servir de passerelle à realeza. Digno de se ver, tem um par de portas renascentistas (Porta Alta e Dourada), a câmara municipal (torre de 82 metros) e um belíssimo conjunto de palacetes (com destaque para a Corte de Artur, câmara do comércio inspirada no lendário rei inglês).  Estes e outros edifícios históricos funcionam agora como museus, onde peças de decoração originais ou seus duplos são as principais estrelas, caso por excelência do extraordinário fogão de onze metros de altura da corte de Artur.

A Estrada Real coincide na maior parte com a Rua Comprida, emoldurada por edifícios burgueses de arquitectura barroca com fachadas coloridas, medalhões heráldicos, grelhas de ferro forjado e um sem-número de pormenores ornamentais. Nesta rua, mas sobretudo na paralela da Igreja de Santa Maria, muitos edifícios têm avançados com escadarias para lojas na cave, que vendem agora como antes bijuteria em âmbar e mais especialidades regionais, como as rendas e bordados Kashubia, que é maior grupo étnico local. O passeio marginal ao rio, com a sua enorme grua medieval e casarões em tijolo vermelho, completam o quadro do centro histórico de Gdansk, que também poderia ser um pedaço de Hamburgo ou de Amesterdão.


Guia prático

Como ir
De Varsóvia a Gdansk são 370 km, que agora se podem fazer numa auto-estrada novinha em folha. De avião são 50 minutos, de comboio entre seis a sete horas. O autocarro estatal entre o aeroporto e o centro da cidade custa um euro, o privado que faz o mesmo percurso cobra o dobro, mas é muito mais rápido.


Onde ficar


Artus
ul. Piwma 36/39
Tel.: +48 583209600
www.asthushotel.com.pl
Boutique hotel em antigo prédio camarário, mesmo ao lado da catedral. O restaurante na cave também é muito trendy. Duplos desde 77€.

Qubus
ul. Chmielna 47/52
Tel.: +48 587522100
www.qubushotel.com
Velho depósito de mercadorias convertido em hotel chique-envidraçado. Duplos desde 95€.

Gdansk
ul. Szafarnia 9
Tel.: +48 583001717
www.hotelgdansk.pl
Parte celeiro do século XVII, parte arquitectura do século XIX, em balcão sobre a cidade velha, do outro lado do rio. O restaurante é o único com fábrica de cerveja própria. Duplos desde 92€.

Nota: As sugestões de alojamento foram recolhidas pela Fugas no mês de Março. Nesta altura, é possível que seja difícil arranjar camas vagas e que os preços estejam bastante inflacionados.


Onde comer

Tawerna Mestwin
ul. Straganiarska 20/23
Tel.: +48 583017882
A melhor e mais autêntica cozinha local. Preços caseiros.

Pierogarnia U Dzika
ul. Piwma 59/60
Tel.: +48 583052676
O lugar certo para provar pierogi, conchas de farinha doces ou salgadas, que são a especialidade local. Uma refeição por menos de 2€.

Pod Ryba
ul. Piwna 61/63
Tel.: +48 583051307
A melhor batata recheada da cidade, à volta de 50 cêntimos.


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Arena Gdansk
Capacidade: 43.615 lugares
Capacidade no Euro 2012: 40.000 lugares
Número de jogos: 4

Jogos
10 de Junho: Espanha-Itália (Grupo C)
14 de Junho: Espanha-Rep. Irlanda (Grupo C)
14 de Junho: Croácia-Espanha (Grupo C)
22 de Junho: 1.º Grupo B-2.º Grupo A (Quartos-de-final 2)

O novo estádio de Gdansk (PGE Arena) foi especialmente construído para o Euro 2012 e desenhado pelo mesmo estúdio de Dusseldorf que antes projectou equipamentos semelhantes em Gelsenkirchen e Hannover. Se os outros não estão mal, já este é absolutamente fora-de-série. Começou a ser construído em 2008 e ficou pronto em Julho de 2011; terá custado cerca de 185 milhões de euros. Encanta sobretudo a cobertura de 18 mil folhas de policarbonato em seis tonalidades diferentes, que invocam o âmbar, mineral secularmente extraído nestas latitudes do Báltico. As bancadas, com capacidade para 44 mil espectadores, incluem caixas de luxo e zonas VIP, com entradas próprias e todas as mordomias. Vai acolher três jogos do grupo C e um quarto-de-final. A Arena de Gdansk pertence ao município e serve apenas para receber jogos de futebol.

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