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Poznan, a cidade-berço revisitada

Por Luís Maio (texto e fotos)

Poznan tem os interiores mais bem preservados do Terceiro Reich e um dos centros comerciais mais espectaculares do planeta. A cidade-berço da Polónia surpreende pela ousadia com que encara o século XXI. A selecção portuguesa vai estagiar ali mesmo ao lado.


As cidades Euro na Polónia | As cidades Euro na Ucrânia


O centro histórico de Poznan tem a sua quota de monumentos históricos, iguais ou parecidos aos de qualquer outra cidade polaca. Tudo o resto é moderno num sentido mais ou menos indistinto. O berço da Polónia parece ter evoluído para um catálogo de lugares comuns, típicos de uma cidade de média dimensão (800 mil habitantes) do centro-norte da Europa. Será isso, mas é também o género de destino urbano que premeia quem se der ao trabalho de vasculhar para além das aparências.

Desde sempre vocacionada para os negócios, Poznan lidera hoje o país no sector das feiras e congressos. É também um importante centro universitário e um em cada seis residentes é estudante, em áreas que vão do ambiente à medicina. A população tem, para além disso, fama de ser prática e racional, até porque esta é a cidade polaca onde a germanização parece ter deixado raízes mais fundas. A mistura de comércio, juventude e pragmatismo será atípica, mas pode ajudar a explicar um leque de intervenções recentes, que só por si justificam a visita.


Negócio original

Stary Browar (Velha Cervejeira) era aquilo que o nome agora indica: uma fábrica de cerveja, aberta pelo alemão Ambrosius Hugger em 1890, que cresceu ao ponto de ocupar um quarteirão inteiro. Serviu de bunker durante a Segunda Grande Guerra, foi nacionalizada com os comunistas e assim se manteve até fechar as portas, em 1980. Adquirida no final do milénio por Grazyna Kulczyk, uma das maiores fortunas da Polónia, veio a ser convertida em centro comercial, inaugurado em 2003. Entretanto, a milionária aproveitou para comprar terrenos anexos e construir um vasto complexo de matriz industrial, arrendado para escritórios e mais espaços comerciais.

A quantia suspeita pela qual a edilidade vendeu os terrenos e a arquitectura de faz de conta que domina a parte nova da intervenção fizeram correr rios de tinta. Em qualquer dos casos, Stary Browar é um shopping como não há mais nenhum: mais de duzentas lojas e espaços comerciais integrados num gigantesco cenário fabril neogótico, que também inclui salas de espectáculos e exposição de obras de arte. A oferta de cultura em centros comerciais raramente é para levar a sério, mas na circunstância a proprietária da antiga cervejeira é também uma das maiores coleccionadoras de arte da Polónia.

Daí um shopping com uma colecção de arte capaz de concorrer com qualquer museu de arte contemporânea. Neste momento tem duas dezenas de obras em exibição, na maior parte esculturas e instalações audiovisuais, estrategicamente distribuídas pelos espaços comuns. Entre as que mais se destacam estão um colossal busto em bronze de Igor Mitoraj, o polaco radicado em Itália que recria a escultura clássica grega em registo pós-moderno, e uma boneca XL em fibra de vidro do japonês Mr., que flirta ambiguamente com a cultura Otaku.

Grazyna Kulczyk não andará muito longe de Joe Berardo na mistura de comércio e arte, também ostensiva no Blow Up Hall 50 50, o cinco estrelas integrado no centro comercial. O primeiro "boutique hotel interactivo" funciona como um museu digital, onde se paga (e bem) para dormir. À chegada o hóspede recebe um iPhone que faz as vezes das chaves do quarto e a sua estadia no hotel é perspectivada como participação numa obra de arte em construção, nomeadamente pela interacção com os ecrãs tácteis, câmaras de vídeo e fantasia pixelizadas do artista canadiano-mexicano Rafael Lozano-Hemmer.


Atracção interior

A baixa de Poznan gira em torno do majestoso Castelo do Imperador, publicitado como "o castelo mais jovem da Europa". Na realidade não é um castelo, mas um palácio mandado construir por Guilherme II, último imperador prussiano, entre 1905 e 1910. O casarão gizado em estilo neo-romanesco era a peça central de um bairro com que o tresloucado kaiser pretendia marcar a supremacia germânica, bairro do qual hoje se conservam outros edifícios colossais, como o neoclássico Grande Teatro e o neobarroco Collegium Maius.

Perdida a Guerra de 14-18, os alemães foram forçados a regressar a casa, só para voltarem a invadir a Polónia em 1939. Nessa altura expulsaram 100 mil polacos para dar lugar a colonos volksdeutch, decididos a converter as férteis planícies da Grande Polónia no celeiro do Terceiro Reich. O arquitecto Albert Speer foi chamado a redesenhar os interiores do Castelo, de forma a restituir-lhe o estatuto de centro do poder alemão e servir de residência pessoal de Hitler. O führer nunca chegou a por lá os pés, mas isso não impediu a remodelação, nomeadamente a conversão da capela numa réplica do gabinete da Chancelaria do Reich. O posterior governo comunista quis demolir, mas não se pôde dar a esse luxo numa cidade já de si em ruínas e por isso hoje Poznan detém os interiores mais bem conservados da era nazi.

Mesmo despojadas do mobiliário original, sem suásticas nem nada de tão óbvio, as salas e escadarias do palácio conservam uma imponência sórdida, que chega a ser intimidante. O Castelo Imperial está classificado e visita-se como qualquer outro monumento, mas funciona também como centro cultural com espaços dedicados ao cinema, ao teatro e à exposição de arte. Muitas destas manifestações culturais têm sabor multicultural e vanguardista, propiciando sugestivas confrontações com a moldura nazi.


Soviet chic

Poznan é a cidade principal da Grande Polónia, onde os polacos primeiro assentaram no século X e cujos limites actuais são quase os mesmos do primeiro estado polaco. O centro antigo da cidade, desenvolvido em torno da praça do mercado, está constelado de edifícios notáveis, que invocam algumas das páginas mais brilhantes do seu passado. Mas, como tantas outras cidades polacas, Poznan foi muito castigada pelos bombardeamentos da Segunda Grande Guerra e estima-se que 90% da cidade velha estava reduzida a pó quando as armas se calaram, em 1945.

A maior parte dos edifícios iconográficos da primeira cidade do país foram entretanto restaurados e hoje parecem mais duplos do que prédios realmente com história. É o caso por excelência da Praça do Mercado, a terceira maior do país, emoldurada por belíssimos edifícios renascentistas, incluindo as coloridas casas dos mercadores, e a Câmara Municipal, com uma loggia de arcadas em três pisos. O Arsenal primitivo, no entanto, não foi recriado e o que lá está é uma declinação singela do Realismo Soviético, que contrasta agudamente com a matriz renascentista do resto da praça. Noutros lados da cidade persistem testemunhos mais simpáticos do modernismo pós-guerra, como é o caso do Rotunda, arranha-céus envergonhado mas elegante, a dois quarteirões do Castelo do Imperador.

Muitos dos edifícios antigos do mercado têm agora uma segunda vida, evoluindo do registo diurno de postais de nostalgia para o de locais de confraternização nocturna. Ao mesmo tempo, e pela mesma lógica, peças de colecção do Realismo Soviético abrigam hoje empresas multinacionais ou estão a ser convertidos em novas bandeiras culturais. Mas, como quase tudo em Poznan, é preciso olhar uma segunda vez para perceber onde pára o baile.


A selecção em Remes

O estágio da selecção portuguesa de futebol (desde 4 de Junho) decorre num sítio no meio de nada, mas com montes de relva à volta e vista para uma destilaria de açúcar. O hotel chama-se Remes e fica nos arredores de Opalenica, a 35 quilómetros de Poznan. Face às cifras avançadas (mais de 33 mil euros ao dia), seria de esperar um palacete, ou algo de tão prestigiado quanto os hotéis históricos onde vão ficar os russos em Varsóvia (Bristrol) ou os irlandeses em Sopot (Sheraton). Mesmo se não lhe falta nada em matéria de conforto, o hotel Remes pertence a outro campeonato - basicamente é um complexo desportivo isolado do resto do mundo com um alojamento quase espartano no meio.

A ausência de fantasia decorativa contrasta com a sofisticação das instalações desportivas: são vinte campos relvados, 16 dos quais com o tamanho de campos de futebol, mais recintos de vólei, futebol de praia, campos de ténis e trilhos de caminhada, para além de piscina, ginásio e spa no interior. A propriedade pode ser completamente cercada, em Opalenica não se passa nada, Poznan e a sua vibrante vida nocturna ficam a meia hora de carro. Nada de mais recomendável, portanto, em termos de concentração e de estágio. Portugal, já se sabe, estagia, mas não joga em Poznan, cujo estádio, renovado para o Euro e agora com capacidade para mais de 43 mil espectadores, recebe três jogos do grupo C.


Guia prático

Na Internet
www.um.warszawa.pl


Como ir

A TAP voa de Lisboa para Varsóvia às terças, sextas e sábados, às 9h15 (TP582) e às terças, quartas e domingos com saídas às 17h05 (TP584). No sentido inverso descola às segundas, quartas e quintas pelas 7h40 (TP587) e às terças, sextas e sábados pelas 14h55 (TP581). Ida e volta desde 234,68 €. Dentro em breve a TAP passará também a voar para Berlim. Poznan fica mais ou menos a meio caminho entre as duas capitais e a duas horas de comboio de qualquer delas. Curiosamente há auto-estrada até Berlim, mas não até Varsóvia.


Onde ficar

Blow Up Hall 5050
ul. Kosciuski 42
Tel.: +48616579990
www.blowuphall5050.com
O hotel-museu digital de Poznan tem uma diária entre os 175 e os 350€. O restaurante é igualmente excelente e caro.

Villa Atelier
ul. Klasztorna 19
Tel.: +48 616227251
www.villaatelier.pl

Seis quartos em prédio de habitação que remonta ao século XV, a dois passos da Praça do Mercado. Desde 50€ por pessoa.

By The Way
ul. Pólwiejaska 19/10
Tel.: +48 698380473
www.bythe/wayhostel.pl
Central e perfeito para mochileiros. Desde 25€.

Palac Wasowo
Ul Parkowy 1, Kuslin
Tel.: +48 614472613
www.wasowo.pl
Fantasia ecléctica no meio de vasta propriedade com lago e bosque. É agora hotel, centro de conferência e restaurante de banquetes. Um bom passeio para quem for espreitar a selecção a Opalenica.

Nota: As sugestões de alojamento foram recolhidas pela Fugas no mês de Março. Nesta altura, é possível que seja difícil arranjar camas vagas e que os preços estejam bastante inflacionados.


Onde comer

Brovaria
Stary Rynek 73-74
Tel.: +48 618586868
www.brovaria.pl
Cervejaria própria, o melhor restaurante na Praça do Mercado. Um hotel e dos bares mais cool da cidade completam o ramalhete.

Vine Bridge
ul. Ostrówek 6
Tel.: +48 61 8750 934
www.vinebridge.pl
O melhor da Nouvelle Cuisine Polaca num restaurante só com três mesas.


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Estádio Municipal de Poznan

Capacidade: 43.269 lugares
Capacidade no Euro 2012: 40.000 lugares
Número de jogos: 3

Jogos

10 de Junho: Rep. Irlanda-Croácia (Grupo C)
14 de Junho: Itália-Croácia (Grupo C)
14 de Junho: Itália- Rep. Irlanda (Grupo C)

Construído entre as décadas de 1960 e 1980, este recinto foi um dos estádios renovados para este Euro 2012. Foi reinaugurado em 2010, com um concerto de Sting. A renovação custou cerca de 180 milhões de euros. O estado da relva tem sido um dos problemas crónicos deste recinto.

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