Fugas - Viagens

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A Inglaterra vai nua

“Todos os dias há visitas guiadas de barco, mas temo que a esta hora já não apanhem a última”, avisa a responsável do gabinete de turismo. Mas The Broads, que atrai mais de sete milhões de visitantes por ano, também aluga canoas, caiaques, barcos à vela ou a remo e pequenas embarcações a motor sem guia.

Um senhor esguio plantado numa barraca à borda da água dá-nos a chave de um barco azul, ensina a puxar a corda pendurada no colete salva-vidas e lê em voz alta uma lista de dez coisas que não podemos fazer. “You have the right to remain silent”, recordamos dos actos de prisão em cinema, e parece-nos o mais acertado a fazer. 

Das margens do canal, impera o silêncio habitado, e quanto mais nos afastamos de Wroxham e das suas mansões e jardins-fantasma, a natureza de canas e juncos, os moinhos e as mais de 150 igrejas medievais dominam a paisagem naquele que é o resultado de quase dois séculos de escavações (depois do abate de árvores, a extracção de turfa como fonte primária de energia tornou-se uma das actividades de grande relevo na área, e os terrenos alagaram). Hoje, é possível navegar por estes canais durante horas. Desde os primeiros moinhos até ao extremo onde vivem focas, The Broads é habitat de milhares de espécies (animais e vegetais) e de contos. Nem mesmo David Bowie poupou as suas letras de um dos lugares mais mágicos de Norfolk.

Voltar à terra

Uma alpaca observa-nos junto a fardos de palha. Depois do cheiro a mar e das ondas de água doce, descansamos em Thornage, aldeia perdida e católica entre as árvores de Norfolk, onde não falham as missas de domingo para louvar os vegetais que a terra oferece. Na granja mandada construir no século XV pelos bispos de Norwich, o centro administrativo deste condado inglês, funciona uma das 26 comunidades Camphill de Inglaterra e do País de Gales. Nela vivem pessoas com necessidades especiais, que fazem do trabalho no campo, artesanato e actividades do quotidiano as suas principais ocupações e terapias.

Um cesto de maçãs, tomates e cenouras chega à cozinha em cores carregadas. Lá fora, as nuvens impõem-se, dando tempo às habilidades do forno e das mãos. As framboesas colhidas pela manhã e o chá preto inglês carregam o aroma da sala de pequenos-almoços, onde duas grandes janelas se voltam ao mundo antropofísico — a comunidade Camphill segue os princípios do austríaco Rudolph Steiner, pai da antroposofia, da agricultura biodinâmica e da pedagogia Waldorf, e defensor de uma ciência espiritual em que os ritmos e a saúde da natureza, do cultivo e dos animais (incluindo o homem) são respeitados em unidade, como se de um mesmo organismo se tratasse.   

Tânia Ferreira, de 26 anos (começados em Mondim de Basto), é assistente social neste nenhures campestre. Desidrata maçãs no forno industrial enquanto resume o melhor de Thornage: “A qualidade de vida, não passar horas em transportes públicos, colher a minha própria comida, ter sempre tempo para tudo.” Com a realidade das horas e a aprendizagem bruta da natureza, passou a “ver as coisas em perspectiva”: estar em Norfolk não é viver isolado do mundo, mas viver com ele, sem ruído.

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