Fugas - Viagens

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Birmânia e Tailândia inesquecíveis

O mais espectacular de Rangum é o célebre pagode, em torno do qual os pescadores criaram a cidade, segundo a lenda dos dois irmãos mercadores que trouxeram até aqui os oito cabelos que tinham pedido ao Buda Siddartha Gantama, num cofre de esmeraldas. No pagode recolhem-se as relíquias do Buda, as cinzas de outros três veneráveis Budas e os monumentos funerários de Supayalat, última Rainha da Birmânia (1859-1925), de Daw Khin Kyi, mulher do herói da independência Aung San e mãe da Aung San Suu Kyi, Prémio Nobel da Paz, bem como de U Thant, antigo Secretário-Geral das Nações Unidas. O zedi ou stupa, imponente cone dourado, atinge 98 metros de altura e a base é feita de tijolos cobertos com placas de ouro, sendo rodeado de 64 pagodes pequenos. Na flecha principal estão penduradas 1500 sinetas de ouro e prata… É o budismo theravada que domina em Birmânia, cujos monges têm tido um papel muito importante da defesa da cultura e da abertura.

Foi sempre difícil chegar a Mrauk-U, no antigo reino de Arracão (Rackine) e continua a sê-lo. Apesar dos efeitos da monção deste ano, foi feita a subida marítima desde o golfo de Bengala até Mrauk-U. Mas, depois da chuvada, veio a bonança, e à chegada os viajantes foram presenteados com um esplendoroso pôr do sol — e com um belo e retemperador acolhimento. E relemos Camões: “Olha o reino Arracão; olha o assento / De Pegu, que já monstros povoaram” (Canto X). Arracão é o exemplo do lugar que atraiu os mercenários. António Bocarro diz que os portugueses “vendiam por grandes preços recebendo tudo em ouro de que muitos ficaram ricos e se vendia de sorte que se pesava de uma parte arroz e da outra ouro”. A importante comunidade de luso-descendentes estabeleceu-se no bairro de Daingrih-pet e a grande referência portuguesa é Sebastião Manrique (1590-1669), autor do célebre Itinerário das Missões da Índia Oriental (1649), monge agostinho português que partiu para Goa e Cochim, donde saiu para Ugulim (Bengala) e para este mítico reino. Aqui pediu ao rei Sirisudhammaraja terreno para construir um templo cristão para estabelecer uma comunidade portuguesa.

Desenvolvendo a sua actividade em Bengala, apenas voltaria a Mrauk-U em 1633, onde ajudou as autoridades portuguesas do Estado da Índia na tentativa de celebração, não conseguida, de uma aliança com o rei de Arracão. Em Daingrih-pet habitavam portugueses e indianos católicos e as edificações eram de pedra; só depois, como faziam os autóctones, as casas se tornaram de bambu. Na margem esquerda do rio, o bairro situava-se numa posição privilegiada, como se vê nas gravuras que chegaram até nós.

À comunidade portuguesa era permitido o culto religioso católico e o chefe era designado como capitão, ainda que não dependesse de Goa. No bairro integraram-se em 1616 os cativos de Sundiva, após a derrota do mercenário Sebastião Gonçalves Tibau. Este assenhoreara-se da ilha de Sundiva no estreito de Bengala, numa vida aventurosa de corsário. Natural de Loures, foi feitor das embarcações do sal, o grande negócio da região. Estabeleceu-se em Djanga, em Arracão, mas foi apanhado pelo massacre que atingiu a povoação, depois da tentativa gorada de conquista por Brito e Nicote. Tibau escapou com vida e procurou reconquistar Sundiva, o que conseguiu por pouco tempo, graças ao apoio de forças de Goa. Com a retirada destas, foi vencido, vendo chegar ao fim o seu sonho de ser rei de uma ilha fértil. Na cidade, hoje, o Museu Arqueológico de Mrauk-U alberga artefactos, armas e canhões catalogados como portugueses. Nos subúrbios há uma ruína do que se diz ser a feitoria dos portugueses.

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