Fugas - Viagens

  • João Cortesão/Clube Escape Livre
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  • Paulo Ricca

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Uma peregrinação sobre rodas pelos trilhos de Santiago

Depressa se percebe que há por aqui muito para deleitar a vista. E o estômago também. Com a hora de almoço a aproximar-se, partimos à descoberta do que a gastronomia local tem para oferecer. Acabamos por entrar, sem recomendações, num pequeno restaurante no Largo do Pelourinho para confirmarmos que a cidade também se destaca pela boa comida, e a um preço acessível: um cozido de grão-de-bico e, de tomar nota, umas sardinhas doces, uma especialidade conventual.

Com a ajuda do Turismo de Trancoso, acabamos por complementar o passeio diurno com uma visita guiada nocturna. Começamos pelo bairro judeu, testemunho da importância destes na expansão comercial da cidade. A maioria oriunda dos reinos de Aragão e Castela, os judeus fixaram-se em Trancoso entre os séculos XIV e XVI. Como aconteceu por todo o país, acabariam por ser perseguidos, dando origem aos cristãos-novos. Notas desta perseguição podem ser testemunhadas no Centro de Interpretação Judaica Isaac Cardoso, médico judeu aqui nascido no século XVII, e que inclui a Sinagoga Beit Mayim Hayim. Daqui, é um saltinho até ao castelo, que, num ponto cimeiro, domina a cidade e a região circundante. Descemos depois para junto do moderno tribunal, onde encontramos, escavadas na rocha, sepulturas visigóticas do século VI, classificadas como Imóvel de Interesse Público desde 1978.

Pelos trilhos do Norte

Depois de uma repousante noite no Hotel Turismo em Trancoso, iniciamos a nossa aventura por parte do Caminho de Santiago. Cruzando montes e vales, em grande parte fora do asfalto, com passagens por capelas e santuários, fazemos uma paragem em Sernancelhe, uma bem preservada vila, com origem no período Neolítico, com vestígios de romanos, mouros e outras civilizações, exibindo edificações medievais muito bem conservadas.

Sernancelhe está no coração das “Terras do Demo”, expressão criada por Aquilino Ribeiro, e é considerada a capital mundial da castanha, cuja festa anual se celebra no último fim-de-semana de Outubro. Daqui seguimos para um dos pontos de passagem do Caminho de Santiago na Idade Média, o Santuário de Nossa Senhora da Lapa, construção do século XVII num local que já era de culto desde o século X. Conta uma das muitas lendas que uma menina pastora, muda, encontrou uma imagem da Virgem em 1498. A mãe terá lançado a estátua para a fogueira e, nesse instante, a menina falou pela primeira vez. A estória serve para justificar as marcas de queimaduras visíveis na imagem existente no santuário. Mas a igreja tem outras particularidades, como o facto de ter sido construída à volta de um enorme penedo de granito. Um dos pontos de passagem entre as rochas no interior da igreja é tão estreito que, diz-se, só se consegue esgueirar entre as rochas quem não tiver pecados graves na sua consciência.

Impõe-se uma visita a São João de Tarouca, o mais antigo mosteiro cisterciense português e local de acolhimento de peregrinos desde 1169. Ganha-se assim força moral para seguir a jornada rumo à ponte e à torre medieval de Ucanha, sobre o rio Varosa, onde devemos pagar portagem. Pelo menos era assim até 1507 — os abades tratavam da cobrança, só estando isentos os peregrinos para o Mosteiro de Salzedas e para Santiago de Compostela.

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