Fugas - Viagens

  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro
  • Sousa Ribeiro

Continuação: página 4 de 8

Madagáscar: Não é nada fácil chegar até aqui, mas mais difícil é partir

O motorista do taxi-brousse liga o motor e o menino por ali fica, com as roupas nas mãos, sem lhes prestar grande atenção, fitando-me, sorrindo, acenando. Nunca soube o nome dele – mas os nomes são como as palavras, tantas e tantas vezes dispensáveis.

Volto a Tana, mora mora, como se diz por aqui, devagar, devagar, e logo rumo a Toliara, ao longo da mítica N7, uma aventura que qualquer viandante deve fazer pelo menos uma vez na vida.

Chegada ao sul

- É o Bruno! É o Bruno!

Quem me acompanhava, nessa altura, lançou-me um olhar e logo outro ao céu, como quem pede uma intervenção divina: clemência para a minha aparente demência.

- É o Bruno! É o Bruno!

Sentado na esplanada do restaurante, em Toliara, no mesmo que me haviam recomendado, com a garantia de ser o melhor da cidade, estava o Bruno Decorte, um belga que conhecera no Bairro Alto, em Lisboa, quando era gerente de um restaurante na Rua do Norte e, ao mesmo tempo, um dos proprietários do Chapitô.

O reencontro, meramente casual, provocou surpresa aos dois, por ocorrer, tantos anos depois, a uma tão grande distância – um pretexto para um tempo de celebração, com umas THB (Three Horses Beer, a cerveja mais popular em Madagáscar) pelo meio antes da despedida mal a tarde anuncia extinguir-se.

No terminal, onde chego de pousse-pousse (riquexó), as mulheres, com os seus rostos carregados de masonjoany, vendem peixe e gostam de ser fotografadas. Entro numa bâché, uma desconfortável pick-up, quando o sol doura a terra, lançando os últimos raios, e durante mais de uma hora, sempre aos saltos como um canguru, observo a vida ao final da tarde ao longo da estrada poeirenta que conduz a Ifaty e que me recebe já sob um céu nocturno.

O mar está imerso nas trevas, dele apenas chega o murmúrio sereno das ondas, é um apelo irresistível a um mergulho, mesmo a esta hora. Só no dia seguinte me lembro de que me esqueci dos chinelos de praia sobre as areias ainda quentes. Ao início da manhã, da varanda do bungalow que se projecta sobre a praia, em parte envolto pela sombra dos ramos dos coqueiros, o mar e o céu fundem-se em azuis e servem de pano de fundo à vida que vai decorrendo sem quebras com a rotina diária.

Mulheres e crianças testam, durante a maré-baixa, a generosidade do mar; homens e adolescentes têm as suas pirogas prontas para um simples passeio, mergulho ou pesca ao largo da costa; quatro crianças surgem, de pés descalços, cada uma segurando uma galinha, incitando-me a comprar mas com mais sorrisos do que convicção.

Ifaty é um lugar que transporta para um outro tempo. Aqui e acolá, preso a um gigantesco tronco de uma árvore ou na porta de uma mercearia, um anúncio, escrito à mão: uma noite de discoteca ou um concerto. Hoje à tarde há boxe.

Caminho pela aldeia de pescadores, por entre as suas casas, e desemboco num descampado rodeado por um conjunto de árvores em cujos ramos se sentam miúdos mais ágeis do que pássaros; no que em tempos foi um bidão de combustível, um pedaço de madeira, manejado por um adolescente, descarrega a sua fúria. Uma jovem, com uma blusa azul de alças, rompe por entre o público que se acotovela formando uma lua cheia. Ergue um dedo, um sinal desafiador, e logo depois envolve-se na luta com um rapaz, mais um espectáculo de rua, teatral, do que uma manifestação de violência.

--%>