Fugas - Viagens

Continuação: página 2 de 6

De mão dada com os amantes

O tempo foi passando.

Isabel de Segura aceitara o pacto mas a insistência do pai para que casasse com um ilustre e — mais importante ainda — rico homem de Teruel, don Pedro de Azagra, fê-la ceder, embora impondo como condição que não o faria antes que se esgotasse o prazo.

A jovem, de coração destroçado, ia escutando os relatos das gentes que vinham de Castela e que nada sabiam de Diego de Marcilla. Até que um dia alguém lhe deu a notícia de que este havia morrido em combate e, precisamente quando se completavam cinco anos desde a sua promessa, Isabel de Segura, resignada à sua sorte, decidiu casar-se com o homem que o pai escolhera.

Dizem que já passava do meio-dia.

Diego de Marcilla, montado no seu cavalo, carregando saudade, paixão e riqueza, subia a encosta de Andaquilla e, uma vez flanqueada a porta de Daroca, dirigiu-se à rua onde morava a sua amada, ouvindo um rumor que se ia exacerbando à medida que se aproximava da casa dos Segura. Escutando a notícia de uns jovens que por ali andavam, Diego de Marcilla quis certificar-se, insinuando-se por entre os convidados; Isabel de Segura, vendo o seu rosto entre a multidão, desmaiou e foi conduzida aos seus aposentos. O jovem apenas queria um último beijo e conseguiu entrar no quarto da noiva — mas esse desejo foi recusado por Isabel de Segura que, já recomposta, argumentou com o facto de ser uma mulher casada.

Passeio pela Calle de los Amantes e procuro imaginar a história.

Diego de Marcilla morreu nesse mesmo instante e só umas horas mais tarde, quando todos os convidados haviam partido, o marido de Isabel de Segura se prontificou a carregar o cadáver, deixando-o próximo da casa onde vivia a família, como se de um bêbado se tratasse, incapaz de chegar ao seu destino. 

Don Martin de Marcilla organizou o funeral na igreja de San Pedro e ali, sobre um cadafalso, ficou exposto o corpo do filho. Angustiada e cheia de remorsos, Isabel de Segura, com um manto que lhe cobria a cara, juntou-se ao cortejo fúnebre e, já no interior da igreja, atravessou em silêncio a nave para dar um beijo prolongado nos lábios do seu amado, o beijo que lhe recusara em vida.

E assim ficou, com a boca colada. Muitos julgaram-na desmaiada mas quando a tentaram retirar, permitindo que outros se despedissem de Diego de Marcilla, perceberam que estava morta — e logo depois, uma vez destapada a cara, que se tratava de Isabel de Segura.

Eternamente juntos

Uma neblina pouco espessa abate-se sobre a cidade ainda embrenhada no seu silêncio matinal e confere-lhe uma atmosfera misteriosa. Gosto de errar pelas suas ruas desertas, sem um percurso ou um destino definidos, limitando-me a aguardar o seu lento despertar. Aos poucos, abre-se como uma janela e convida o viandante a perscrutar a sua profunda relação com o amor, com o casal de amantes, de tal forma lhes está associada, em cada rua, em cada esquina, em cada beco, em múltiplos espaços comerciais. A poucos metros da praça que funciona como o coração da cidade, transpondo uma subida pouco pronunciada, encontro o Mausoleo de los Amantes, já com dois casais aguardando a abertura das portas ao lado da estátua de Diego e Isabel.

--%>