Fugas - Viagens

  • João Cortesão/ Clube Escape Livre
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Para comer o bucho é preciso enfrentar a estrada

Por João Palma

O nome pode evocar algumas conotações radicais, mas o Raid do Bucho é apenas um passeio de todo-o-terreno, que junta a comunhão com a natureza, história, cultura e gastronomia com uma pitada q.b. de adrenalina – mas tudo num ritmo relaxado e descontraído.

Não há almoços grátis e o Raid do Bucho e Outros Sabores, realizado no fim-de-semana de 12 e 13 de Março, é disso prova provada. Antes de saborearem o tradicional almoço do Bucho, domingo, na aldeia fronteiriça de Freineda, concelho de Almeida, os 140 participantes e 40 viaturas participantes neste passeio, andaram durante dia e meio por trilhos e estradões, subiram e desceram serras, atravessaram ribeiros e visitaram localidades do distrito da Guarda que resistem à desertificação do interior.

Organizado pelo Clube Escape Livre para os veículos Dacia Duster de tracção integral, o passeio estava também aberto a veículos 4x4 de outras marcas. Assim o leque de viaturas e pessoas foi muito abrangente: desde veículos novinhos em folha a outros com mais de 20 anos, de crianças quase de colo a anciãos com mais de 70 anos. É que, como sublinham os organizadores do evento, estes passeios servem para os participantes desfrutarem e descobrirem coisas novas, não sendo aventuras radicais que ponham minimamente em risco carros e pessoas – no final, basta uma lavagem e o veículo está de novo pronto para a utilização no dia-a-dia.

Museu de Tecelagem dos Meios

Enrolando o filme para trás, na sexta-feira à noite, depois de serem recebidos no Hotel Vanguarda, na Guarda, os participantes deslocaram-se em autocarros à localidade de Meios, a 13 quilómetros da Guarda, para visitarem o Museu de Tecelagem, onde puderam assistir à confecção manual dos tradicionais cobertores de papa, mantas de lã de ovelha churra, que aqueciam as camas nas noites frias de Inverno, antes de serem substituídos nos nossos dias pelos edredons. No entanto, ainda é possível adquirir cobertores de papa, não só no Museu de Tecelagem mas também na Escola de Artes e Ofícios da localidade próxima de Maçaínhas.

O Museu de Tecelagem tem como objectivo manter a tradição do fabrico dos cobertores de papa, encontrando-lhe até novas utilizações (roupas, chinelas, peças decorativas, etc.), mas é também um repositório de estórias da transumância, o deslocamento sazonal no Inverno dos rebanhos de ovelhas das terras geladas da Guarda, atravessando montes e vales, sendo muitas vezes alvo de ataques de alcateias de lobos esfomeados, para a região do Fundão, com clima mais ameno e pastos para os animais.

Cidadelhe, o calcanhar do mundo

No sábado de manhã, partindo da Guarda, por trilhos na serrania, rasgando uma deslumbrante paisagem deserta e selvagem, chegamos a Cidadelhe, uma das Aldeias Históricas de Portugal, com cerca de 40 habitantes, incluída no Património Mundial da Humanidade da UNESCO. Imortalizada por José Saramago no seu livro Viagem a Portugal. Cidadelhe é designada por “calcanhar do mundo”, havendo duas versões para a origem desse apodo: uma, por se encontrar no extremo norte do concelho de Pinhel; outra, por estar longe de tudo e todos.

Para além das suas origens pré-históricas, do casario extremamente bem preservado e das belíssimas paisagens da serra rasgada pelos rios Massueime e Côa, Cidadelhe tem um património único: o Pálio de Ouro, com mais de 300 anos, em veludo carmesim e bordado a ouro, mandado confeccionar por oito abastados agricultores, que o transportavam na procissão do Domingo de Páscoa, cobrindo o sacerdote que presidia ao cortejo. Dada a sua valia, ainda hoje o pálio é guardado de casa em casa, em segredo absoluto, por cada um dos habitantes de Cidadelhe, mudando todas as semanas de poiso. Salvo a família que o recebe, mais ninguém na aldeia sabe onde ele se encontra. Actualmente já nem sai à rua na Páscoa, sendo substituído por uma réplica para o preservar e já há um projecto de instalações onde possa ser exposto em segurança, aguardando verba para o concretizar. Por especial favor, os participantes no Raid do Bucho puderam admirar ao vivo essa magnífica peça de arte religiosa, que ainda está muito bem conservada.

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