Fugas - Viagens

  • LEHTIKUVA LEHTIKUVA/REUTERS
  • LEHTIKUVA LEHTIKUVA/REUTERS
  • Reuters
  • Yves Herman/Reuters
  • AFP
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo
  • Rute Barbedo

Continuação: página 3 de 6

Mais irreal que as noites brancas

A Arla Sauna é aquecida a gás natural – uma sauna urbano-contemporânea, portanto, talvez mesmo “trendyficada”. Mas o método tradicional implica um sistema alimentado a madeira – em abundância no país –, que, no seu melhor, aquece a chamada “sauna de fumo”. Aí, tudo é um ritual, como se de repente colocássemos o corpo num antepassado e aproveitássemos para espicaçá-lo com ramos de bétula. (Onde mais no mundo teremos oportunidade de fazer isto na ausência de olhares intrusivos?) A preparação, entre a queimada da madeira e o escape da maior parte do fumo para o exterior, pode demorar cinco horas. “Isso, sim, é uma sauna a sério”, garante um dos homens da sala.

Aqui, onde nos sentamos enquanto as nuvens de vapor salvam de alguma vergonha, já vamos em três horas. As histórias enrolam na concha que leva a água às rochas quentes. 97° C. Respirar já não é o gesto mais natural do corpo. Há quem beba uma cerveja às escondidas. “Com o calor, isto sobe bem à cabeça”, brinca o homem de meia-idade com a toalha branca ao ombro. “Na sauna discute-se política?”, perguntamos. “Naaaa… É, definitivamente, um local para esquecer isso. É um lugar de desintoxicação.”

 

Ecológico, biológico, social

Que os finlandeses, como a generalidade dos nórdicos, têm a natureza entranhada nos dias é do conhecimento geral. Mas a atenção sobre a temática está a tornar-se cada vez mais política, observa Anna Sinkkonen, que recentemente começou a envolver-se mais na vida social e cívica. A necessidade de acção, acredita, tem sido sentida por muitos “helsinkers” da sua geração, porque “a política do actual Governo é tão neoliberal – aliás, desde a recessão dos anos 1990, que o Estado social nórdico está a desmantelar-se – que é preciso construir uma nova frente [política], de modo a salvar o nosso sistema de segurança social”, considera a tradutora. E a amiga, Juha, acrescenta: “Crescemos com a ideia de que ‘nascer na Finlândia é como ganhar na lotaria’, porque é uma sociedade igualitária, onde todos têm direito a bons serviços públicos. Mas recentemente a distância entre pobres e ricos tem crescido e o Governo tem tomado decisões preocupantes.”

 “Austeridade” e “privatização” são palavras também ouvidas nos extremos setentrionais, e os finlandeses não querem perder o modelo socialista que já foi considerado um dos avançados do mundo. Por isso, estão a emergir movimentos populares, urbanos, culturais e sociais, e “são frequentes os eventos focados em estilos de vida ecológicos, o uso do espaço público, a transformação dos bairros em zonas com mais vida”.

O Dia do Restaurante, que surgiu em 2011, é um exemplo de como a comunidade tem sabido juntar-se. Criado espontaneamente por milhares de pessoas, é um “carnaval” de restaurantes pop-up que surge quatro vezes por ano (em Fevereiro, Maio, Agosto e Novembro) nas ruas, parques e casas de Helsínquia.

Anna fala com frenesim das novas dinâmicas da cidade, mas os passos são calmos pelo parque de Kaisaniemi, de onde emerge o branco Jardim botânico. Com a conversa cruzam-se coelhos selvagens – como, de resto, pela cidade inteira –; voam libelinhas. Saltamos para o eléctrico, em direcção ao mercado velho (que data de 1888) – Vanha Kauppahalli. Queremos afagar a fome com pães de brioche, compotas, frutos silvestres, cogumelos, sopa de peixe, salmão fumado, arenque fumado, pato fumado, sumos naturais feitos na hora, espécies de empadas, espargos a estalar de fresco, queijos com buracos de ver de um lado ao outro. Uma cerveja encorpada (e, sim, importada). A ver se aconchegamos o estômago para seguirmos viagem até à arte contemporânea do Kiasma e às rochas de Suomenlinna.

--%>