Serpenteamos de sala em sala atrás da nossa guia, Périne, de bata branca – as nossas roupas, vindas da rua, trazem poeiras que podem migrar facilmente para os mostradores dos relógios em construção, por exemplo –, que nos leva da sala do design até à sala dos protótipos, “onde tudo começa”, para uma outra sala cheia de máquinas com pequenas partes dos relógios. Rénaud, especialista nos testes de resistência, conta-nos que um jogo de póquer é a actividade mais intensa e perigosa para um relógio. “O senso comum diz que são os desportos de alta intensidade os mais prejudiciais para um relógio mas o póquer é o pior porque estamos sempre a bater com a mão, e o pulso, na mesa quando atiramos uma carta”, esclarece.
No atelier começamos a ouvir tique-taques. Todos os dias são feitos 800 a 1000 relógios completos. Ao contrário do laboratório contíguo, de alta-relojoaria, onde há apenas seis mestres a montar as peças, neste há cerca de 60 pessoas na linha de montagem que não desviam o olhar à nossa chegada. Um trabalho tão rigoroso ou compassado como o movimento dos ponteiros de um relógio.
A nossa última paragem é junto ao belíssimo lago de Neuchâtel, no hotel Palafitte, onde conhecemos José Moura. Fala um francês perfeito e só descobrimos a sua nacionalidade portuguesa depois de sermos interrompidos a meio de uma conversa com um “olá, boa noite” ao invés dos desejos de “bonsoir”. “Não há muitos portugueses por aqui”, diz José, aludindo aos preços altos do turismo de luxo suíço. E apesar de ter regressado há dias de umas férias em Matosinhos, a sua cidade natal, o ex-jogador de futebol do Leixões alegra-se por ter hóspedes com quem exercitar o português – afinal, já está tão habituado à língua francesa que confunde uma e outra palavra.
O hotel Palafitte foi construído em 2002 para a 6.ª exposição nacional da Suíça, um evento em torno dos lagos de Neuchâtel, Biel e Murten, para mostrar o talento e a inovação destas zonas do país. Assim, o hotel, pensado pelo arquitecto Kurt Hoffman, foi construído como uma instalação, sem o objectivo de ser utilizado como unidade hoteleira nem o de durar mais de seis meses (o tempo da Expo.02) – de todas as criações, foi o único que resistiu e desde então tem conseguido renovar a sua licença de um ano todos os anos.
É, também, o único hotel da Europa construído sob palafitas, uma escolha que se deve à vontade de preservar a própria história de Neuchâtel, onde foram descobertos vestígios de antigas construções suíças edificadas com estes conjuntos de estacas de madeira.
De um total de 40 quartos, 26 são pavilhões de 68m2 sobre o lago, com acesso directo para a água através das escadas da varanda – “por isso, pode-se dizer que é o hotel com a maior piscina da Europa”, brincam os responsáveis na apresentação do hotel. Os restantes 14 quartos são numa segunda linha, com a mesma vista panorâmica para os Alpes. É a mesma do restaurante La Table de Palafitte, com uma ementa feita pelo chef Franck Paget e que privilegia os ingredientes e vinhos de produtores locais.