Fugas - Viagens

  • Miguel Manso
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Em Salem o difícil é não acreditar em bruxas

A First Church aparece-nos entre árvores no seu estilo neo-gótico, pedra escura e torre com ameias no edifício oitocentista da segunda mais antiga congregação protestante do país — há serviço a decorrer, mas convidam-nos a entrar, para um espaço amplo e inesperadamente luminoso; e logo ao lado a Mansion Ropes, estilo georgiano colonial, geométrica, de madeira branca, dois andares mais águas furtadas com três empenas e balaustrada tosca no topo (parte do espólio do PEM, esta casa mantém intacto o interior com objectos do século XVIII e XIX e pode ser visitada — encontramo-la fechada e apenas deambulamos pelo jardim, semiformal). São dois exemplos dos vários estilos arquitectónicos que se encontram nas ruas circundantes: do Federal (que se impôs nas primeira décadas do novo país) aos vários revivalismo do século XIX como o grego (e romano), o italiano, e o colonial. E voltamos à “casa da bruxa”, esta uma verdadeira casa colonial (o chamado Primeiro Período), aberta ao público mas que também encontramos fechada.

O regresso a Boston está marcado de ferry, por isso é em direcção à agua que caminhamos. Passaremos pelo New England Pirate Museum, mas as bruxas continuam a rondar-nos — não longe estão a Salem Witch Village e o Salem Wax Museum (bruxas e marinheiros), ambos na órbita do Old Burying Point Cemetery. É pela Derby Street que caminhamos e quando cruzamos o Hawthorne Boulevard sentimo-nos em território “marítimo”: aqui Salem como que troca de pele, vestindo-se de típica vila costeira da Nova Inglaterra. As casas são maioritariamente de madeira, várias cores, e as lojinhas apresentam um charme rústico e autêntico. Pickering Wharf é a zona de restaurantes e bares por excelência, mais cosmopolita, enquanto para lá do Salem Maritime National Historic Site (com uma réplica visitável do veleiro Friendship e a antiga alfândega como atracções incontornáveis) é mais a vida de bairro que se vive.

Esta parte da cidade é a herança directa da idade do ouro de Salem, quando 50 cais fizeram deste porto um dos mais dinâmicos dos EUA, com milhares de navios em trânsito para o Oriente entre a segunda metade do século XVIII e o final da primeira metade de oitocentos. As ruelas vão inevitavelmente ter à água, há cafés, geladarias, herbanárias em abundância e a Ye Olde Pepper Companie mantém-se como a mais antiga loja de doces do país (há mais de 200 anos que comercializa os Salem Gibralter e os Black Jacks) — as bruxas continuam presentes: por exemplo, no Witch’s Brew Café, quase diante do Witch’s Gifts.

Porém, uma das maiores atracções desta zona da cidade é a The House of the Seven Gables. Na realidade, não é uma casa, é um conjunto de seis, constituído em torno da Turner-Ingersoll Mansion, nome das famílias que habitaram a que é a mais antiga mansão de madeira de Nova Inglaterra e que foi imortalizada por Nathaniel Hawthorne (1804-1864) na sua obra The House of the Seven Gables (A Casa das Sete Empenas). A casa pertencia a uma prima do escritor que aqui situou um romance gótico, onde junta a bruxaria (com memória dos julgamentos de 1692, intimamente ligados à sua família) e sobrenatural, à culpa e expiação. Este é, portanto, um local intimamente ligado ao escritor de Salem, mais conhecido por A Letra Escarlate, para onde foi, aliás, transferida a casa onde nasceu, uma das que fazem parte do complexo, que com os seus vários edifícios reconstitui três séculos da vida da cidade e alimenta projectos sociais.

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