É tempo de regressar à Plaza Mayor.
- Valência?
Não. Palência.
Formosa e não famosa
Volto a olhar a estátua que domina a praça com atenção, à luz do dia, com a mesma admiração — ou mais — com que escutei, momentos antes, as palavras pronunciadas por Julio Monclus.
- Nasci aqui, vivo aqui e vou morrer aqui. Palência é a minha cidade.
Por momentos, também é minha, estimo-a.
A estátua, dedicada a Alonso Berruguete, pintor, escultor e arquitecto nascido em Paredes de Nava, a pouco mais de 20 quilómetros de Palência, parece olhar-me de uma forma afectada.
Umas horas depois, grato pelos raios de sol que me aquecem, caminho na direcção da catedral, onde a antecâmara da noite, na véspera, me descobrira. Mesmo que nenhuma outra razão o motive a viajar para Palência, a catedral de San Antolín, com a sua imponência, é suficiente para dar como bem empregue o tempo que acha que lhe escapou da mão. Quem a conhece bem, intimamente, designa-a (por paradoxal que pareça) por Bela Desconhecida, exacerbando a curiosidade para melhor me identificar com um Monumento Histórico Artístisco Nacional, uma classificação que remonta a 1929 e que ajuda a compreender o seu estatuto de uma das mais formosas catedrais de Espanha — e nesse sentido o turismo de Castela e Leão tem em mãos um projecto para que deixe de ser a Bela Desconhecida e passe a ser a Bela Reconhecida. Quando para ela se olha, como eu a olho, ao início da manhã, limitando o olhar à sua fachada, pintam-se duas palavras no cérebro: austera e sóbria. Mas, uma vez embrenhado no interior, na sua frescura, contemplo com satisfação os seus múltiplos elementos góticos e renascentistas, a profusão de obras de arte que acolhe. Dirijo-me, em primeiro lugar, como que atraído por um íman, para a cripta de San Antolín, a parte mais antiga da igreja, onde foram encontrados vestígios de um templo visigodo e outros enigmas. A catedral é, no seu conjunto, um verdadeiro museu, se bem que é no claustro, uma obra de Gil de Hontañon, funcionando como antessala e sala capitular, que se encontra instalado o Museo Catedralício, o qual, distribuído em redor do claustro, contém obras como El Martírio de San Sebastián, de El Greco, os Desposórios de Santa Catalina, de Mateo Cerezo, bem como trabalhos de Pedro Berruguete, Villoldo e cópias soberbas de pintores italianos. Mas não se fica por aqui, a catedral, muito mais tem para mostrar, como esculturas que vão do século XII ao século XVIII, tapetes de grande qualidade, como o da Redenção, do século XVI, ou a ourivesaria, com uma custódia em prata, do mesmo século, mas de Juan de Benavente.
Palência está longe de se resumir à catedral, há outras igrejas, bonitas, históricas, encantadoras no seu silêncio, convidando os devotos a uma oração ou os turistas a visita quase sempre fugaz. Entre elas, a de San Bernardo, que conserva a fachada da igreja do convento das Carmelitas Descalzas fundado por Santa Teresa no século XVII, o elegante convento de San Pablo, a igreja de Nuestra Señora de la Calle de Palencia, também conhecida como igreja de La Compañia, já que foi mandada erguer pelos jesuítas em finais do século XVI, ou ainda a igreja de San Lázaro e a de San Miguel, esta última com a sua elegante torre subindo nos céus.