Fugas - Vinhos

Nelson Garrido

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O segredo do vinho português descobre-se cada vez mais na vinha

Neste novo enquadramento político e financeiro, a reestruturação de vinhas deixará de ser uma prioridade. Frederico Falcão admite que o ritmo de investimento na modernização das vinhas se reduza, mas não vê nisso um problema de maior. “Muito do que havia a fazer está feito”, nota, pelo que “abrandar o ritmo a reestruturação pode ser bom”. Porquê? Muito provavelmente, as vinhas de pouca qualidade ou as que não tinham viabilidade económica já foram abandonadas ou modernizadas e as que ficaram, principalmente as vinhas velhas, são cada vez mais objecto de devoção dos enólogos. “Agora começa-se a olhar para as vinhas velhas e é importante que isso se faça – por causa da sua qualidade e para se evitar a sua erosão genética”, acrescenta o presidente do IVV.

Um pouco por todas as regiões, as empresas têm apostado em produção das vinhas velhas para fazer alguns dos seus topos de gama – ou seja, estas vinhas revelaram um potencial económico não menosprezável. Porque as videiras com 30 ou 40 anos têm uma aptidão produtiva especial. As suas raízes profundas salvam-nas do stress hídrico nos anos mais secos e disponibilizam-lhes uma maior riqueza de nutrientes, tornando as maturações das suas frutas mais equilibradas. Não se sabe ao certo qual é a área ocupada por estas vinhas no país, mas em regiões com alguma densidade histórica, como o Dão, a Bairrada ou o Douro, muitas sobreviveram e são hoje protegidas como pequenos tesouros do património genético e como fontes de vinhos de excepcional qualidade – veja-se o caso do Legado, um vinho da Sogrape produzido a partir da centenária vinha do Caêdo, no Douro, onde um hectare de videiras produz apenas mil quilos de uvas.

Com uma parte significativa da sua área modernizada e apta para responder aos novos desafios, o sector do vinho entra agora numa fase de balanço entre o passado e o presente que tende a acentuar a sua originalidade no plano internacional. Haverá cada vez mais vinhos orientados para o padrão internacional do consumo, feitos com Syrah ou Petit Verdot e regiões como Lisboa e o Tejo parecem mais vocacionadas para disputar com enorme sucesso as grandes tendências do mercado do que em procurar afirmar as suas identidades em segmentos específicos de consumidores. Mas, no geral, a imagem que o país começa a ter lá fora e os prémios internacionais que os vinhos portugueses continuam a acumular mostram que o arcaísmo de outros tempos é hoje uma enorme vantagem. Sem esse arcaísmo, Portugal jamais poderia ter conservado um património tão vasto e tão original de castas com as quais se pode fazer quase tudo.

Uma pequena ilha no mundo da vinha
A videira é uma planta familiar na paisagem portuguesa, mas Portugal está longe de poder entrar em comparações com a área de vinha dos principais produtores mundiais. De acordo com a Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV), a Espanha tem a maior área de vinha do mundo (1.018 milhões de hectares), seguindo-se a França (800 mil hectares), a Itália (769 mil), a China (570 mil), a Turquia (517 mil) e os Estados Unidos (407 mil). Portugal, com os seus 224 mil hectares de vinha, ocupa a sétima posição neste ranking, mas quando se fala em produção de vinho, o país ocupa uma posição bem mais modesta – está em 11º lugar, o que sublinha a escassa produtividade da vinha nacional.

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