Fugas - Vinhos

Nelson Garrido

O segredo do vinho português descobre-se cada vez mais na vinha

Por Manuel Carvalho

Depois de décadas de reestruturação, como está o património das vinhas em Portugal?

Em Portugal há vinhas nas planícies do sul e nas montanhas do Norte, perto das praias ou nas regiões semiáridas do interior e se a maior parte da área cultivada com esta planta fica longe das grandes cidades, há videiras bem no coração das áreas urbanas do Porto e de Lisboa. Portugal é um país de vinhas, muito mais do que qualquer outra nação da orla mediterrânica - 2,59% do seu território está ocupado com esta cultura e enquanto a Itália se aproxima com 2,55%, a Espanha fica-se pelos 2,01% e a França 1,45%. Mas, mais do que ser um país com muitas vinhas, Portugal é um lugar de vinhas diferentes. O seu património de castas é único. Saber o que fazer com este património, discutir que castas devem ser privilegiadas, perceber se a área actual de vinha é suficiente ou se são necessárias novas plantações e fazer perguntas sobre se está na hora de parar a reestruturação e conservar as vinhas velhas que restam são tópicos cruciais para se identificar o rumo do vinho português no futuro.

Nas últimas duas ou três décadas deram-se passos gigantes nas artes de fazer o vinho, mas a revolução que se produziu nas vinhas não ficou atrás. O balanço do que se fez nas quintas ou nas herdades “é extremamente positivo”, já que “quer do ponto de vista qualitativo, quer do ponto de vista da produção, as nossas vinhas estão hoje muito melhores”, diz Frederico Falcão, presidente do Instituto da Vinha e do Vinho, o órgão do Estado que regula o supervisiona do sector. Nas últimas décadas, a área de vinha sofreu uma lenta mas continuada redução (ronda agora os 220 mil hectares), como aliás aconteceu em todos os países europeus. Mas a que resistiu foi alvo de uma intensa reestruturação.

Para se ter uma ideia desse esforço, entre o ano 2000 e 2015 modernizaram-se 50.800 hectares de vinhas, a uma média de 3.800 hectares por ano. Ou seja, neste período de tempo, quase um quarto da área nacional de vinha foi alterada. E em 2016 esse esforço vai continuar com a modernização de mais cinco ou seis mil hectares de vinha, o que implicará um investimento de 85 milhões de euros. Nos projectos já aprovados no âmbito do programa Vitis, as novas vinhas vão ser plantadas principalmente com as castas Touriga Franca (744 hectares), Aragonês/Tinta Roriz (533 hectares) e Touriga Nacional (531 hectares). No passado recente, a política agrícola europeia disponibilizou ainda fundos para o arranque de vinhas situadas em zonas menos interessantes e permitiu a transferência de direitos de plantação para zonas mais nobres.

O investimento e a modernização do vinhedo foi um passo obrigatório para o vinho português poder exibir as melhorias dos anos recentes. “No final dos anos 90 descobrimos a tecnologia e começámos a fazer vinhos correctos, mas indiferenciados. Quando quisemos dar um salto qualitativo e fazer vinhos com carácter, percebemos que tínhamos de procurar a identidade dos vinhos na vinha”, diz Jorge Moreira, enólogo da Real Companhia Velha, da Quinta de la Rosa e autor do consagrado Poeira, do Douro. Nas reestruturações que foram entretanto feitas, equipas de enólogos e de viticultores  dedicaram-se a desenhar vinhas novas partindo para o terreno com já um conceito de vinho na cabeça. Nesta discussão, a escolha das castas tornou-se um ponto crucial.

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