Fugas - Vinhos

Fernando Veludo/nFactos

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"Já não fazemos bons vinhos só de vez em quando"

Portugal já exporta mais do que produz em termos de volume. Vender o mesmo com mais valor é o principal desafio do vinho português?
Se tivermos juízo, temos de trabalhar exclusivamente o valor. Aliás, Portugal já importa vinhos a granel para satisfazer uma certa procura. De facto, podemos dizer que temos um potencial de colocação no mercado acima do nosso potencial de produção, entendendo que potencial de colocação no mercado é aquilo que conseguimos beber mais aquilo que conseguimos exportar. E esse potencial é insuficiente. Mais do que estarmos a importar de vinhos de entrada de gama ou básicos, é valorizar o que estamos a produzir. Se a prazo exportássemos menos mas com mais valor, ganharíamos.

Até certo ponto, é isso que está a acontecer nos Estados Unidos. O que explica esse desempenho nos Estados Unidos?
Há aqui três efeitos. Um primeiro efeito que é a união do sector em torno na marca “vinhos de Portugal”. Há um grande consenso à volta do reforço do envelope financeiro para os Estados Unidos. Foi um exercício de grande risco. Quando vamos para o Brasil ou para Angola, Portugal é conhecido. O vinho de Portugal em Angola beneficia de uma boa imagem, no Brasil ainda assim também, não temos de explicar quem somos nem de onde vimos. Nos Estados Unidos encontrámos um mercado em grande crescimento, primeiro, segundo é um mercado enorme onde tivemos coragem de ir todos e onde aplicámos a maior fatia de investimento e esse investimento foi depois acompanhado por muitas das denominações de origem. Dá-se a segunda circunstância que é o reconhecimento pelas grandes revistas e eu admito que haja ainda outro factor, que pode ser mal interpretado: os EUA têm resistências próprias no mercado. Nem todos os operadores entram lá. A dimensão do mercado não o torna fácil para pequenos produtores. Há aqui quase uma pequena selecção natural. Os operadores que encontramos nos Estados Unidos são os que estão profissionalmente mais bem preparados. É um mercado mais exigente, mais selectivo.

Uma das estratégias da Viniportugal nos últimos passou pela aposta nas castas nacionais, com destaque para a Touriga Nacional. Os consumidores estrangeiros já sabem o que é a Touriga Nacional?
O enófilo, e já não falamos de profissionais, já começa a perceber. Ainda agora no roadshow que tivemos nos Estados Unidos, onde os americanos pagavam 75 dólares para ir às provas de vinhos portugueses, foi muito agradável ver a facilidade com que eles pronunciam o nome das castas. Algumas são mais difíceis de pronunciar, outras são menos, mas eles demonstram que ter conhecimentos. Touriga Nacional não é novidade, Alvarinho não é novidade, Baga não é também… Sentimos que já estamos a chegar ao consumidor, ao enófilo. Brincamos até um bocadinho, porque Gewurztraminer [uma casta alemã] é difícil de pronunciar, mais difícil que Touriga. Portanto é possível que eles venham a pronunciar a Touriga ou o Encruzado. Mas estamos sempre a falar de um país que produz blends [vinhos com várias castas] num mercado que está habituado a varietais. Temos sempre essa dificuldade. Daí também trabalharmos na educação do consumidor e na formação dos públicos profissionais. Estamos a preparar um grande evento em Londres para o próximo ano em que vamos ainda mais longe. Estamos a pensar em despertar a atenção dos especialistas já não para as 24 ou 26 castas vulgarmente conhecidas ou para as dez que actualmente comunicamos, mas queremos ir um pouco mais longe para dizer: ‘o nosso lote de castas autóctones não acaba aqui’. A Touriga já está na Califórnia, já está na Austrália… pois sim, mas nós temos outras. O Alvarinho está em Espanha? Nós temos outras.

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