Fugas - Vinhos

Fernando Veludo/nFactos

Continuação: página 4 de 5

"Já não fazemos bons vinhos só de vez em quando"

Mas não o incomoda que em anos recentes, mesmo nos concursos da Viniportugal, quem ganha são por vezes vinhos feitos com castas internacionais? Esta situação não é uma contradição à vossa estratégia?
Nós sabemos que as nossas castas são castas difíceis na comunicação. Sabemos que antes de o consumidor entender um determinado taste [aroma, paladar…], é preciso calo. A primeira vez que a Sarah Ahmed [uma jornalista britânica] provou um Baga, achou o vinho horroroso. Mas depois de lhe ser explicada a filosofia e o perfil do vinho, a Sarah Ahmed tornou-se uma apreciadora. Nós sabemos que quando vamos convidar jurados internacionais para um concurso estamos a expor-nos a um risco, porque há pessoas que não têm um contacto mínimo com algumas das nossas castas. E é natural que no resultado final, até porque no grande júri quatro dos seis elementos são estrangeiros, seja muito mais reflexo dos mercados a que eles estão habituados do que nós gostaríamos. Mas o concurso também tem um outro objectivo: a primeira mensagem que quisemos passar foi, ‘venham cá e provem os nossos vinhos sem rede’, porque queremos que eles fiquem com a ideia de que nós produzimos com qualidade.

Que inclui os que são feitos com castas internacionais?
Que inclui todos. O que é importante é que eles digam: ‘Encontrei muito poucos vinhos maus’. Nós gostaríamos que o melhor vinho fosse de uma casta autóctone, mas, se o quiséssemos de uma forma distorcida, não convidávamos estrangeiros. É preciso alguma arte e algum equilíbrio. Nós afirmamo-nos que somos um país de blends, mas procuramos comunicar com varietais. Alguém nos dizia, olhando para a Austrália, que já nos ultrapassaram na viticultura, começaram a ultrapassar-nos na adega, mas na sala de prova ainda vão demorar muitos anos. Na viticultura é sobretudo técnica, na adega é técnica mas começa a haver experiência e quando vamos para a sala de prova, na lotação dos vinhos, é quase sempre a arte, um saber acumulado e intransmissível. O blend é a nossa força e é uma barreira.

Há alguma região portuguesa que se tenha destacado nos anos recentes?  
A região mais exportadora continua a ser o Alentejo e depois os Verdes, tirando o vinho do Porto. Uma região que vale a pena olhar com atenção é o Tejo. As regiões com menos tradição são aquelas que mais facilmente se adaptam aos mercados.

Mas a que traz mais prestígio é o Douro…
É o Douro. Claramente. Há aqui uma região que tem um potencial enorme, que tem castas muito interessantes mas que ainda tem uma barreira, que é o Dão. Julgo que lhe falta densidade de agentes económicos. Tem castas únicas, desde a Touriga Nacional ao Alfrocheiro, passando pelo Encruzado, tem vinhos muito agradáveis, mas o Dão tem falta de densidade de agentes económicos. É certo que em mercados como o Brasil ou Angola ainda se sente aquela imagem do Dão antigo, que esteve na origem dos problemas que a região atravessou. O novo Dão ainda não chegou a esses mercados. A Bairrada está num plano muito engraçado, por mérito próprio, sobretudo porque tem sabido trabalhar a casta Baga e, seja a Baga vinho tranquilo, seja a Baga espumante, nota-se aqui um esforço colectivo, nota-se que há uma direcção que quase todos vão percorrendo. Os Verdes, tem um problema difícil de resolver, que é o da dimensão. É onde se nota mais a micro-dimensão e a pulverização dos agentes económicos
Mas tem tido bons resultados na exportação…
Tem tido óptimos resultados, beneficia do facto de Verdes ser uma denominação de origem mas também uma categoria de vinho, mas essa notoriedade pode dificultar upgrades no produto, que está muito forte nas gamas média e baixa. De um modo geral, com atitudes diferentes, provavelmente as regiões do Sul estão mais preparadas para combater os países do Novo Mundo, pela escala também.

--%>