Fugas - Vinhos

Encontros vínicos no Porto: Divino Dão, eterna Bairrada

Por José Augusto Moreira, Pedro Garcias

Vinhos mais diversificados e cada vez mais reconhecidos. Críticos de vários países afluíram em massa às mostras do passado fim-de-semana no Porto.

As feiras de vinhos são oportunidades únicas de celebração e encontro, mas também para provar coisas diferenciadas. E nem o frio, chuva e ventos fortes fizeram arrefecer o fervor dos entusiastas no passado fim-de-semana, no Porto, onde se juntou o país vinhateiro e também muitos visitantes, especialistas e críticos de todo o mundo.  

Na Essência do Vinho, a organização destaca que “dos cerca de 20 mil visitantes que passaram pelo Palácio da Bolsa, 28% foram estrangeiros, muitos dos quais importadores e jornalistas”. Da mesma forma, no Simplesmente Vinho era notório o ambiente multilingue.  

Os vinhos portugueses estão cada vez personalizados. São vinhos únicos e vibrantes de pequenas produções, expressando quase sempre as características diferenciadoras de pequenas parcelas,produções muitas vezes quase heróicas, manifestações de amor à terra e à natureza.  

Casos como os brancos Casal Figueira, com uvas da casta Vital (quase desaparecida) colhidas entre pedras na encosta atlântica da serra de Montemuro ou as condições desafiantes em que são cultivados os Humus, na serra dos Candeeiros; os vinhos naturais da Casa de Mouraz (Dão) ou Aphros (Minho), o respeito pela tradição nos Terras de Tavares, Casa de Darei, António Madeira ou Quinta das Bágeiras, que fazem com que Dão e Bairrada voltem a ter merecido protagonismo. 

Mas também o excelente trabalho de recuperação de vinhas e castas da Azores Wine Company (os Arinto e Verdelho estão óptimos), os miraculosos Czar (nascidos das pedras de lava), ou os vinhos ricos e distintos que começam a chegar de Trás-os-Montes, como os Quinta de Arcossó e Vale Madruga, que se juntaram no Simplesmente Vinho.  

Também no Palácio da Bolsa Dão e Bairrada assumiram destaque, com provas específicas a evidenciar as qualidades únicas dos seus vinhos. “Divulguem o Dão”, desafiou a enóloga da Quinta de Carvalhais enquanto mostrava a elegância, profundidade e riqueza aromática dos vinhos da propriedade da Sogrape que revolucionou o Dão e agora comemora 25 anos. Beatriz Cabral de Almeida deu a provar os Duque de Viseu dos anos iniciais, os extraordinários Reserva Branco 2011, Encruzado 2014, Colheita 2012 e Reserva Tinto 1997, mas o céu abriu-se com o Tinta Roriz 2003 e o Branco Especial. Os olhares voltaram-se para Manuel Vieira, presente na sala, num agradecimento pelo trabalho que ali deixou até à passagem de testemunho para a actual enóloga.  

Fresco, floral, intenso, elegante e de profundo aroma a caruma e pinhal, este Roriz, com 15 anos, é um monumento ao Dão, enquanto o Branco Especial é um dos melhores brancos de sempre de Portugal. Poderoso, refrescante, estimulante, deixando na boca uma sensação de eternidade.  

Eternos parecem ser também alguns Bairrada, como é o caso do tinto Caves S. João 1963 que fechou a prova “Bairrada, clássicos com modernidade”. Rui Falcão procurou mostrar que, a par do perfil clássico dos seus vinhos, a região tem hoje uma série de produtores que conciliam passado e presente com grande rigor e respeito pela tipicidade bairradina. Vinhos como o branco 2013 de Dirk Niepoort, (Bical e Maria Gomes de vinhas velhas), o Rol de Coisas Antigas 2011 da Casa Campolargo, o Grande Vadio 2012, com Baga de vinha velha, o Casa de Saima Garrafeira 2001 ou o Quinta Foz de Arouce Vinha Velha de Sta. Maria 2011. Frescos, finos e poderosos, fazem da Bairrada um caso à parte.

E se a Bairrada é eterna, “o Dão é divino”, definiu Miguel Louro. Apesar de na sua Quinta do Mouro produzir dos vinhos mais conceituados do Alentejo, Louro não tem dúvidas: “O Dão é a melhor região! O Douro é trabalho do homem, foi o homem que o fez; o Dão é obra de Deus, é divino!” 
(José Augusto Moreira)

Quatro nomes a fixar que se deram a conhecer no Simplesmente Vinho
por Pedro Garcias

Silice Lobeiras 2014
Projecto de três amigos (Juan, Carlos e Fredi), os vinhos Silice, da Ribeira Sacra (Galiza), podem levar-nos literalmente às lágrimas. São tintos e brancos arrancados a pulso de pequenas e formidáveis parcelas penduradas sobre o rio Sil. O melhor de todos é o tinto Silice Finca Lobeiras 2014, proveniente de uma vinha com mais rocha granítica do que videiras. Feito com Mencia, Bastardo e Brancelhão (o Alvarelhão minhoto), é um tinto que emociona, pela sua profundidade, elegância, volúpia e frescura. Só foram cheias 336 garrafas (custa 18 euros à porta da adega). 

Casa Castillo Pie Franco 2013
Este tinto da região espanhola de Jumilla (perto de Alicante) tem origem em vinhas de pé franco com cerca de 70 anos de idade. As videiras, da casta Monastrell, são em vaso e não têm aramação. O solo é arenoso. O vinho fermenta em lagar e passa depois 18 meses em barricas usadas. De aroma e sabor muito mediterrânico (fruta preta e ervas aromáticas em associação com sensações especiadas), é um tinto ao mesmo musculado e elegante, austero e vigoroso, maduro e fresco. Muito bom (35 euros em loja).

Bodega Nanclares Soverribas 2012
Os brancos deste produtor de Cambados, Pontevedra, são do melhor que se faz na Galiza. O Nanclares Crisopa (um belíssimo Alvarinho feito em lagar aberto, como antigamente) é o seu topo de gama, mas o que nos fez salivar mais foi o Nanclares Soverribas 2012. Verdadeiramente assombroso na sua pureza, complexidade e frescura cítrica (17 euros em loja).

Uivo 2011
Tiago Sampaio, o produtor dos vinhos Olho no Pé, do Douro, deu a conhecer um extraordinário colheita tardia de vinhas velhas de 2011. Mas não vai poder engarrafá-lo como vinho, porque só tem 6% de álcool (com esta graduação não é considerado vinho). Terá que chamar-lhe “Mosto de uvas parcialmente fermentadas”. Portuguesices. Um dos melhores vinhos doces da Áustria dos últimos anos, o Bründlmayer Trokenbeerenauslese Steinmassel 2009, também só tem 6% de álcool e é vendido como vinho.  

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