Inicialmente tinham pensado fazer apenas um vinho para o São Rosas, que teria o mesmo nome do restaurante, mas o projecto foi crescendo. Deixamos, com pena, a mesa de camilha com o aquecedor por baixo, e enfrentamos o mau tempo para irmos até ao restaurante. Afinal, nada melhor do que provar os vinhos de Margarida com a sua comida, enquanto a ouvimos explicar o que pretende de cada um, com a ajuda de Marta, a filha, também apaixonada por vinho e que está a colaborar com os pais no projecto.
Saber esperar
“Agora vou ser um pouco mais técnica”, avisa Margarida. Mas continua a falar da mesma forma apaixonada sobre os seus vinhos e, enquanto os provamos, é muito fácil perceber o que ela quer dizer. “Os nossos vinhos não têm truques de enologia”, diz Marta. “Costumo dizer que o enólogo é importante quando alguma coisa corre mal”, acrescenta Margarida. Daí a importância da selecção das uvas na vinha. “As grandes adegas fazem análises, mas às vezes a uva tem o nível de açúcar certo enquanto a grainha está verde e nas análises isso não se detecta. Tem que se trincar para perceber se a grainha está crocante. Uma grainha verde pode deixar um verdor no vinho, como se estivesses a comer um marmelo. Há formas de corrigir isso mas o que queremos é o mínimo de correcções possível.”
A isto soma-se a vontade de manter a produção pequena – são actualmente entre 60 e 70 mil garrafas por ano, entre as cinco referências Monte dos Cabaços (reserva e colheita seleccionada branco e tinto) e Margarida (branco e tinto). “Podia estar a fazer 400 mil garrafas, temos uvas em quantidade para isso, mas cada um de nós tem uma dimensão ideal para trabalhar. Não me sentiria feliz a fazer 400 mil garrafas ou a ter um restaurante com 150 lugares.”
À mesa vão chegando os pratos alentejanos do São Rosas: ovos mexidos com espargos, túberas salteadas, uma deliciosa perdiz, sopa de tomate com ovo, excelentes bochechas de porco preto e, quando achamos que não é possível provarmos mais nada, um irresistível rabo de boi com nabos. Para, claro, tudo acabar nas sobremesas, entre as quais um óptimo pudim de água de Estremoz.
Margarida vai explicando cada vinho e percebe-se a liberdade que concede a si própria na forma como os faz. O Monte dos Cabaços Colheita tem Touriga Nacional, Alicante Bouschet, Aragonez e outras castas, mas em cada ano numa proporção diferente. “Não gosto de ficar presa à obrigatoriedade de uso da casta nem às percentagens. Se achar que o Aragonês não está bom nem sequer o ponho. O perfil do vinho é este mas com variações, com aquilo que o ano expressa. Isto não é Coca-Cola, não tem receita.”
O Colheita não estagia em madeira e o Reserva estagia durante um ano, mas Margarida prefere barricas usadas. “A barrica serve para que o vinho ganhe complexidade, mas não gosto de lhe conferir sabor de madeira.” Outra característica importante dos seus vinhos é que não são feitos para beber logo – e isto aplica-se também aos brancos. São vinhos pelos quais devemos saber esperar (o Margarida branco, por exemplo, feito à base da casta Encruzado, chegou ao mercado com quatro anos, depois de um estágio em madeira e a seguir na garrafa).