Fugas - Vinhos

Como Margarida Cabaço pôs o seu vinho entre os 22 melhores do mundo

Por Alexandra Prado Coelho

“Aprendi a fazer vinho como aprendi a cozinhar, provando e misturando”, diz-nos Margarida Cabaço que, depois de abrir o restaurante São Rosas em Estremoz, produziu, segundo a revista Wine Enthusiast, o 22.º melhor vinho do mundo.

É difícil imaginar como é que a rapariga que nos anos 70 se passeava por Estremoz com longos cabelos aos caracóis, calças de ganga remendadas e botas mexicanas, despertando a curiosidade dos locais, se transformou numa alentejana, cozinheira de primeira e produtora de vinho – e, já agora, um dos seus vinhos, o Monte dos Cabaços Reserva 2007, foi colocado pela revista Wine Enthusiast no 22º lugar da lista dos 100 melhores do mundo.

“Quando cheguei aqui, vinda da Holanda onde vivi entre os seis e os 16 anos, senti-me a cair num precipício, mesmo lá para o fundo”, conta. Estamos sentados à volta de uma mesa redonda numa quinta perto de Estremoz, num dia frio e chuvoso de um Maio atípico, com as pernas metidas debaixo de uma camilha, a apanhar o calor que vem do aquecedor eléctrico e a ouvir a história de Margarida Cabaço, dona do restaurante São Rosas e produtora dos vinhos Monte dos Cabaços e Margarida. Em cima da mesa, chávenas de café.

“As pessoas paravam-me na rua a oferecer dinheiro para comprar as minhas botas”, recorda, acendendo um cigarro. “As meninas aqui andavam de meias pelos joelhos e sapatinhos de atacar. Eu dizia para a minha mãe ‘as pessoas ficam a olhar para mim como se tivessem visto um bicho’”. Não conhecia quase ninguém, sentia-se deslocada, sonhava ir-se embora, implorava ao pai que a pusesse noutro lado, “nem que fosse num colégio interno”.

Mas o pai disse-lhe que tinha que acabar o liceu e foi quando andava ainda às voltas com a geografia e a História de Portugal – que conhecia mal depois de tantos anos na Holanda – que conheceu Joaquim Cabaço. “Eu tinha 17 anos, ele tinha 25 e vinha de muitos sítios. Saiu daqui aos 15 ou 16 anos, foi para Lisboa e assim que fez 18 começou a viajar, dois meses aqui, três ali.” Ela apaixonou-se e convenceu-se de que ia passar a viajar. “Mas ele nunca mais saiu daqui”. E, por isso, Margarida, já com o liceu acabado, comunicou aos pais que afinal também já não queria sair dali.

A primeira aventura, já ao lado de Joaquim, foi a abertura de uma loja em Estremoz, a Show Off. “Isto passa-se em 1979, 80. Fomos a Lisboa escolher as coisas e trouxemos roupa da Ana Salazar, que na altura tinha a marca Maçã, do Giuseppe Luigi que é o José Luís Barbosa, do Pedro Luz, do Philippe Martin”. Abriram e “as pessoas não percebiam o que era a loja”, onde havia roupa mas também música e se podia beber café. Para fazer publicidade às colecções, Margarida chegou a ir para o café central de Estremoz com um amigo, vestidos com os camuflados de Ana Salazar e com as etiquetas penduradas.

Mas a rapariga que achava Estremoz parado estava destinada a algo ainda mais radical. Ficou à espera do primeiro dos seus quatro filhos e, com Joaquim, decidiu mudar-se para o monte do Troca Leite, para uma casinha que não tinha luz nem água. A filha Marta Mateus tem estado a ouvir as histórias da mãe, que agora se cruzam com as suas memórias. “Era uma casa de um conto, foi aí que nós crescemos”, diz, recordando como ficavam as pessoas iluminadas pelos candeeiros a petróleo à noite.

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