Fugas - Vinhos

  • Enric Vives-Rubio
  • Enric Vives-Rubio
  • Enric Vives-Rubio

Continuação: página 2 de 5

Três erros tintos e um erro branco

Em 1994 aparece o primeiro Quinta do Mouro e nasce uma nova estrela no Alentejo. Na época, como agora, o que o movia era uma obstinada recusa em ser apenas mais um. “Se as pessoas gostam, gostam; se não gostam, não gostam”, explica Susete Buinho, agrónoma, enóloga e administrativa da empresa. No duelo entre as facções que consideram o vinho um bem alimentar que se deve ajustar ao mercado e às necessidades dos consumidores e as que acreditam que o vinho só faz sentido se for uma criação original, Miguel Louro está neste lado. Sem dúvidas. “Entre o Essência [uma mostra de vinhos que reúne os principais operadores do vinho português] e o Simplesmente [um evento promovido por pequenos produtores independentes, wine freaks e enólogos alternativos] eu sou Simplesmente”, diz. Para ele, Dirk Niepoort, outro inconformado, é o “pai da rapaziada” que segue essa vaga de fundo.

O seu combate é pelos vinhos autênticos, pela transparência e pela liberdade de criação. Irrita-o o mundo do vinho “certificado, regulado, fiscalizado, tudo feito por um estado burocrático com ideia de aperfeiçoar tudo”, no qual, depois, “nada funciona”. Torna-se áspero quando olha à sua volta e pressente os embrulhos do marketing. “Há quem faça muito marketing com os solos e os terroir e a seguir manda vir um camião de Espanha carregado de vinho e continua a mentir. Hoje, o que vende o produto é a imagem”, acusa, para logo depois se destacar da corrente: “Sou um dos poucos a ser realmente vitivinicultor. Só faço as minhas uvas. Os consumidores sabem que se abrirem uma garrafa minha que o vinho é de Estremoz”. Para que não restem dúvidas, “o meu vinho tem de ser irreverente e polémico. Como eu sou”.

Não admira que esta atitude de denúncia e criticismo o tornem pouco simpático para a indústria convencional. O que faz e o que diz “não é para chatear ninguém”, assegura. O problema é que “o marketing ou tem como base a verdade ou é uma vigarice”. Infelizmente, porém, “hoje para se sobreviver tem de se mentir. Mentir falando e mentir escrevendo. Por isso ponho tão pouca informação nos meus rótulos”.

Essa atitude, porém, não basta para explicar o sucesso da Quinta do Mouro. Desde que Marc Squires, jornalista da Wine Advocat, de Robert Parker, considerou que o seu vinho era “Italian old style. Horrible” até o distinguir como o melhor produtor de uma região em forte processo de afirmação, não decorreram muitos anos. “Tinha amigos no sector que diziam que eu era um ignorante e que os vinhos só eram bons porque tinha sorte”, lembra. Talvez. Mas, no vinho como em muitas outras coisas, a sorte procura-se. Mesmo numa vinha numa região privilegiada (Estremoz), onde um lençol freático cria condições únicas para tintos elegantes e distintos, houve que fazer e desfazer muitas coisas até se chegar a um ponto de equilíbrio.

Na vinha logo acima da adega, por exemplo, a qualidade produzida era insatisfatória. As castas eram Touriga Nacional e Trincadeira. Louro decidiu então mudar a condução da vinha. Aumentou a sua altura e abriu-lhes mais os braços. Resultou. Um pouco por todos os seus vinhedos, a experiência é permanente. Miguel Louro aprendeu por si. No terreno. “Se não experimentarmos nunca saberemos o potencial das vinhas”, diz. Para ele, não há cabimento para os saberes acabados. “Um engenheiro diz uma coisa, outro diz outra…”, lamenta, ele que nunca recorreu ao saber dos académicos. “Para quê? Eu sei mais do que eles…”.

--%>