Portugal tem uma história milenar ligada ao vinho, mas, até há bem pouco tempo, só era reconhecido internacionalmente pelos seus fortificados, Porto e Madeira, em especial. Há pouco mais de três décadas, o país iniciou uma extraordinária revolução vitivinícola e passou a produzir também vinhos tintos de nível internacional. Uma revolução que coincidiu com a chegada ao mercado de uma nova geração de enólogos, com a descoberta do Alentejo e com a reconversão do Douro, até aí focado quase em exclusivo no vinho do Porto, aos vinhos tranquilos. Olhando hoje para a quantidade de marcas existentes nesta região e para a notoriedade de muitas delas, é difícil acreditar que tudo começou nos alvores dos anos 90 do século passado. Marcas como Vallado, Crasto, Vale Dona Maria, Batuta, Vale Meão, Quinta da Leda, Gaivosa, Pintas, Poeira, Duas Quintas, Chryseia e tantas outras ainda não existiam há 30 anos. E 30 anos na história do vinho não é nada.
Até por isso, é ainda mais notável o percurso que o país também tem feito nos vinhos brancos, muito mais exigentes em tecnologia e conhecimento. É uma espécie de segunda revolução, igualmente transversal a todo o país, ilhas incluídas. Na verdade, estamos a viver uma mudança iniciada há cerca de uma década. É um processo ainda em curso, mas já com reflexos nas pontuações da crítica internacional. Ver um branco ser pontuado com 90 ou mais pontos pelas principais revistas internacionais do sector era, até há bem pouco tempo, algo raro. Agora, já há brancos a disputar os lugares cimeiros com os tintos.
“A qualidade do vinho branco aumentou imenso em Portugal. Há melhor enologia e melhor tecnologia e a viticultura também melhorou bastante. E, com o aumento da oferta de bons vinhos a bom preço, o consumo também tem vindo a crescer”, sublinha Anselmo Mendes, o “senhor Alvarinho”, um dos mais renomados produtores de vinhos brancos do país. Na sua opinião, a região dos Vinhos Verdes tem tido um papel importante no incremento dos brancos, em grande parte graças à Alvarinho, cujo sucesso ajudou a melhorar o nível geral dos vinhos da região e levou à expansão da casta para fora do Minho. Anselmo destaca também o contributo da Arinto, a variedade mais transversal de todas. “É a casta que melhor representa Portugal. Foi a Arinto que salvou os vinhos brancos do Alentejo”, diz (ver texto sobre grandes duplas de brancos).
A uma velocidade que ninguém antecipou, Portugal está a deixar de ser um país apenas de tintos, apesar destes ainda serem os preferidos. O tempo em que as escolhas de Verão se resumiam só ao João Pires, ao Frei João, ao Porca de Murça e a mais uns quantos vinhos de cooperativa, quando os Arinto de Bucelas, os Malvasia de Colares, os Bussaco ou os Alvarinho do Palácio da Brejoeira eram as jóias raras e exclusivas dos nossos brancos, já faz parte do passado. Hoje, do Douro ao Algarve, do Alentejo ao Dão, da Bairrada aos Açores, fazem-se cada vez mais e melhores brancos. O que está a acontecer na ilha do Pico, nos Açores, por exemplo, um terroir de brancos por excelência e onde em apenas três anos quase triplicou a área de vinha, é bem revelador dessa mudança.