Fugas - Vinhos

  • Margarida Basto
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"Tenho um defeito horrível: tenho de ter terra"

De consultor tornou-se um empresário. Gasta mais tempo na gestão ou a enologia?

Houve aqui uma altura em que tive de arrumar a casa, os investimentos foram muitos, houve um investimento fortíssimo no Douro, o mercado empurrou-me para crescer. O dinheiro que eu investi foi da actividade e dos bancos. Eu não o tinha, não tinha nada. Quando comecei não tinha um metro quadrado de terra. Isso exigiu muito de mim e às vezes desviei-me daquilo que eu gosto de fazer, que é enologia. Agora que estou numa fase de arrumar a casa e tenho os meus filhos a bordo, o João Maria na parte da enologia e a Filipa na parte de marketing e gestão, sabendo que tenho uma equipa forte, vou acompanhar as várias vertentes. Confesso que o que eu gosto de fazer é provar e beber vinhos. O meu DNA é o que é. Mas, para um projecto começado por mim como enólogo consultor, sem muitas possibilidades, ter chegado onde chegou, concerteza que não podia olhar só para os vinhos. Hoje tenho 140 pessoas a trabalhar comigo. Vou relaxar um bocado e fazer o que gosto: fazer vinhos cada vez melhores.

No início da sua aventura era um ardoroso defensor da supremacia do Alentejo sobre o resto do país – é memorável uma discussão com o João Nicolau de Almeida na televisão, em meados dos anos 90. Mantém essa convicção?

Lembro-me muito bem. Foi com a Maria Elisa. O que eu disse, e mantenho, é: não conheço nenhuma região em Portugal onde, se se cumprirem as regras do que é fazer um vinho, se consegue fazer bons vinhos em todo o lado como o Alentejo. O Alentejo era já uma realidade, os outros eram-no potencialmente. O Alentejo demonstrou estar à frente. Para todos os efeitos, a única região em Portugal onde todo o vinho que se produz vai para dentro de uma garrafa é o Alentejo. Não há mais nenhuma.

Hoje o Alentejo ainda tem essa liderança?

Eu acho que é a região mais consistente do país. É mais difícil haver uma colheita fraca no Alentejo do que em outras regiões. Depois, mesmo até na parte de viticultura, na parte de campo, o Alentejo foi à frente e está à frente. Havia poucas vinhas menos bem tratadas do que em outras regiões. Em termos de modernização industrial das cooperativas, o Alentejo está muito à frente.  

Essa vanguarda do Alentejo mantém-se?

Eu acho que se mantém, embora reconheça que houve uma grande melhoria das outras regiões. Não me pergunte quais são os melhores vinhos que eu não lhe digo. Digo que a média no Alentejo para mim é melhor. Até aceito que o Douro possa ser no futuro uma região tão boa ou melhor do que o Alentejo. Mas a realidade da viticultura não está espelhada no vinho.  

O que o levou para o Tejo, para o projecto Falua? A região está mais vocacionada para as castas internacionais e para o volume. Pode fazer lá vinho com o pedigree do Alentejo?

Se pudesse voltar atrás não sei se faria a mesma coisa. Mas, enfim, aconteceu numa altura em que o Alentejo não tinha uvas, comecei a ser conhecido como enólogo, dava assistência como consultor a uma série de produtores do Tejo, cheguei a ter cinco casas, e pensei: estas cinco casas não engarrafam, nunca engarrafaram, vão todas começar a engarrafar, eram casas grandes. Por que não fazer uma sociedade em que eles? Seriam todos sócios, fazíamos uma linha de engarrafamento, engarrafavam-se as marcas de cada um e depois o restante fazia-se uma marca comum para exportar.

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