Fugas - Vinhos

  • Margarida Basto
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"Tenho um defeito horrível: tenho de ter terra"

Eu gosto de andar com as castas portuguesas sempre à frente. Mas reconheço que há castas que não são nacionais e que são muito boas. Acho que no Douro não faz sentido nenhum pôr castas estrangeiras. Dizem-me para plantar Syrah, mas eu não quero. O Douro não precisa de castas internacionais. Agora, uma boa Syrah no Alentejo é fantástica. A Merlot é uma casta boa, a Petit Verdot funciona bem.  

Há uma casta com a qual goste mais de trabalhar?

Há várias. Das internacionais, a Syrah, sem dúvida. Das portuguesas a Alicante Bouschet é a mais fácil de dizer. Em tempos eu dizia que não estava satisfeito com o comportamento da Aragonez no Alentejo e hoje em dia recuo um bocadinho no discurso. A Aragonez levou muita pancada de clones despachados de Tempranilhos produtivos. Também gosto da Alfrocheiro, é uma casta engraçada. A Touriga acaba por se portar bem no Alentejo. O José Maria Soares Franco gosta muito da Touriga Francesa e eu estava um bocadinho contra a Touriga Francesa. Experimentei, andei atrás dela e este ano tivemos óptimos resultados no Alentejo.

O seu filho João Maria já entrou na equipa de enologia da sua empresa. Em que aspecto ele pode ser melhor enólogo do que o pai?

Em tudo. Especialmente no conhecimento. Eu com a idade dele não sabia um décimo do que ele sabe. A geração dele, mesmo a geração de 40 anos, teve mais oportunidades de estudar. O João já fez uma vindima no Chile, esteve em Bordéus, em Madrid, em Montpellier, tem outra bagagem. Ele tinha seis ou sete anos quando comecei a fazer a adega no Alentejo. Assistiu a tudo.

Há algum vinho feito por si do qual guarde uma memória especial?

Há. Foi um vinho feito em talha… por acaso, foi feito em talha e em depósito, estou-me a lembrar. Foi o melhor vinho na produção, em 1984, que era feito com uvas do José Maria Almodôvar. Chamava-se Paço dos Infantes. Nunca mais bebi um vinho parecido com aquele. Era extraordinário. Tenho duas garrafas que ainda não abrir, duplo magnum. Até estou com medo. Não sou capaz de fazer aquilo outra vez.  

E que erro não voltaria a cometer nas suas apostas?

Fiz tantos erros. Os erros levam à aprendizagem. Mas não consigo lembrar-me nenhum em concreto. Uma coisa digo: quando se fazem centenas de milhões de litros de vinho, como eu fiz na minha vida, é possível haver um percalço. Mas nunca azedei um vinho. Nunca. Isso não é mau.

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