“Estou com medo mas vou à mesma”, confessa Pedro, 13 anos, olhar doce e traquina. Mede a altura e os riscos da descida, apreensivo, recupera a coragem e lá vai ele, escorrega amarelo abaixo. O irmão Miguel, um ano mais novo, segue ao lado, no vermelho. Só custa à primeira, só afligem aqueles breves minutos de antecipação. Depois vem a adrenalina, deslizando pelo corpo à medida que se desce a gravidade aquática. E “só queres mais, mais e mais”, garante Vânia, 19 anos, já no fim daquela linha de plástico garrido.
O FreeFall é a nova atracção do Aquashow, em Quarteira, inaugurado no início do Verão com a primeira escorregadela oficial feita pelo surfista Garret McNamara. É “o maior da Europa”, descreve a empresa, e é, na verdade, um doi-em-um: um escorrega vermelho e um amarelo, lado a lado, os mesmos 32 metros de altura e 129 metros de comprimento, um diferente ziguezaguear. No primeiro, a queda livre é instantânea, amenizada por um longo e suave deslizar no final; no segundo, a descida inicia-se quase na horizontal para depois cair a pique.
Lá em cima, a pergunta é sempre a mesma. “Qual é o pior?”, lançam ao nadador-salvador num misto de medo e excitação. “O amarelo”, devolve o rapaz com ar entediado. São muitos os “ai, meu Deus” suspirados antes de se lançarem no vazio de plástico e água, o corpo de barriga para cima, pernas e braços cruzados. “Sente-se o vento?”, pergunta uma rapariga à amiga que acaba de se deixar ir. “Não”, ainda grita a outra antes de desaparecer. Está um dia de Verão ameno, mas no topo das escadas em caracol quadrado — protagonistas de uma “corrida vertical”, realizada no início de Agosto — a brisa transforma-se em ventania e o olhar alcança todo o complexo de diversões, rodeado de pinheiros e algumas vivendas.
Vemos lá ao fundo a zona temática, com a montanha-russa, as pistas ondulantes do Speed Race, o palco dos shows com animais e as diversões a seco dos aviões do Air Race e do anel pendular do Top Swing. Vemos aqui a zona aquática, com as bóias do White Fall, o serpenteado dos tubos e da Wild Snake, o Aqualândia e a piscina de ondas. Vemos serra e vemos mar.
Quando descemos, já Pedro e Miguel estão novamente na fila. São do Porto e estão a passar férias no Algarve. Os pais — pouco dados a estas aventuras, contam — aguardam por eles pacientemente numa das esplanadas do recinto, mas a energia dos dois parece inesgotável e a espera promete ser longa. Agora que o receio passou, querem trocar e experimentar o outro dos dois escorregas. “Só deu medo no meio, que era mais rápido”, diz Pedro. “A água vai para os olhos de propósito para não se ver”, acrescenta Miguel. Contas feitas, aquela é a atracção preferida até agora. “Tem mais adrenalina.”
Ondas e shows de serpentes
Entre uma diversão e outra, os blocos de relva pintam-se de toalhas coloridas, cada sombra com o seu pequeno arco-íris. Há quem tenha trazido chapéus-de-sol, geleiras e cadeiras de praia. Não falta sequer o vendedor de bolas de berlim (1,5€ a simples e 2€ com creme). Há gente deitada a bronzear-se e outros que conversam em grupo, mas a maioria do espaço é apenas um amontoado de pertences, vestígios de alguém que estará numa esplanada, numa piscina, numa fila de escorrega ou de casa de banho.
A montanha-russa aquática é provavelmente a diversão mais requisitada e a espera é de mais de 30 minutos. Ondina Santos, 65 anos, aguarda ali próximo que a família regresse daquele serpenteado de ferros azuis e salpicos de água. De férias em Monte Gordo, é a primeira vez que visita o Aquashow e “nem queria vir”, mas “até está a gostar”. “Estes [escorregas] muito altos fazem-me impressão”, confessa. “O meu marido é que adora estas coisas. Vai a todas”, ri-se. Já ela ficou-se pela piscina das crianças com os netos e pela piscina de ondas, anunciada como “a maior” do país.
É lá que nos sentimos mais apartados do resto do parque: os altifalantes cantam as músicas do momento e as estruturas em volta escondem as restantes diversões. Temos restauração, espreguiçadeiras, um jacuzzi, tendas de massagens e de fish spa. Os escorregas parecem uma lembrança distante. Na água, um mar de corpos balança em degradé de bronzeados, o amarelo intenso das bóias brilha aqui e ali e há vários elementos do staff com água até à cintura e câmara fotográfica em punho. Não há momento alto da experiência deste dia que não vá ser fotografado. Cada recordação custa 10€.
Ao chegar, há a pose junto à entrada. Na montanha-russa, as expressões dos rostos durante a descida mais acentuada. Nas zonas de passagem, as fotos com araras, serpentes e aves de rapina. “Cuidado, que ela é venenosa”, brinca um rapaz ao passar e, por momentos, o miúdo encolhe-se debaixo da cobra, mas logo depois já sorri para as fotos. “Têm mais medo os homens do que as crianças”, conta Andreina, 17 anos, bicho lânguido aos ombros. Começou o estágio a tirar fotografias e agora passou para a interacção com os répteis.
“Posso tocar? Oh, c’est bon”, diz Vanessa, 21 anos, olhando para os amigos. Os pais são do Alentejo, ela já nasceu na Suíça. De “dois em dois anos”, o programa de férias inclui uma visita ao Aquashow. “Hoje, por acaso, estive quase sempre na toalha, mas já experimentei os escorregas novos e agora toquei numa cobra pela primeira vez. Parece viscosa mas até é fofinha”, ri-se.
No palco dos espectáculos com animais há seis apresentações diárias, entre shows de reptéis, araras e aves de rapina. Ali próximo, nada-se num tanque com leões marinhos, uma actividade extra que custa 49€. Quando por lá passámos, onze pessoas encostavam-se ao rebordo da piscina, enquanto o animal, ao sinal da treinadora, batia “palmas”, encharcando-os a todos de surpresa. É o final da interacção, que dura cerca de 45 minutos, com direito a nadar nas costas do leão marinho, fazer alguns truques e receber beijinhos.
“É um bom sítio para passar um dia diferente das férias”, resume Tiago, de 18 anos, que veio com a família de Guimarães. É a terceira vez que vem ao Aquashow, já visitou os restantes parques aquáticos do Algarve. Para o ano, há-de repetir. “É divertido”, defende. É que aqui a diversão mede-se em adrenalina e ela parece estar em todo o lado.
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Escorregar e mergulhar, até à última gota de adrenalina