E como é aqui no Inverno? “É fantástico, fantástico!” Ficamos com a impressão de que fosse qual fosse a estação do ano, à nossa pergunta João Afonso responderia com o mesmo entusiasmo. O antigo bailarino do Ballet Gulbenkian, actualmente crítico e produtor de vinhos, acaba de inaugurar o seu turismo rural em Cabeças de Reguengos, em pleno Parque Natural da Serra de São Mamede, e está encantado.
Chegamos à hora do almoço. João Afonso está na cozinha a fazer umas batatas fritas estaladiças. Está um dia bonito, e lá fora a propriedade mergulhou num sossego de pós-vindima. É Inês Afonso, a filha de João, quem assegura o funcionamento diário do agro-turismo, mas o pai também passa ali muito tempo — e passará mais à medida que os projectos que tem para este espaço se forem concretizando.
A primeira coisa de que falamos, antes mesmo de irmos conhecer melhor a casa, é de vinho. E faz sentido, já que toda esta aventura começou por causa do vinho — aqui João Afonso faz o Equinócio e o Solstício. “Esta era uma quinta com vinhas centenárias. Cheguei aqui e vi que ia ter a oportunidade de fazer um vinho de vinhas velhas”, conta. E essa era uma oportunidade que não queria perder. À sua disposição tinha 7,6 hectares, dos quais 4,5 de vinha, uma quantidade de castas misturadas, 14 brancas, 12 tintas, um potencial para fazer vinhos “como se fazia antigamente”. E ele garante que esses, “quando eram bons, eram verdadeiramente inacreditáveis”.
“Por vezes, tenho oportunidade de provar vinhos dos anos 1950, 60, 70 e 80, que são obras de arte, de uma elegância e encanto que desconfio que estes [os que se fazem hoje] não vão atingir. Hoje as pessoas estão a produzir muito e depressa”, continua, enquanto passamos à mesa para almoçar. A região em que nos encontramos “era famosa pelo vinho de talha”, e por isso vai ter também na adega duas talhas de barro.
O que João Afonso quer contrariar é a tendência que se instalou nas últimas décadas “para usarmos todos as mesmas castas, os mesmos clones”. Frisa, no entanto, que não tem nada contra os tempos modernos. “Mas tenho pena que se tenha perdido uma parte do saber antigo, e estou a tentar mudar isso.”
O regresso ao passado que está a tentar em Reguengo é, acima de tudo, um “projecto poético, estético”. Um bailarino pode deixar de dançar, mas não deixa de perseguir um ideal estético. “Para mim, estética é ter na natureza muitas espécies juntas, em vez de ter uma paisagem de monocultura. As plantas vivem em sociedade. Só o homem, com a sua ambição, e necessidade financeira, é que começou a criar estes desertos de vinha, como eu lhes chamo.”
Foi em 1993 que João Afonso abandonou a profissão de bailarino, e no ano seguinte, inspirado por um livro que a mulher lhe tinha oferecido uma década antes, Conhecer e Trabalhar o Vinho, de Emile Peynaud, arriscou lançar-se na produção. Começou com um tinto das vinhas de família, na Beira Alta, perto de Pinhel, conheceu Dirk Niepoort, e criou a marca Rogenda, que terminou em 2006.
Quando chegou ao Reguengo, em 2009, “isto era mato, mato”, e a vinha estava abandonada, conta. Recuperou-a, transplantando cepas e plantando vinha nova, bisneta da velha, optou pelo modo de produção biológico (o objectivo é implementar o biodinâmico), manteve as outras culturas, e neste momento “a única coisa que falta” quando olha lá para fora “são as ovelhas”. Está ansioso por as ver chegar.
- Nome
- Cabeças do Reguengo
- Local
- Portalegre, Reguengo, Estrada dos Moleiros, 15
- Telefone
- 245201005
- Website
- http://cabecasdoreguengo.com/