Chama-se 7 Maravilhas mas, por este bar e casa de pasto do Porto, as maravilhas até podem ser mais que sete. Nesta viagem, não faltam "comidinhas e bebidas de todo o mundo"
Pub
Há um altar de oferendas, colorido como o que os mexicanos fazem por altura do dia dos mortos: deuses indianos e pré-colombianos, gatinhos, cisnes e outras peças de barro e porcelana kitsches q.b., caveiras várias, flores muitas. Não há-de ficar assim, porque a ideia é que amigos e clientes vão deixando coisas, nem que seja uma dedicatória - o livro ainda não existe. Não existe ainda também o planisfério, onde quem chega assinalará de onde vem.
E nestas poucas semanas de funcionamento já aqui chegaram viajantes de vários cantos do mundo. Colômbia, Austrália, EUA, Canadá, Coreia, muitos europeus, enumera Thomas Gawrisch, jaleca azul marinho, o smutje (cozinheiro de navio), como gosta de ser chamado. Se o mundo não cabe todo dentro deste espaço no centro histórico portuense, que são três salas entre granito portuense, arrancado ao olvido a que camadas de cimento e pintura o tinham condenado, não é por falta de querer. Esse, aliás, reflecte-se até no nome, que, na verdade, até peca por defeito (já lá iremos). As 7 Maravilhas são mais do que sete e o que o nome não diz, mostra-o o logótipo - são do mundo. Um mundo que aqui se serve nos pratos e nos copos.
Goulash, pimentos padrón, ovos salgados, tábua de queijos e enchidos; mixta cubana, rotterdamned, paellanegra; Ouzo, Pernord Ricard, Jagermeister, Becherovka, Amaretto; Duvel, Chimney, Coronita, Fucking Hell. Comecemos por aqui esta volta ao mundo que tem por palco um local de pergaminhos gastronómicos em jeito alternativo do Porto. Foi Taipas | Feijão, foi Canastra Azul. Esteve fechado até que Thomas o descobriu quando ele e Juliana Brandão, a outra metade deste projecto, até tinham vindo ver outro espaço na mesma rua. “Entrámos e sentimos: é isto”, recorda Juliana. “Estamos com muito bom feeling.”
Antes de o mundo chegar, dois meses foram passados a refazer esta antiga casa de pasto nesta nova casa de pasto (gastro pub). Nova no espírito, na atitude e até no visual, o que pode ser contraditório se atendermos ao facto de que este é quase todo feito de coisas antigas. Mas há algo mais moderno do que esse espírito retro-vintage sobretudo quando acompanhado de preocupações de sustentabilidade que fazem com que, por exemplo óbvio, a estante por detrás do balcão seja feita de caixas de fruta de madeira? - um puzzle em construção à medida das necessidades. E falando de retro-vintage, que dizer do balcão em fórmica, com duas “montras”, um quadrado e uma prateleira, que terá no mínimo uns 50 anos, aventamos nós?
É um cenário peculiar, o que foi escolhido por Juliana e Thomas para se lançarem na sua aventura pessoal de cozinharem para fora. Na verdade, Thomas, produtor de eventos, foi durante algum tempo responsável pelo catering do Hard Club; Juliana, especialista em terapias alternativas (massagens sacro-cranianas) viveu a experiência dos pais, que tiveram cafés e esplanadas (e agora estão n'' As 7 Maravilhas a ajudar porque não sabem, nem querem, fazer outra coisa). Os amigos diziam-lhes que cozinhavam tão bem que tinham de abrir qualquer coisa. No Verão passado, tudo se alinhou. “Era então ou nunca”, recorda Juliana. Foi então, portanto; e com toda a sua bagagem cultural como base para chegar a este conceito universal.
Tinha de ser assim, ou não fossem os seus criadores dois produtos de cidades cosmopolitas: por um lado, Juliana Brandão, 13 anos a viver em Roterdão; por outro, Thomas, nado e criado em Berlim (e os últimos dez anos no Porto). “São cidades onde há muitas nacionalidades”, explica Juliana. E eles quiseram trazer essa atmosfera para o Porto - apresentá-la à mesa. Esse é ainda um work in progress: não só o menu está sujeito a alterações e, especialmente, a ampliações, como o próprio espaço pode vir a revelar surpresas. Afinal, ainda há uma sala que por agora faz de escritório e arrecadação que pode transformar-se numa sala árabe e um terraço que poderá ter esplanada.
Por enquanto, a fachada branca com vermelho-ferrugem abre para uma casa de pasto contemporânea que se divide em três espaços. A rusticidade do local, temperada com a criatividade, começa logo fora, onde uma janela-montra exibe um pequeno globo em movimento aparentemente perpétuo e um prato, talheres e copo estão postos à laia de marionetas.
Entramos por uma pesada porta de madeira que ostenta o sinal de entrada para o “salão” (os nomes foram dados durante as obras para identificarem as várias salas), o espaço principal, com mesas e cadeiras de várias proveniências, aparadores que prolongam o balcão ou são mesmo aparadores a dar um toque ecléctico num todo homogéneo.
A segunda sala é o bourgeois, nas traseiras, depois de um corredor de pedra, candeeiro com laivos medievais e duas espadas e uma máscara que recordam a maneira como Juliana e Thomas se conheceram (ele era o professor de esgrima, ela a aluna): é uma pequena sala de estar, de convívio, “com o conforto de casa”. A última sala, a “do altar”, esconde-se num meio-primeiro e é mais reservada, própria para grupos, com mesa grande e bancos corridos.
É casa de pasto e tem um horário pouco dado a fora de horas. Mas oferece muito rock''n''roll. Não se esperem DJ, mas rock dos anos 40 e 50 e ska e reggae antigo não faltarão - “uma onda muito americana com que nos identificamos”, nota Juliana. Isto na música, porque nos resto, já vimos, o mundo tem aqui uma casa. Manifesto gastronómico
A espécie de manifesto gastronómico que lemos no Facebook reflecte as ambições de As 7 Maravilhas, por enquanto, pelo menos, claramente desmesuradas: da nova cozinha americana à fusão asiática, da comida das Caraíbas à chinesa, da França e Alemanha à Grécia e Mediterrâneo, da Índia ao México, do Japão e Coreia ao Médio Oriente, do Havai à Rússia.
Os clássicos são os pratos fixos e que vão ter mais companhia em breve; o menu diário divide-se em “sopinha”, “sandinha”, “comidinha” e “docinho”. Não é tudo tão pequenino como parece, tão-pouco são doses grandes, para não se confundir com restaurante - a ideia é mais picar.
Para beber, por exemplo, há uma lista extensa de aperitivos e digestivos de vários países, um leque de 30 cervejas e 20 whiskies (em crescimento) e café, claro, com origem nos quatro cantos do mundo.
__ Preços: cerveja de 1,50€ a 8€; espirituosas e digestivos a partir de 2€; brancas a partir de 5€ - shots 3€; vinho a copo a 1,50€; caneca de meio litro a 2,50€; café entre 0,65 e 1,90€; água a 0,60€; limonada a 3€. Comidas: clássicos entre 1€ e 4,90€; sandinhas entre 3,50€ e 5,50€; comidinha entre 5€ e 5,50€; docinhos a 2€.