A conversa cruza as linhas de um texto-poema existencialista deixado por uma cliente numa gaveta de uma das mesinhas com o convite expresso a outros de esconderem por ali (e portanto partilharem) o que lhes vai pela alma. Fosse esta uma fábula mesmo e seriam as próprias peças de mobiliário (muito bem) recuperadas de outras épocas, a contar a história e a falar deste Fábulas; mas, na vida real, o que contam estes objectos não é através de palavras. Se bem que há por ali uma tábua de passar a ferro e muitas máquinas de costura, agora mesas, que, bem animadas, poderiam ter muito a dizer.
O Fábulas nasceu da junção de vidas e culturas de Belarmino, que profissionalmente está ligado ao cinema de animação, e de Kamila, pintora nascida na Polónia (mas não espere referências polacas directas por aqui, que não as há). Conheceram-se em Itália - "uma história de amores de estudantes como qualquer outra", diz Kamila - e interligaram as suas vidas. Não será bem uma história como qualquer outra, já que não serão muitas as que acabam numa união em forma de espaço Fábulas que, desde uma discreta abertura em Setembro passado, não pára de conquistar fãs, tornando-se já uma das referências do Chiado. Encontraram o edifício por acaso, "chamar-lhe uma ruína é pouco", diz Berlarmino - estava desocupado desde os anos 80, altura em que a histórica Macieira ainda lhe chamava casa, encontrando-se inserido na zona do Chiado reconstruída sob as linhas de Siza Vieira. Depois de muita limpeza, restauro e trabalhos vários, e a certeza de que queriam "um espaço de liberdade", aplicaram a união da sua criatividade em não fazer mais-do-mesmo, procurando criar uma casa repleta de alternativas e nunca de cópias. Está visto o resultado, que se espelha na decoração inteligente e bem conseguida das várias salas ou mesmo na pródiga ementa ("começámos com umas sanduíches e saladas e a coisa foi crescendo...", conta Kamila), que procura ir muito mais além dos lugares-comuns habituais (salte já para a secção das Referências e verá), no serviço atencioso, na banda sonora não invasiva ou na dinâmica cultural - inclui uma galeria de arte, com curadoria da equipa da revista "Umbigo". E salas não faltam por aqui, algumas ainda por desbravar.
Os espaços, com tectos arqueados, sucedem-se em galerias, com paredes de pedra à vista ou então pintadas em branco ou vermelho. A sala principal, dividida pelo balcão de serviço, reparte-se por um espaço aberto e outro mais íntimo, com ambiente lounge, cores quentes e estrelas do cinema do cinema mudo a espiarem-nos. Há por aqui muitos detalhes a descobrir e outros a usar, incluindo uma pequena biblioteca. Corredor fora, descobre-se a galeria de arte e, mais à frente, chega-se a outra acolhedora sala (a de fumadores), com porta directa para o pátio (R. Garrett, 19) onde o Fábulas tem serviço de esplanada - na entrada principal (na Calçada Nova de São Francisco), há também uma mini-esplanada na escadaria. No piso de cima, há outra bela sala ao serviço, com um ar de escritório invejado por muitos: por aqui, alinham-se alguns computadores, sofás e até velhas secretárias.Há ainda por ali outras salinhas, cujo destino depende do tempo, tal como outras iniciativas - Belarmino adianta que estão a ponderar a colocação de um palco para concertos intimistas e até tornar um dos espaços uma verdadeira sala de cinema. A ideia de ambos é deixar respirar as Fábulas, para que o seu desenvolvimento seja natural e com uma dimensão humana. Para já, é tempo de saborear o que o tempo e as pessoas que vivem o espaço vão trazendo. Sempre com a mesma sensação: ""ue as pessoas se sintam como em sua casa", resume Berlarmino.
Do burrito ao cuscuz
A ementa do Fábulas não pára de crescer e tem muito que se lhe diga: é imaginativa, variada e tudo o que se provou passou a prova com distinção. Ele há crepes (o Rigoletto é um "must" - queijo de cabra e beringela), omeletes, saladas (a Feijão Mágico é chamativa - feijão preto, pimento, tomate e queijo de cabra), sanduíches para todos os gostos (que tal uma Sheherezada? - brie, mel e espinafres), sopas, quiches, tartines e um longo etc. que inclui uns raros tacos, burritos e cuscuz. E, para um final mais que feliz: sobremesas de arrasar. Já há quem diga que têm o melhor bolo de chocolate e não ficam atrás deste outras especialidades. As palavras seguintes até têm sabor - experimente pronunciar devagar: Morangos marinados com creme de queijo e hortelã.
Vai uma Fada Verde?
A ementa de bebidas é variada, com dezena e meia de cocktails e outros tantos aperitivos. Os cocktails incluem os clássicos e algumas variedades contextualizadas: um Fábulas Cosmopolitan, por exemplo (vodka, cassis, triple sec, sumo de lima). Pelos aperitivos, pode provar uma Fada Verde (espumante e xarope de menta). Há ainda "flutes" de champanhe e kirs ou vinho (a copo e garrafa). Noutra dimensão, encontramos café marroquino (café com leite e chocolate), chocolate, café "shakerado" (com gelo no "shaker") ou um prometedor Electric Coffe ou Chocolate (com cheirinho, digamos - de rum a whisky ou Beirão). Para quem é do chá, ele os há verdes e pretos - de hortelã/pimenta, jasmim, baunilha, canela... E não saia sem provar o sumo natural de morango com seus sublinhados a hortelã.
(Maio 2009)
- Nome
- Fábulas
- Local
- Lisboa, Lisboa, Calçada Nova de São Francisco, 14 (entrada também pela Rua Garrett, 19)
- Telefone
- 216018472
- Horarios
- Domingo e Segunda-feira das 12:00 às 23:00
Sexta e Sábado das 12:00 às 01:00
- Website
- http://www.fabulas.pt