Fugas - restaurantes e bares

  • Fábio Teixeira/Arquivo
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É uma (nova) casa portuguesa, com certeza

Por Luís J. Santos ,

Um clássico instantâneo. Um oásis de calma que faz honra na arte de bem receber. O Espaço Wanli, em Lisboa, marcado intrinsecamente pelas personalidades (e pertences) dos seus anfitriões, é um admirável mundo de mil e um itens e memórias, muitos deles impressionantes documentos históricos. Bem-vindos ao novo bar-museu de Santos-o-velho.

Quem entrar pelo Wanli adentro sem informação prévia, pode até pensar que acaba de descobrir um café ou bar clássico alfacinha, de longa história e com pergaminhos. É certo que o salão é quase museológico, uma miríade de detalhes, repleto de mil e um itens, onde se pressente uma ancestral arte do saber receber. É certo que se repara nos cuidados globais de disposição e mobiliário, que fraterniza diferentes épocas. Mas a verdade é que este clássico instantâneo só abriu portas em 2010. O ambiente, entre a nostalgia e a sapiência, tem tudo a ver com muita experiência de vida. Mas não do Wanli. Antes dos seus donos, João Barbosa e Carlos Fagulha. Aliás, este último, nosso guia pelo projecto, foi antiquário durante muitos anos e, conta-nos, "uns 70 por cento do que se vê" veio mesmo de sua casa, o que, diga-se, é uma colecção que merece admiração.

E o que é o Wanli? Bem, além de um prato da Dinastia Ming (que serve de baptismo ao espaço e que decora uma das paredes), "não é café...nem bar... nem restaurante... ". É nesta definição na indefinição que se posiciona esta nova jóia da coroa da zona de Santos. É isto tudo e mais o que o freguês quiser. É uma verdadeira sala de bem-estar, desenvolvida num edifício pré-pombalino, num espaço que noutros tempos albergou as cavalariças do Palácio Távora. Mantêm-se grande parte das estruturas de origem, incluindo colunas e o chão de pedra (e até um pequeno e encantador poço de nascente) e o Wanli adaptou-se na perfeição ao salão, arquitectado, há alguns anos, para uma galeria de arte (que se ficou pelo projecto). Mas, sejamos justos, em forma de café ou bar ou sala de estar, o Wanli é, em muitos sentidos, uma galeria de arte.

"O que queremos é, acima de tudo, que as pessoas se sintam em casa", resume Carlos Fagulha, que, quase nos sessentas ("mas com espírito de 19", remata logo), já percorreu meio mundo, engenharias e antiguidades, especializou-se em militária portuguesa e alemã ou porcelanas da Companhia das Índias, envolveu-se nas pratas e restauro, passou por experiências na restauração (como o restaurante da Trindade) e até por bares (como o Capela) e, entre a crise e voltas por cima, entre amizades e conversas, acabou por decidir, com o amigo João Barbosa, dedicar-se de corpo e alma a abrir o Wanli, "uma extensão" da sua própria casa, explica.

Passadas as grandes portas de vidro, Carlos, em postura de perfeito anfitrião, apronta-se a guiar-nos por este seu admirável mundo feito de memórias (e documentos de verdadeira relevância museológica) que podem apenas suscitar um sorriso a muitos, casos de brinquedos dos anos 50, ou até dúvidas e controvérsias a outros, casos de um símbolo da Mocidade Portuguesa, a retratos vários do rei Dom Carlos e bandeiras da Monarquia à capa de um Diário da Manhã que reporta o funeral de Salazar. Mas Carlos Fagulha, que há-de dar provas de conversador nato, arruma-nos as dúvidas com tiradas certeiras: "O que sou é humanista", "monárquico numas coisas", "republicano noutras". Ou até: "No trato com as pessoas, chego a ser comunista". É deste resultado de humanidades, resumido pelo próprio, que se faz a casa, afiança, que o que se vê tem substância e ultrapassa quaisquer modismos de artes decorativas vintage.

A qualquer cliente, aconselha-se uma deambulação obrigatória pelo "museu" que ocupa móveis e paredes. A começar pelo balcão da recepção, vindo de uma antiga mercearia, a mesas, cadeiras e móveis que outrora auxiliaram escritórios e retrosarias, a sofás dos anos 50 ou cadeirões de décadas à escolha. São desenhos originais e posters seculares, bolsas, telefonias dos tempos das guerras, travessas, pratos, estatuetas e porcelanas, revistas e bonecos de saudosa sátira (Cara Alegre, Os Ridículos, Bordalo), livros de gente da "noite negra do fascismo" e documentos que os funcionários públicos eram obrigados a assinar por essas alturas comprometendo-se com o regime, bandeiras da monarquia e bandeiras da república, azulejos de Pomar, Mickeys dos anos 50 e capacetes bélicos, caixas e caixinhas misteriosas, fotos e sestércios...

A alguns, virão à memória casas históricas como o Pavilhão Chinês, Paródia ou Procópio..., bares-caixinha mágica de mesclas assombrosas e dedicados à tradicional tertúlia. E é natural. Carlos Fagulha quer que a sua sala de estar "humana" seja uma redescoberta contínua, que dê azo a conversas e debates, que seja esse reino da tertúlia. Para ajudar ao ambiente, não lhe faltam projectos, entre a realização, de facto, de tertúlias, mas também de concertos íntimos, exposições de arte contemporânea ou projecção de filmes. Ou, para dar um toque ainda mais acolhedor à sala íntima que completa o seguimento do salão, com uma bela arca a servir de mesa, a instalação da lareira, a dois passos de um verdadeiro e secular poço. Feliz o cliente que assim fique, entre água e fogo. Para já, fica o acolhimento de uma ementa esmerada e selectiva, jogos de salão e Internet grátis, uma conversa simpática com o douto anfitrião e a banda sonora tranquila e escolhida a dedo. E a certeza de que quem procura um oásis íntimo por Lisboa dificilmente encontrará refúgio mais hospitaleiro.


Selecção Wanli
A ementa do Wanli não é extensa mas antes selectivíssima. Comecemos pelo fim: prove os bolos à fatia (assinados por Teresa Pyrrait, que segue leis sábias e receitas antigas); melhor ainda, prove o bolo de chocolate ou brigadeiro. Perfeitinhos, farão as delícias de qualquer amante do chocolate (não desfazendo as criações com laranja, noz...). Mas para uma quase refeição, passe pelo chouriço alentejano ou os enchidos tradicionais de porco preto, presunto ou queijos transmontanos (e saladas, tostas e sandes, empadas e sopas e etc.). No vinho, manda mais a histórica casa do Douro Maritávora e há selecção de Porto, Madeira ou licores e destilados. Para aquecer melhor o Inverno, siga para os chás Frères Mariage (verde, preto, vermelho).

Wanli, o prato
A casa foi baptizada em homenagem a um prato, que se encontra em exposição, do tempo do imperador chinês Wanli, da Dinastia Ming. E, coincidências geográficas, pela proximidade da vizinha Embaixada de França, antigo palácio dos Marqueses de Abrantes, que tem o tecto do salão nobre decorado, precisamente, com pratos Wanli. 

Nome
Espaço Wanli
Local
Lisboa, Santos-o-Velho, Calçada do Marquês de Abrantes, 82
Telefone
216031562
Horarios
Segunda a Sábado das 15:00 às 00:00
Website
http://www.facebook.com/pages/Espa%C3%A7o-Wanli-Sala-de-Estar/102581659806334
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