"Estou assustada. Muito feliz, mas assustada. Passaram-se cinco anos... Sou uma pessoa diferente, todas as pessoas que fazem parte da equipa são pessoas diferentes do que eram. Lisboa é uma cidade diferente. Vamos ver...". Madalena Saudade e Silva, entre um palco preparado para a festa e as luzes da Lisboa ribeirinha, sorri. Ela e a irmã, Sofia, com o "apoio inestimável" de Alcides - sábio musical que já geria o antigo espaço - e "de muita, muita gente", levaram, por fim, o seu sonho a porto seguro, depois de anos de "grande batalha". O B.Leza, casa de alma cabo-verdiana com 12 anos de culto em velho palácio e cinco de ausência, ancorou com os seus músicos e família no Cais da Ribeira, num apetrechado armazém com o Tejo nos olhos. Graças às paredes de vidro, dança-se pelas noites B.Leza com o mais perfeito dos cenários, iluminado a rio, margem, ponte, Cristo Rei e tudo.
Não há a patine do palácio do largo Conde Barão (de seu nome Almada Carvalhais) mas, garante Madalena, há o mesmo "espírito de sempre". "Era um espaço único, até o Marquês de Pombal deve ter dançado por lá", diz. Aqui, é toda "uma história que está por ser contada". É que "não vale a pena querer voltar ao mesmo sítio onde já se foi feliz", sublinha, para explicar que nunca pretenderam "reproduzir o antigo espaço". A nova e moderna casa é completamente aberta, repartindo-se por um longo balcão de bar, um recanto vintage para relaxar e, claro, o epicentro, o salão de espectáculos e pista de dança. Aqui e ali, entre longas cortinas vermelhas, apontamentos de outros tempos, incluindo uma parede coberta a cartazes de noites memoráveis.
No palácio Almada Carvalhais, foram cerca de 12 anos de culto B.Leza. Por ali, já antes tinham passado as lendárias Noites Longas, nos anos 1980, conduzidas por Zé da Guiné, ou O Baile, também de estirpe cabo-verdiana, que chegou a dançar com Cesária Évora. E é este Baile que se liga por laços de sangue ao B.Leza: foi dinamizado pelo pai de Madalena e Sofia. Quando este morreu, as irmãs decidiram honrar o legado. O clube (que partilha o nome com o célebre compositor de Cabo Verde) chegaria em 1995 e despedir-se-ia da "sua" casa a contragosto - o palácio foi fechado e vendido - em 2007, depois de momentos marcantes assinados por centenas de nomes, incluindo Tito Paris (que ali gravou um álbum ao vivo), Celina Pereira, Maria Alice ou Dany Silva. Outros grandes momentos do clube ficariam mesmo registados num disco de evocação global, Ao Vivo No B.Leza.
Depois foram cinco anos de "luta e persistência", abaixo-assinados, reuniões com a autarquia. Para manter a chama, tornou-se itinerante, navegando em sessões pontuais por palcos lisboetas. "Temos uma história e esse é o ponto de partida", vai-nos dizendo Madalena, enquanto aguarda que a constelação de estrelas da lusofonia volte ao B.Leza.
Agora, neste armazém tornado a "11.ª ilha de Cabo Verde" (como lhe chamou o presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, na inauguração do espaço apoiado pela autarquia) pode contar-se, de 4.ª a domingo, com música ao vivo (de África ao Brasil e a Portugal, com saltos a todo o mundo), dança e até poesia. Ainda não há comidas, mas deverão começar a servi-las lá mais para o Verão. Acima de tudo, a família B.Leza quer que a casa passe a ser encarada como "um espaço de lusofonia, um espaço de cultura", onde se vive "um espírito de festa, de partilha, de mistura, de aprendizagem", resume Madalena.
A julgar pela primeira noite, dia 2, essa comunhão parece assegurada. À "ilha" afluiu um mar de gente de todas as proveniências, de saudades e morabeza, de mornas e coladeras e funanás, de abraços e beijos. Assim que os primeiros pares tomaram a pista, soube-se logo que era a primeira dança do resto de uma vida em B.Leza.
- Nome
- B.Leza
- Local
- Lisboa, Lisboa, R. Cintura do Porto de Lisboa, Armazém B (Cais do Sodré)
- Telefone
- 0
- Horarios
- Quarta a Domingo das 22:30 às 04:00
- Website
- https://sites.google.com/site/blezaacr/