Se perguntarmos se um restaurante pode ter êxito sem cozinha, a resposta só pode ser uma: não, obviamente! Mas como entre a teoria e a prática se impõe sempre o complexo mundo da realidade, haverá que admitir algumas excepções e constatar que a restauração não tem que acabar necessariamente à volta dos fogões. Vem este exercício retórico a propósito do feliz exemplo da Adega Gavina, uma casa simpática e asseada na zona ribeirinha de Vila do Conde e que parece ter conquistado os favores da clientela.
O segredo está no peixe fresco e no calor que permanentemente sai do assador a carvão, colocado em plena rua, frente ao rio. Outra das razões, acrescentamos nós, decorrerá certamente da ausência de concorrência específica. E mal se percebe que numa zona de praias concorridas como é o caso de Vila do Conde e Póvoa de Varzim seja assim tão rara a oferta de peixes grelhados, comprovadamente um dos petiscos mais apreciados e procurados pelos portugueses. Uma ausência que é tanto mais incompreensível já que estamos a falar da envolvente de um dos grandes portos de pesca nacionais e daquela que é provavelmente a maior comunidade piscatória, as Caxinas.
É, pois, caso para que os profissionais da zona atentem no êxito deste Gavina, onde é sempre muito difícil encontrar mesa e a clientela aguarda pacientemente por uma vaga para se sentar. E não há qualquer outro segredo que não passe pelo "peixe fresco grelhado no carvão", tal como se anuncia nos painéis transparentes que protegem as mesas colocadas no espaço conquistado ao passeio.
A oferta é, de facto, limitada aos peixes grelhados e mesmo assim reduzida a uma meia dúzia de espécimes saídos da faina matinal. Isso sim, de frescura imaculada, bem amanhados e sem qualquer outro tratamento que não seja o tempero com sal e o calor do carvão. Em dia de terça-feira, ao almoço, a Fugas encontrou uma ementa com sardinhas, carapaus, robalo, rodovalho, lulas, salmão e bacalhau à posta. Como alternativa cárnica, singelos bifes, costeleta de novilho, fêveras ou barriga de porco. Menção também para um arroz de frango de cabidela, mas apenas por encomenda prévia. Da cozinha, como se vê, apenas as batatas e o feijão verde cozidos que fazem companhia aos grelhados. Em ambos os casos, diga-se, de muito boa qualidade e a evidenciar a suas origens rurais.
Os pescados estão à vista na vitrina que suporta o balcão de serviço, tendo-nos tentado as lulas de tamanho médio e um robalo de bom porte. As primeiras, a 15 euros a dose, foram grelhadas no ponto certo de calor, preservando o sabor e humidade próprios. Cortadas em pequenos pedaços, chegaram à mesa sem qualquer complemento ou adorno.
Fresco e viçoso, o robalo (40 euros) acabou por denotar algum excesso de exposição na grelha, que o tornou um pouco seco nas partes mais finas. Excelentes as mais protegidas, da cabeça e junto à espinha, com sucos, gelatinas e reminiscências a mar e a evidenciar a suprema qualidade do espécime. É o velho problema com a mania de assar os peixes espalmados, que na maioria dos casos os torna secos e estorricados, assim se perdendo a essência e os sabores do peixe fresco.
Tentados pelo que víamos sair da grelha, provaram-se ainda umas sardinhas. Frescas, gordurosas e a soltar o "capote" como se recomenda. Igualmente de aspecto tentador, as postas de bacalhau assado que apreciámos apenas com o olhar. Lombos de boa envergadura a deixar-se desfazer em lascas e de tonalidades douradas a sugerir boa cura. Acompanhavam com batata, ovo cozido e rodelas de cebola crua, e a denotar competência.
Competente também a salada de pimentos, tomate e alface que acompanhou toda a refeição, tal como o branco Monte da Peceguina 2011, da Herdade da Malhadinha Nova. Equilibrado de sabores e com boa frescura cítrica, que especialmente o recomendam para as saladas e peixes grelhados.
Tal como a ementa, também a oferta de vinhos é de tendência sumária. Brancos do Douro e Alentejo e nem sempre os mais ajustados aos peixes grelhados. Estranha a ausência de verdes, com apenas duas propostas de vinhos básicos e mesmo pouco recomendáveis. A lista sugere também um "Alvarinho" sem indicação de marca ou produtor. Mesmo assim, disseram não haver quando quisemos saber a origem. Mesmo ao nível do disparate são as propostas para os tintos. Não só porque não há pratos que lhes façam companhia, mas sobretudo porque inclui coisas como Pêra Manca (140€), Barca Velha (200€) ou Quinta da Leda (35€). Para quê?
Além dos peixes frescos e do bom desempenho do assador, o evidente êxito da Gavina tem que se associar também à sua localização. Casa a fazer esquina, voltada ao rio, na renovada zona da Alfândega, mesmo em frente à marina e ao arranjo urbanístico onde se inclui uma réplica das históricas caravelas. Além da sala, que pode acolher um máximo de 30 pessoas, há uma esplanada conquistada ao passeio com idêntica capacidade.
Ao espaço aprazível associa-se também a simpatia e o esforço do serviço familiar, que assim compensa alguns momentos de atrapalhação. É por tudo isto que se quiser experimentar a Adega Gavina o melhor é mesmo optar pela reserva antecipada. Caso contrário arrisca uma longa espera, mas uma volta pela zona também pode compensar.
- Nome
- Adega Gavina
- Local
- Vila do Conde, Vila do Conde, Cais das Lavandeiras, 56
- Telefone
- 917834517
- Horarios
- Terça a Sábado das 12:00 às 15:00 e das 19:00 às 22:30
Domingo das 12:00 às 15:00
- Cozinha
- Peixe
- Observações
- Aceita cartões.