Já sabemos como numa casa portuguesa ficam bem pão e vinho sobre a mesa e na Taberna do Largo é assim que somos recebidos: a mesa que se encaixa num dos portais da fachada exibe, sobre uma toalha, uma garrafa de vinho e uma cesta de pão. Um convite a entrar - não é preciso bater à porta -, a sentar-se à mesa e petiscar por lá, sempre com o copo cheio. Sabendo que por essa mesa pode passar o país inteiro, basta querermos; afinal, esse é um dos objectivos deste espaço que abriu no final de Fevereiro num cantinho do Largo de São Domingos, já a espreitar a Rua das Flores: ser uma montra do melhor que se faz em Portugal, com especial destaque para "vinhos, queijos e enchidos". Para portugueses e turistas descobrirem.
Nas portadas bordeaux não é invulgar descobrir a oferta em pequenos papéis colados - com fita-cola mesmo, a lembrar que havia vida antes dos post it: pão, queijo, vinho... escrito em caligrafia pueril. É território das antigas mercearias, das tabernas, e não fica mal a esta loja-bar-petisqueira à qual se quis dar um ar de taberna antiga até se perceber que ia ser difícil.
Quem nos conta são as proprietárias, Joana Conde, Teresa Domingues e Sofia Príncipe, três amigas que trabalhavam na área da formação, viram as coisas a andar mal e decidiram fazer uma fuga para a frente. A ideia nasceu há dois anos e o conceito foi evoluindo - "ainda está a evoluir", sublinha Sofia. Certo, e conseguido, era que se queriam instalar na Baixa, "mas não a dos bares", sublinham. "Procurámos espaço dos Clérigos para baixo."
O Largo de São Domingos e a rua das Flores estão virados do avesso, em obras de requalificação - "já sabíamos que iam acontecer" -, por isso escapamos ao pó no oásis da Taberna do Largo, onde somos recebidos por António Variações e a sua "Amália na voz". Há-de acompanhar-nos em toda a nossa estadia e faz parte do conceito de ter só música portuguesa, independentemente do género. "Até agora temos cumprido...", diz Sofia. Música portuguesa a soar e um mapa do país logo na entrada. Não é feitio, é "pedagógico", assume Teresa: se a Taberna do Largo quer ser uma espécie de "Portugal dos pequeninos" dos produtos tradicionais, o mapa ajuda as pessoas a saberem de onde estes vêm e a contextualizá-los culturalmente.
É quase um princípio programático e não é o único. Afinal, nesta a volta a Portugal (continental e insular) há "regras" incontornáveis e uma das mais importantes é ter bons produtos de pequenos produtores - "contornando o mercado instalado e indo directamente ao produtor", sublinha Teresa. Para tal, Joana, Teresa e Sofia fizeram um périplo pelo país, para verificar as condições de produção; por tal, na Taberna do Largo há produtos que não estão acessíveis em mais nenhum sítio do Porto.
Há presunto da Beira Baixa e queijo de Azeitão do seu produtor mais antigo, o queijo de Nisa há-de chegar (estão em lista de espera), há os refrigerantes-bandeira da Madeira e dos Açores (Brisa e Kima), pão de Mirandela, doces tradicionais de várias proveniências (e em regime surpresa: os mais constantes são os ovos moles; hoje vieram clarinhas de Fão, por exemplo) e vinhos de todas as regiões, num total de 45 referências (incluindo espumantes) - (quase) tudo de pequenos produtores, com enólogos (ainda) pouco conhecidos.
Os petiscos que se servem alinham pela mesma filosofia e não se surpreenda se entre as alheiras (de porco preto ou não), farinheiras, chouriços assados, tábuas de queijos e enchidos (muito populares, dizem-nos) encontrar, por exemplo, muxama em vinagrete e frutos secos (atum fumado - provamos e avisamos: é intenso), estopeta de atum à algarvia"(atum em sal) e maranhos (bucho de cabra recheado com a carne, presunto arroz e temperado com hortelã - prato típico de festividades na Beira Baixa) - petiscos mais regionais. E muito procurados.
Ao fim-de-semana há quem faça reservas para aqui petiscar, sobretudo à noite, o que muito surpreendeu as proprietárias que contavam que a Taberna do Largo fosse mais um local de copos - de vinho claro. Tanto que todas as referências são servidas aqui, alguns a copo, outros em garrafa e se não há vinho da casa há "vinhos do dia": três selecções de branco, tinto e rosé, para diferentes bolsas - a 1,80€, 3,50€ e 5,50€. "Vamos rodando, fazendo a nossa gestão para dar a conhecer o maior número possível", explica Joana. A única certeza é de que se está a tomar um vinho pouco óbvio, sem grande representatividade no mercado.
Se não puderam fazer no espaço a recriação de uma taberna antiga, não deixaram de imprimir ao espaço um certo tradicionalismo que se vê logo na entrada com a "estante" a imitar as antigas mercearias cheias de produtos para venda, incluindo em pequenas malas e cestas, e na exposição de garrafas, deitadas e em pé. A madeira e a lousa são os elementos mais constantes, há trabalhos tradicionais nas paredes (como um careto da Lagoa de Mira) e candeeiros feitos com garrafas e garrafões, à laia de lustre na entrada e na sala das traseiras e "individuais" sobre o balcão, onde se expõe alguns produtos.
Bem no fundo uma das singularidades do espaço e factor decisivo para aqui se ter instalado a taberna do largo: um pequeno pátio em saguão com azulejos azuis e brancos dos séculos XVII e XVIII, de onde sai um túnel que, dizem as lendas, chega até Arca d"Agua, e onde no Verão haverá mesas e cadeiras. E, espera-se, muita gente.
A escolha da localização não foi alheia a um piscar de olho ao turismo - mas os portuenses também já descobriram a Taberna do Largo, onde podem descobrir um pouco mais do país. À mesa.
- Nome
- Taberna do Largo
- Local
- Porto, São Nicolau, Largo de S. Domingos, 69
- Telefone
- 222082154
- Horarios
- Domingo, Terça-feira, Quarta-feira, Quinta-feira, Sexta-feira e Sábado das 11:00 às 00:00
- Website
- https://www.facebook.com/tabernadolargo
