Fugas - restaurantes e bares

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Comer a Beira Baixa no centro de Lisboa

Por Rui Pedro Lopes ,

Chama-se Pioneiro e é uma marca de azeite. Mas agora é também o nome de um espaço onde é possível adquirir e provar produtos originários da Beira Baixa que chegam à capital portuguesa pela mão de uma empresária de Proença-a-Nova.

Os antigos gregos tinham uma predilecção pela dialéctica. A chamada arte da argumentação também agrada aos portugueses, mas a discussão ganha outro sentido se for feita à mesa, com um petisco pela frente. Recorrendo à dialéctica e a um pequeno repasto de presunto, queijo e vinho tinto, assistimos à esgrima de argumentos que se desenrola numa mesa do número nove do Poço do Borratém, em Lisboa. “Onde é que se recebe melhor?”, perguntou um dos convivas. “Na Beira Baixa, claro está!”, respondeu outro. Um outro preferiu ser diplomático: “Portugal recebe bem em todo o lado.”

Não tomámos partido, porque nestas coisas é sempre mais avisado o silêncio aquiescente.

A conversa que presenciámos poderia decorrer numa qualquer adega beirã mas, neste caso, estávamos bem no centro da capital portuguesa, a poucos metros do Rossio. O ambiente que se respira neste local, porém, é o da Beira Baixa, apesar de estarmos a mais de duas centenas de quilómetros da região. Podemos não ter o ar puro das suas serranias mas o resto está aqui. O mel, o queijo, o presunto, o azeite, os enchidos, a broa de milho e o vinho são os grandes embaixadores daquela zona do país — e não falta nenhum nos escaparates do Pioneiro, um espaço de degustação e venda de produtos da Beira Baixa, a maioria dos quais originários do concelho de Proença-a-Nova.

O interior deste local apresenta um aspecto amplo e cuidado, com três salas, resultantes da reconversão de um antigo armazém. A escolha do nome Pioneiro não foi inocente. “Pioneiro é uma marca de azeite e mel que dá nome também a este espaço de degustação de produtos locais no Poço do Borratém”, explicou Maria da Conceição Catarino, proprietária da marca e responsável por este projecto.

Aberto diariamente, das 13h às 22h, o Pioneiro “reúne um conjunto de produtos com características naturais, sem conservantes nem aromas artificiais”. “A carta coloca à disposição dos clientes tanto sabores tradicionais como combinações inovadoras, sendo a selecção cuidada de ingredientes o denominador comum à gama de produtos disponíveis”, sublinha Maria da Conceição Catarino.

Experimentámos algumas destas combinações e ficámos rendidos às tapas com presunto do chef Leonel Pereira, que têm uma base de pão torrado, barrada com pasta de azeitona preta e verde (Probeira), rolinhos de presunto (Lourenço, 12 meses de cura), doce de figo (Sabores da Gardunha) e apontamentos de rúcula dourada com um fio de azeite Pioneiro. Naquele pequeno pedaço encontra-se todo o sabor e saber do que é a Beira Baixa ou, como confidenciou a responsável do espaço, “um misto de emoções e experimentações apuradas ao longo de séculos”.

O Pioneiro nasceu com um firme propósito: “Porque somos produtores de azeite surgiu a necessidade de criar uma marca e colocá-la no mercado; a melhor forma de o fazer seria através da abertura de um espaço de venda aqui em Lisboa e resolvemos apresentar o nosso produto no mercado com este conceito de prova e degustação, combinado com outros produtos da nossa região”, explicou Maria da Conceição Catarino. E acrescentou: “Acima de tudo, queríamos pôr à disposição de quem nos visita o que de melhor se faz na nossa região e um pouco por todo o país.”

A opção pelo Poço do Borratém deveu-se à sua “centralidade” na cidade de Lisboa e também por “o proprietário do imóvel, onde hoje está instalado o Pioneiro”, lhes ter lançado um desafio para ali abrirem o espaço. “A esse desafio não é alheio o facto de também ele ser oriundo da nossa região.”

Porque o projecto necessitava de um cunho de originalidade e autenticidade, os seus responsáveis decidiram associar-se ao chef Leonel Pereira. A união permitiu aliar a “simplicidade da tradição, à mesa do Pioneiro, com criações da sua autoria, que resultaram em sabores originais e invulgares”, explica Maria da Conceição Catarino. “Exemplos como o enchido de veado ou os toutiços de sardinha e atum picante comprovam que a diversidade, desde que aliada à qualidade que é imagem de marca do espaço, permite a todos os paladares e gostos encontrar algo à sua medida.”

Enquanto a conversa com Maria da Conceição Catarino seguia outras coordenadas, os nossos colegas comensais desviaram o rumo da discussão para um assunto mais prosaico — a origem do nome Poço do Borratém. Um dos mais entendidos nestas coisas da olisipografia satisfez a curiosidade: o Poço do Borratém, que ainda hoje existe (escondido no interior de um dos edifícios desta artéria) teve origem hebraica e terá sido instalado por alturas da criação da Mouraria, ali bem perto. Até Gil Vicente se refere a este poço numa das suas obras. Ficámos também a saber que por aqui nasceu João das Regras, o insigne defensor do Mestre de Avis nas Cortes de Coimbra de 1385.

Aliás, se levantarmos o olhar numa das salas do Pioneiro, é possível admirar o tecto original do século XVIII construído em abóbada com “tijolo burro”. Um toque de história num local onde as paredes estão ornamentadas de estantes recheadas com o que de melhor tem para oferecer aquela região beirã.

Quanto aos convivas, a conversa lá seguiu em direcção a outras latitudes porque, neste local, a comida e a bebida são os companheiros de excelência daquilo a que podemos chamar de oratória gastronómica, para invocar novamente os nossos amigos gregos.

Nome
Pioneiro
Local
Lisboa, Santa Justa, Rua do Poço do Borratém
Telefone
965262235
Horarios
Todos os dias das 13:00 às 22:00
Website
http://www.pioneiro.pt/
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