Fugas - restaurantes e bares

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A Conceição é uma lady e uma louca

Por Andreia Marques Pereira ,

Tem no público GLS o seu nicho o que significa que é bem-vindo quem vier por bem. E com desejo de diversão. Porque “a” Conceição é “uma casa a arder” e nem sempre em lume brando. Valham-lhe os cocktails para refrear (?) os ímpetos festivos.

“Je suis bafon” poderia ser “Je suis bas-fond” mas sendo “bafon” pode ser mais. Pode ser tudo o que “bas-fond” é (literalmente: fundo baixo, baixio; e figurativamente: ralé, escória) e pode ser o que é bafon no Brasil, fofoca (ou seja, mexerico), baixaria e por aí fora, para tudo junto e misturado se transformar numa festa que de algum modo condensa uma certa maneira de ser do Conceição 35.

É uma festa “de libertinagem, engate e luxúria”, diz Miguel Guimarães, o proprietário. Tudo com o devido decoro, claro está. Porque “a Conceição”, como Miguel chama ao bar, até pode ser “uma casa a arder”, mas também arde em lume brando. Depende do momento do dia. Não é um caso de esquizofrenia, é um caso de vocações múltiplas. Parafraseando o cancioneiro nacional, a Conceição 35 é uma lady e uma louca.

Se entramos ao final da tarde, por exemplo, é uma senhora aprumada mas não demasiado. A irreverência faz parte do seu ADN e nem o sol que espreita pelas janelas que ladeiam a entrada a oblitera. Não importa o sofá orelhudo que ocupa a parede da primeira sala, com xadrez castanho, amarelo, azul, o balcão de madeira escura e aspecto venerável, as prateleiras que alinham irrepreensivelmente garrafas por detrás, a madeira que forra o chão exibindo a patine do tempo (ilusão: é novo, mas com tratamento “especial”), emprestando uma atmosfera serena, que se prolonga para a sala das traseiras, iluminada por luz natural que atravessa duas clarabóias.

Porque este classicismo, chamemos-lhe assim, que tem algo de pub chic, convive (harmoniosamente, devemos dizê-lo) com a parede em reboco branco (“pedi para me fazerem a pior parede do mundo”), com a máquina de venda de azeite com ferrugem q.b., com os candeeiros quais holofotes que acompanham o balcão, com o inusitado da placa amarela retro-iluminada de “Tintoreria” que rompe com qualquer cânone possível para o bar — e que poderia até ter dado o nome ao bar, não fosse Miguel o ter “encontrado” quando este já estava decidido, “à moda de Nova Iorque, L.A., Londres, para não dar lugar a dúvidas”, ou seja, o já habitual nome da rua com número da porta.

Miguel Guimarães apresenta o Conceição 35, nascido há pouco mais de um mês, como um “bar industrial vintage”. Nós até achamos que o vintage predomina sobre o industrial que surge bastante integrado no todo, mas Miguel sabe do que fala. Foi dele a concepção do espaço, que conheceu bastante despojado, com chão de cimento e buracos, depois de uma busca cheia de falsos encontros que durou dois anos e se concretizou numa semana cheia de insónias. E Miguel sabia bem o que queria, pois o projecto do seu próprio bar rondou-o durante vários anos, depois de um percurso que o levou a iniciar-se no mundo da noite aos 16 anos, a fazer parte da equipa que deu o pontapé de saída no Lusitano, onde trabalhou vários anos até à interrupção para acabar os estudos — começou em arquitectura e acabou em design industrial, com passagem por Barcelona —, seguida de uma experiência como tatuador.

Não é à toa que falamos do seu currículo, porque ele reflecte-se neste Conceição. Desde logo na decoração, um misto de achados e de originais por ele concebidos: de Barcelona vieram as cadeiras, ele desenhou o sofá de orelhas da entrada, os candeeiros do balcão chegaram de Berlim, o candeeiro com luzes coloridas das traseiras era um secador de cabeleireiro encontrado na Rua do Almada, o balcão e o móvel interior (comprido, duas filas de gavetas e duas prateleiras) fizeram parte de uma mercearia do século XIX em Ovar. E poderíamos continuar, porque Miguel sabe exactamente a proveniência e o porquê da escolha de todos os objectos. E a sua experiência também se revela na forma como quer posicionar o Conceição 35 no mercado e na rua que “em breve será o centro do Porto”. Da sua passagem pelo Lusitano herdou o nicho de público onde se quer inserir — o Conceição 35 é um bar “hetero friendly”, que é como quem diz GLS, que é como quem diz “para todos”; o horário de abertura (das 16h às 2h/4h) impele-o a ter as tais duas caras para fazer frente aos vizinhos.

É ao fim-de-semana que “a” Conceição solta o cabelo e se mostra mais louca. Há DJ residentes e a sala das traseiras é limpa de mobiliário a partir das 21h. Saem, portanto, o conjunto de sofás e mesa Art Déco de xadrez indisciplinado em vários tons de preto e branco, os sofás castanhos com nervura branca que fazem outro recanto (com mesa baixa e candelabro), as mesas e cadeiras do centro; mantêm-se a cabina do DJ, um pequeno bar secundário semicircular, as mesas altas, o espelho de bronze envelhecido que forra uma das paredes, as bolas de espelhos — e temos a pista de dança tutelada por um papel de parede vintage de edição limitada, vermelho com flores. Quando há festas especiais, as festas Conceição, a decoração é subvertida: para a “Je suis bafon” (primeiras sextas-feiras do mês) há o patrocínio da sex shop Shhh, que veste os funcionários; na “Apolo” (últimas sextas-feiras do mês) é o imaginário greco-romano que se impõe.

Se nestas festas a música é também ela especial, nos outros dias é mais previsível, com o pop comercial a começar a noite e o house a fechá-la; pelas tardes, passeia-se pelo chill-out, bossa lounge e até o jazz. Nas bebidas, o passeio também pode ser demorado (sublinhe-se a venda a copo de todos os vinhos, espumantes e champanhes), mas são os cocktails que se distinguem, divididos pelas bebidas que lhe servem de base — um mês de ensaios com Pedro Sobrado culminou com a selecção de quatro de cada: rum, whisky, gin e vodka, que inclui o assinatura da casa, Conceição 35, pois claro, com Absolut, maçã natural, sumo de limão, clara de ovo, syrup, angostura e hortelã. Quem quiser petiscar, tem uma carta breve, pelo chef Pedro Moreno, que inclui sanduíches, tapas e sobremesas — em breve chegarão tábuas de queijo e de carne. Parece que “a” Conceição, além de lady e de louca, também é uma mixologista gourmet. No fundo, “a” Conceição é como todas as raparigas, just wanna have fun.

Nome
Conceição 35
Local
Porto, Vitória, Rua da Conceição, 35
Telefone
220938034
Horarios
Domingo, Terça-feira, Quarta-feira e Quinta-feira das 16:00 às 02:00
Sexta-feira e Sábado das 16:00 às 04:00
Website
https://www.facebook.com/pages/Conceição35/325564644293337
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