Fugas - restaurantes e bares

  • Paulo Pimenta
  • Fernando Sá, cozinheiro
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Não há nada como o bacalhau da Julinha

Por José Augusto Moreira ,

Para quem gosta do mais popular prato português e tenha a ideia de que já provou tudo, desengane-se... porque falta a Julinha. A diferença está na qualidade do produto e no apuro técnico com que é confeccionado. Sem truques, comprovou o nosso crítico.

A história é comum à grande parte dos restaurantes do Entre-Douro-e-Minho, tal como acontece, de resto, um pouco por todo o país. Tendo começado como casa de vinhos e petiscos, a Julinha cedo ganhou fama pelas rotundas postas de bacalhau fritas com cebola que atraíam a clientela. Rapidamente convertida em restaurante, a casa constituiu-se como uma espécie de destino de romagem ao bacalhau, sobretudo nos conturbados anos do pós-25 de Abril, quando a escassez o converteu em produto de luxo.

Vai daí, a casa como que se aburguesou e passou a ser essencialmente frequentada por empresários e famílias de boa solvência, estatuto que, mais coisa menos coisa, se mantém nos dias de hoje.

O espaço é amplo e confortável, mesas devidamente aparelhadas e com amplitude, para que o repasto não corra o risco de intercomunicar com a vizinhança e vice-versa. Há também uma ampla sala de recepção e bar à entrada e abundam os quadros com fotografias que ilustram a história da casa, os seus protagonistas e as comezainas de outros tempos.

A sala, de tectos altos e madeira a forrar os telhados, ao estilo de pavilhão rural, recebe luz natural da parede de fundo envidraçada e pode acolher à vontade mais de uma centena de comensais. A amplitude é quebrada por umas estantes que dividem o salão em dois espaços distintos, e cujo recheio acaba por constituir uma espécie de demonstração daquilo que dali se pode esperar.

Vêem-se garrafas com vinhos de antanho, a mostrar tradições de consumo e outros tempos, mas há também uma colecção de águas gourmet das mais diversas origens, a mostrar que os conceitos de requinte e modernidade também por ali moram.

Ora, é precisamente dessa conjugação que se alimenta a cozinha da casa. Mantém os pratos e cozinhados de sempre - e que são a sua essência - mas confeccionados segundo os cânones da cozinha moderna, mas também produtos e preparados de cunho mais vanguardista. Mas o bacalhau continua a ser rei.

Detenhamo-nos, então, sobre o Bacalhau à Julinha, cuja meia dose (18 euros) é de molde a dar que fazer a dois ou três pretendentes. A meia posta, da altura de uma mão e servida em travessa, chega à mesa numa cama de batatinha frita às rodelas e escondida por ampla cobertura de cebola translúcida.

Para quem gosta de bacalhau e tenha a ideia de que já provou tudo, desengane-se... porque falta a Julinha. Desde logo pelos aromas a "carne de mar" que se soltam das entranhas da posta. Lascas consistentes e saborosas, com as partes mais baixas e agarradas às espinhas a desafiarem-nos a comer à mão para que nada se perca dos gulosos sucos e gelatinas. Tal como os grandes mariscos.

É claro que tal só é possível com uma fritura irrepreensível, fruto da técnica e conhecimento adequado. A posta frita envolvida em azeite, a baixa temperatura e apenas o tempo suficiente para a cozedura interna e sem deixar a mais leve sensação (ou aroma) do queimado da fritura em excesso. O mesmo em relação à cebola.

Parece fácil, mas exige técnica e conhecimento, que é o que demonstra Fernando Sá, o responsável pela cozinha da casa e descendente dos fundadores. O resto está no produto, neste caso, o bacalhau Jumbo oriundo da Ilhas Faroe, um bicho raro, que atinge os 10/15 quilos e que "é mais carne que peixe", como diz o cozinheiro.

Mas nem só deste espécime vive o restaurante. A lista é ampla e diversificada, oferecendo a generalidade dos pratos mais emblemáticos da cozinha regional. Os sabores são os de sempre, valorizados pelo apuro técnico e criteriosa escolha dos produtos. Isso mesmo pudemos igualmente comprovar com a deliciosa posta de vitela assada (16 euros por meia dose). Nacos do nispo envoltos em gordura que se deixavam esfiar e quase se dissolvem na boca. Chegam à mesa na assadeira que vai ao forno, devidamente acompanhados por gomos de batata com igual tratamento.

A par da ementa tradicional, há também um conjunto de apelativos pratos de inspiração (e produto) da Galiza, como é o caso das "carrilheiras" de vitela assadas em redução balsâmica, o entrecôte com degustação de mostardas ou a costela maturada de boi galego. O mesmo se diga em relação à ampla lista de entradas, que incluem coisas como vieiras com manga e mi-cuit ou um revuelto de grelos com gambas.

Provámos os pimentos de piquillo recheados (cebola confitada e alheira) e queijo gratinado, umas lâminas de presunto, igualmente galego e de textura similar ao nosso bízaro, e portuguesíssimos bolinhos de bacalhau. Tudo muito correcto e saboroso e a quatro euros a dose.

A tendência galega, quisemos saber depois, decorre do facto de Fernando Sá, que, ao que parece, é quem gere actualmente o negócio, ter feito a formação na Escola de Hotelaria e Turismo da Galiza, em Santiago de Compostela, onde se abastece e mantém abundantes contactos no meio gastronómico. Segundo contou, chegou a ter um negócio na cosmopolita praia de Sanxenxo, que obteve grande êxito mas funcionou apenas durante um ano - de Novembro de 2008 e Novembro de 2009 - por desavenças com o sócio local. Chamava-se D. Bacalhau, e além dos pratos do dito os espanhóis adoravam também os arrozes. "Pediam-me arroz branco para entrada e ainda hoje tenho clientes que me ligam para lá ir cozinhar uma arrozada", conta o chef, com evidente orgulho.

Para além do aprumo culinário e da qualidade dos produtos, no Julinha há também bons vinhos - sobretudo do Douro e Alentejo mas nenhum do Dão -, se bem que nem todos se encontrem na lista. O serviço é solícito, cooperante e prazenteiro, a condizer com o estilo de acolhimento familiar que a casa procura imprimir.

Nome
Restaurante Julinha
Local
Trofa, Santiago (Bougado), Rua Dr. Avelino Padrão, 1771
Telefone
252419486
Horarios
Segunda das 12:30 às 15:00
Terça a Domingo das 12:30 às 15:00 e das 19:00 às 22:00
Website
https://www.facebook.com/restaurantejulinha
Cozinha
Trad. Portuguesa
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