Fugas - restaurantes e bares

  • Nelson Garrido
  • Nelson Garrido

Coimbra tem mais fado no àCapella

Por Maria João Lopes ,

Por Coimbra, na antiga capela da Nossa Senhora da Vitória, do século XIV, o interior foi totalmente recuperado e as orações passaram a ser cantadas em fado. É hora de fado, de capa e batina, no àCapella.

Quando Nuno Silva entra, capa negra aos ombros, ao som da viola de Paulo Larguesa e da guitarra de Coimbra, de Francisco Dias, o momento ganha uma tal solenidade que ninguém fala. Ainda por cima estamos numa antiga capela. Por trás dos músicos, são projectadas imagens gastas, a preto e branco, de multidões a ouvir uma serenata, de estudantes de capa e batina, do casario de Coimbra. Apesar de a cidade ser conhecida pelo fado, tem apenas duas casas onde ele pode ser ouvido e apenas uma delas, esta àCapella, dedicada à famosa canção de Coimbra (a outra não exclusiva do fado, a Diligência).

Há várias razões para haver poucas casas em Coimbra, mas uma está directamente relacionada com a história e a tradição locais: a canção de Coimbra - à qual normalmente se chama fado de Coimbra - está historicamente ligada a espaços ao ar livre, não a lugares interiores. Por isso é que também as vozes de Coimbra, habituadas a espaços ao ar livre, se caracterizam por ter uma grande projecção. 

As serenatas - como a da Queima das Fitas - e, em tempos, as que se faziam à janela das raparigas, fazem mais parte deste universo do que o ambiente do fado vadio de Lisboa. Aqui, em vez do xaile, há uma capa negra, a afinação da guitarra também é diferente e os temas são a saudade, os amores, a cidade dos estudantes, e o Mondego - embora, a partir da década de 1960, a canção de Coimbra também se assuma como arma de intervenção. Apesar de oficialmente na cidade ainda não haver mulheres a cantar este fado.

É terça-feira e, por volta as 22h, o àCapella ainda está meio vazio. Algumas velas iluminam o espaço. Num vídeo, projectado numa grande tela, Cristina Branco canta Estranha Forma de Vida. Chegam dois casais, depois mais cinco pessoas... Só mais tarde é que um grupo de turistas enche a casa. São eles os mais interessados em ouvir fado e costumam representar 90 por cento do público. 

Com a casa composta, o espectáculo começa. Durante hora e meia, com intervalos, Nuno Silva e António Ataíde (na voz), Paula Larguesa (na viola), Francisco Dias (na guitarra) e Ricardo Dias (no acordeão) tocam temas de Edmundo Bettencourt, Artur Paredes, Zeca Afonso, entre muitos outros. Mais tarde, Ricardo Dias e António Ataíde ainda sobem à zona onde está o piano para tocarem e cantarem A Morte saiu à rua, de Zeca Afonso.

Nuno Silva traduz sempre para inglês os títulos das canções: "Agora vamos ouvir Coimbra, menina e moça. Now we are going to listen to Coimbra, a young girl, a young lady". Já no fim, quando o público tenta acompanhar o refrão "Coimbra tem mais encanto na hora da despedida", uma professora portuguesa traduz ao grupo de turistas que levou à casa de fados: "This song is called "Coimbra is more charming when we say goodbye to the city"". 

Jessica Mosher, que é americana mas vive em Paris, está com o namorado numa das mesas. É a primeira vez que ouvem fado, viram num guia uma referência ao estilo musical e quiseram "conhecer a tradição". No àCapella, no andar de cima, está um grupo de portugueses que conhece o fado dos tempos da faculdade e aproveitou os anos de uma amiga para reviver velhos tempos: "O àCapella é o único sítio na cidade onde se pode ouvir canção de Coimbra", diz Rita Figueiredo, advogada estagiária de 24 anos. 

António Ataíde é cantor e sócio-gerente da casa que abriu em 2003, pela mão do grupo de fados Quinteto de Coimbra. Ao longo dos anos, dois já abandonaram o projecto, três mantiveram-se. Foi depois de uma actuação no Japão, onde tiveram tanto sucesso e foram recebidos "como se fossem os Beatles", que decidiram aventurar-se e abrir o negócio. 

Encontraram, numa rua estreita e medieval de Coimbra, uma antiga capela do século XIV, com uma forte carga cénica, e fizeram obras para adaptar o espaço à função, embora mantendo a estrutura original. Onde, em tempos, foi o altar, colocaram um palco e, num patamar superior, perto do tecto, um piano. Para além de um grupo residente de músicos assegurar fado todas as noites - a não ser que esteja muito pouca gente -, também já acolheram espectáculos de teatro, lançamentos de livros, e concertos com Ana Moura, Paula Carvalho, Rão Kyao, Paulo de Carvalho, Cristina Branco, Vitorino - até os Violent Femmes já lá tocaram.


Comer e beber
O jantar custa a partir de 30€ (o consumo sem jantar é 10€). A carta de petiscos inclui o tradicional chouriço assado (7€) ou caldo verde (3€) e, de resto, sanduíches ou tostas, além de tábuas de queijos e/ou enchidos. Um jarro de vinho custa 5€ mas há um carta de vinhos recheada q.b.

Nome
à Capella
Local
Coimbra, Santa Cruz, R. Corpo de Deus/Lg. da Vitória - Capela Nossa Senhora da Victória
Telefone
239833985
Horarios
Todos os dias das 21:30 às 02:30
Website
http://www.acapella.com.pt
Preço
10€
--%>