Fugas - viagens

Luís Maio

Continuação: página 2 de 5

Montreal - A cidade reanimada

Montreal foi escolhida para cidade hospedeira da Expo, em 1962, mas as autoridades levaram um ano a discutir a sua localização. Até que se decidiram pelas ilhotas do rio Saint-Laurent, porque foi à beira de água que a cidade nasceu, mas também porque o sítio era inabitado e dispensava expropriações. As instalações criadas pelos 62 países participantes eram em princípio temporárias e foram na maior parte removidas depois dos seis meses que durou o evento. Houve, no entanto, algumas excepções, a mais notável das quais é o Pavilhão dos Estados Unidos, uma das mais espectaculares cúpulas geodésicas de Buckminster Fuller.

Empregando como módulo o tetraedro feito de tubos de aço, Fuller pôs em prática a sua filosofia de "mais com menos", criando um máximo de volume com um mínimo de estrutura. Um incêndio em 1967 destruiu a cobertura de 1900 painéis de acrílico, que não foi reposta, mas a cúpula e as plataformas interiores ficaram intactas. Acolhem desde aí exposições temáticas, a mais recente das quais é sobre a Biosfera e inclui apontamentos sobre projectos de Fuller, coerentes com o actual conceito de desenvolvimento sustentável. Outros edifícios de arquitectura aparatosa que se conservam da Expo são os pavilhões de França e do Quebeque, transformados em casino, e as esculturas futuristas de Alexander Calder (O Homem) e de Yves Trudeau (Farol do Cosmos), integradas no arranjo do parquejardim desenvolvido nas ilhas desde o evento de 67.

O terreno da Expo ocupou 400 hectares de terra insular, em boa parte ganhos ao rio graças à pedra saída de outras obras, nomeadamente de alargamento da rede de metro, lançadas na mesma altura. A ilha de Sainte Hélène duplicou de área e ao lado nasceu a ilha artificial de Notre-Dame. Nelas também se vieram a integrar La Ronde, um parque de diversões com a montanha-russa em madeira maior do mundo, e o circuito Gilles-Villeneuve, provavelmente o único circuito de Fórmula 1 onde se pode andar de patins e de bicicleta. Mais compacto e menos verde, mas não menos impressionante, é o Parque Olímpico, situado no bairro periférico de Hochelaga-Maisonneuve, na ponta oriental da cidade.

Construídos de raiz em 1976 foram um Estádio Olímpico de 50 mil lugares, um centro de natação e um velódromo. O estádio revelou-se um pesadelo recorrente, desde a greve que não permitiu usá-lo a tempo dos jogos até à queda do tecto retráctil, substituído em 1998 por um fixo, que veio agravar ainda mais os custos astronómicos do complexo (1,5 mil milhões de dólares). O centro de natação continua em funcionamento, ao passo que o velódromo acolhe um jardim zoológico (Biodôme), em torno do qual surgiram outros espaços dedicados às ciências da natureza. É uma reconversão que faz todo o sentido, quando os edifícios de 76 são uma espécie de apoteose monumental do emprego do betão como matéria plástica, declinado em prodigiosas formas orgânicas.

Mão cheia de cultura

Toronto pode ter o dinheiro e Vancôver terá a fotogenia, mas Montreal é hoje seguramente a cidade mais cultural do Canadá. É uma tendência vincada desde os inícios dos anos 90, quando o colapso da economia tradicional levou as novas gerações a apostarem mais forte no campo das artes e do audiovisual. As suas raízes remontam, no entanto, aos anos 60 e à Revolução Tranquila (como quase tudo o que vale a pena na cidade francófona). Dessa época de reformas data a criação do Bairro dos Espectáculos, no então decadente quadrante centro-sul. Hoje acolhe 30 salas de espectáculos, numerosas galerias de arte e muitos mais comércios alternativos.

--%>