E se fizéssemos umas costeletas de borrego panadas com farinha de castanha? Ou uma mousse com cogumelos shitake? Ou então um pudim com boletos? Descobrir sabores do Alto Alentejo e misturar produtos que à primeira vista parecem não ter a ver uns com os outros foi o desafio lançado a vários chefs portugueses pela Terrius, empresa que tem vindo a recuperar produtos que estavam ameaçados, e pela Ader-Al, Associação para o Desenvolvimento em Espaço Rural do Norte Alentejo. O resultado é o livro de receitas Sabores do Alto Alentejo na sua Cozinha (em português e inglês) disponível em ebook e pdf no site da Terrius.
“Embora a farinha seja algo que há muito tempo não se fazia, tanto ela como as costeletas de borrego são dois produtos tradicionais daquela região e que deram um casamento perfeito”, conta, entusiasmada, Rita Beltrão Martins, da Terrius. Essa receita, que está no livro, foi uma das criadas nos workshops organizados no âmbito deste projecto e que reuniram, entre outros, chefs como Miguel Laffan do L’AND Vineyards, em Montemor, Pedro Mendes, do Marmòris, em Vila Viçosa, António Nobre, dos Hotéis M’AR de AR, em Évora, Renato e Dalila Cunha, do Ferrugem, em Famalicão, Leonel Pereira, do São Gabriel, Almancil, ou Henrique Mouro.
A ideia partiu da Terrius e entusiasmou a Ader-Al. O objectivo era chegar a cozinheiros e a responsáveis pela área de alimentação nos hotéis e restaurantes para, através deles, chegar ao consumidor final e dar-lhe a conhecer os produtos. “São produtos pouco usados”, explica Rita. “Alguns até são conhecidos, mas acabam por ser pouco utilizados. Há o problemas dos preços, as dificuldades de transporte…”.
Há bastante tempo que a Terrius, que tem a sua base no Parque Natural da Serra de São Mamede, tem vindo a lutar contra o que outros vêem como uma inevitabilidade: o desaparecimento de determinados produtos DOP (com denominação de origem). Apostou na recuperação da castanha de Marvão e da maçã de Portalegre variedade Bravo de Esmolfe, apresentando-as frescas, desidratadas ou em farinha. Mas tem outros produtos, dos cogumelos à bolota (a mais recente novidade é a farinha de bolota), do pimento de piquilho aos cardos silvestres.
Quando se reuniam para os workshops — que aconteceram em Lisboa, Porto, Faro e Alentejo —, os chefs encontravam à sua disposição, para criar novas receitas, estes produtos da Terrius, e, ao lado, os produtos tradicionais da região, do borrego do Nordeste Alentejano ao queijo mestiço de Tolosa, passando pela salsicharia de Portalegre. Depois foi começar a criar. A Fugas assistiu a um destes encontros, no Hotel M’AR de AR, no qual o chef António Nobre reuniu muitos outros cozinheiros da região e de onde saíram pratos surpreendentes, como a já referida mousse de cogumelos shitake.
Um exemplo de um prato (receita também disponível no livro) que, sendo muito simples, consegue reunir, e valorizar, vários destes produtos é o hambúrguer Terrius, criado por Renato e Dalila Cunha, que leva Carnalentejana, mostarda de pimentos, pickles de cardos e espargos silvestres, queijo de Nisa e pão de boletos.
“Nós queríamos exactamente isso, ser surpreendidos pelos chefs”, diz a responsável da Terrius. “Houve pratos completamente inovadores e houve também a mistura de utilizações tradicionais com as mais modernas, como o cozido de grão feito com cogumelos, os muffins feitos com tomate seco ou com farinha de maçã ou o tomate seco misturado com o queijo de Nisa. Podemos manter o tradicional do receituário, mas introduzir pequenas inovações.”