Fugas - restaurantes e bares

  • Paulo Barata
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  • Os chefs, da esquerda para a direita: Matteo
Ferrantino (Vila Joya, Algarve), Henrique Sá Pessoa
(Alma, Lisboa), Pedro Pena Bastos (Esporão,
Alentejo), Maria João Malheiro (Confeitaria do
Alvor), João Oliveira (Vista, Praia da Rocha,
Portimão), Leonardo Pereira (ex-Areias do Seixo)
e Manuel Maldonado (projecto Ostraria)
    Os chefs, da esquerda para a direita: Matteo Ferrantino (Vila Joya, Algarve), Henrique Sá Pessoa (Alma, Lisboa), Pedro Pena Bastos (Esporão, Alentejo), Maria João Malheiro (Confeitaria do Alvor), João Oliveira (Vista, Praia da Rocha, Portimão), Leonardo Pereira (ex-Areias do Seixo) e Manuel Maldonado (projecto Ostraria) Paulo Barata

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Boga, tainha e champanhe?

Mas regressemos ao jantar e ao primeiro prato que foi servido: lírio dos Açores, trabalhado por Matteo Ferrantino, com diferentes texturas de couve-flor e gengibre, numa composição que parecia um quadro e em que, apesar dos sabores fortes, o lírio, em fatias finas, brilhava, mostrando todo o seu potencial.
Nos Açores a pesca de arrasto é proibida, explicou Pedro Bastos e perto de 80% das capturas de lírio, um peixe cada vez mais “na moda”, são feitas precisamente em águas açorianas. “É pescado à linha e está neste jantar porque é importante promover a pesca artesanal”.

Leonardo Pereira pegou no camarão da costa, pescado no Algarve a grande profundidade, e serviu-o num “prato de coisas cruas”, como ele próprio o descreveu, com capuchinhas, dióspiro e um molho feito com “tripas de peixe rei preservadas durante sete meses”. O resultado foi um conjunto de sabores intensamente verdes intercalados pela doçura do dióspiro e uma outra doçura diferente, a das gambas.
Apesar de este camarão estar na lista vermelha de espécies em risco da Greenpeace, Pedro Bastos tem um argumento para o incluir: “É pescado a 30 milhas do hotel, enquanto nós andamos a importar marisco de todo o mundo.”

Henrique Sá Pessoa apresentou um prato que tem na carta do Alma, choco com puré de ervilhas e caril verde num caldo de galinha. Seguiu-se um prato que vinha apresentado como “bacalhau português” e que era, na realidade, abrótea. O que Pedro Bastos queria provar com a escolha deste peixe é que a paixão que os portugueses têm por bacalhau, que obriga a importá-lo em enormes quantidades, poderia ser, pelo menos em parte, canalizada para algum entusiasmo relativamente à abrótea, que tem bastantes semelhanças com o peixe vindo das águas frias do Norte.

“É considerada o bacalhau do Sul da Europa e é da mesma família, os gadiformes”, esclarece. “Temos aqui um peixe que é fascinante e é português. E ignoramos o nosso bacalhau”. Coube a Pedro Pena Bastos, do Esporão, a tarefa de realçar essas semelhanças e fê-lo tratando a abrótea inicialmente com uma breve cura de sal, para lhe dar maior firmeza (como se faz no Algarve com a abrótea arrepiada), e servindo-a com um fundo de peixe ligado com natas e champanhe.

Mais difícil foi o desafio feito ao chef anfitrião João Oliveira. Coube-lhe a boga, um peixe pelo qual alguns dos presentes confessaram não ter grande simpatia. “É difícil de comercializar porque é um peixe que se degrada rapidamente”, segundo Pedro Bastos. “Mas é da família dos sargos, safios e besugos e se estes são bons…”.

João Oliveira recheou-a com funcho e criou um molho de alcaparras com um creme de natas e cebolas caramelizadas – sabores intensos para um peixe que também os tem e que se revelou o menos consensual da noite.

Por fim chegou à mesa a sobremesa de castanha, clementina e cacau, inspirada pelo Outono – um trabalho de Maria João Malheiro, jovem chef de pastelaria que trabalhou em Paris com Alain Passard (3 estrelas Michelin) e em Portugal no Ocean (2 estrelas), o restaurante do Vila Vita Parc, e que acaba de abrir a sua Confeitaria de Alvor.
Foi ela também responsável pelos irresistíveis pães de sementes, algas e centeio que foram devorados por todos, acompanhados por uma surpreendente manteiga, trazida pelo chef do Esporão, envelhecida durante 30 dias.

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