Fugas - restaurantes e bares

Nestes jantares-guerrilha, o mundo é um palco com comida

Por Alexandra Prado Coelho (texto) Vera Moutinho (vídeo)

Num palacete abandonado da Praça da Alegria, em Lisboa, regressa-se às “festas decadentes” dos anos 20. É o resultado de uma parceria dos dinamarqueses Silver Spoon com o Ritz.

São oito da noite e à porta de um prédio habitualmente abandonado da Praça da Alegria, em Lisboa, juntam-se pessoas vestidas a rigor – homens de fato completo, mulheres com colares de pérolas, vestidos de lantejoulas e plumas nos cabelos. Regresso aos anos 20 do século passado num palacete meio arruinado?

Nas janelas, bonecos pintados, como se fossem moradores, alertam para o problema dos prédios vazios em Lisboa erguendo cartazes onde se lê “Casas sim, despejos não!” e “Dá-lhes luta”. Mas, durante quatro dias (um deles de apresentação, ao qual assistimos), o prédio habitualmente silencioso enche-se de vida para um dos jantares temáticos que os Silver Spoon – Guerrilla Dining têm vindo a organizar em Lisboa. Desta vez (de sexta a domingo, com o preço de 95 euros) o tema são os anos 20 e a ideia de que “o mundo é um espectáculo” onde todos somos actores.

Quem frequenta os jantares dos Silver Spoon – a principal criadora deste conceito é a norte-americana a viver na Dinamarca, Tiffany Ng – sabe que vai entrar numa encenação, sempre com um tema diferente, e assume-se como actor do que quer que seja que vá acontecer. O tema é conhecido – neste caso o jantar tinha como título All The World’s a Stage, frase da peça de Shakespeare As You Like It (Como Vos Aprouver) – mas o local é mantido secreto até 24 horas antes do primeiro jantar.

“Começamos com o conceito e isso implica sempre algum tempo”, explica Tiffany. “Damos dois passos em frente e um atrás até sentirmos que temos realmente a essência da história que queremos contar.” A seguir é preciso encontrar o espaço certo. Para os jantares desta semana viram mais de trinta possibilidades até escolherem o Palácio São Miguel, no número 9 da Praça da Alegria. Encerrado desde que a loja de design que aqui existia saiu, o palácio tem pedaços do tecto a cair, rachas nas paredes, vidros partidos, mas mantém um charme de aristocrata decadente.

“Começámos a construir aqui há uma semana e meia”, conta Tiffany. “Ou melhor, começámos a deitar a baixo e a fazer a decoração como se fosse a casa de alguém”. Na primeira sala, onde foi preciso destruir parte de uma parede e onde agora funciona o bar que serve cocktails, há mesas e cadeiras vintage espalhadas, mas é preciso atenção ao chão, para não tropeçarmos em alguma viga solta. Num canto, uma árvore despida de folhas. E, por todo o lado, velas. Numa sala ao lado servem-se peças de xadrez e fichas de poker comestíveis, feitas de foie-gras, cacau e nozes pecan ou de parmesão e húmus.

É neste cenário que se movem os actores voluntários – os jantares Silver Spoon são para membros do grupo. “Sim, para vir tem que se ser membro”, confirma a responsável. “Queremos construir uma comunidade e as pessoas voltam sempre que fazemos mais um evento em Portugal. Telefonam umas às outras e dizem ‘vêm aí os Silver Spoon, vamos?’. Aqui conhecem-se pessoas novas e tem-se uma experiência diferente.”

Para se ser sócio, basta ir ao site dos Silver Spoon e apresentar uma candidatura. “Gosto sempre de dizer que somos exclusivos mas não elitistas. Não é uma questão do que se faz na vida ou quando dinheiro se tem, mas se se pode contribuir com algo de interessante para a conversa ao jantar. Quando as pessoas juntam as suas diferentes experiências de vida é quando a magia acontece”, sublinha Tiffany.

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