Fugas - restaurantes e bares

  • Jose Haro
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Quique Dacosta: Um restaurante excepcional que vale a viagem

Houve quem dissesse que, apesar da depuração, estava-se perante uma espécie de sinfonia gastronómica, o que não deixava de ser uma prova de coragem, dado que chegava em contra-corrente com a ideia de uma cozinha mais simples e directa procedente do Centro e Norte da Europa. Acontece que a aposta do chef espanhol viria a dar frutos, dado que em Novembro de 2012 o restaurante conquistava a tão desejada e difícil terceira estrela Michelin.

Experiência sem fronteiras 

A viagem no restaurante de Quique Dacosta começa pelo jardim. É neste local que somos recebidos e é aqui que chegam os primeiros snacks, enquanto se toma um aperitivo. A razão desta antecâmara parece óbvia: quebrar o gelo, descontrair e aproveitar o início de noite cálida própria de um lugar à beira do Mediterrâneo. 

O menu da presente temporada dá pelo nome “Fronteiras” e continua estruturado por actos. Porém, o número de propostas diminuiu (são agora cerca de 30), ainda que contenha mais pratos e menos tapas. Como alternativa, mantém-se o “Universo Local”, o menu que reúne pratos emblemáticos de épocas anteriores (ambos custam 199€ + 99€ com a opção de harmonização vínica). Dacosta apresenta a nova temática como uma construção a partir de uma linha de diálogo entre o seu território local e o de outras culturas trazidas das suas viagens pelo mundo.

E o que acontece quando se visita o restaurante pela segunda vez, em menos de três anos? Será possível continuarem a surpreender-nos? Uma experiência anterior memorável faz aumentar a expectativa. E também o receio.

As propostas iniciais vão chegando a bom ritmo. Alcachofras fritas, uns delicados buñuelos (sonhos) de bacalhau, palitos de carvão falso (feitos a partir de merengues de pimento) com molho pericana, piadina de milho fermentado com lâminas de atum fresco e um intenso aspic de ouriços do mar e lagostins são alguns dos snacks do novo menu. Tudo parece bem feito, com sabores delicados e intensos em harmonia. Não arrasa, mas está a um nível muito elevado. 

Passamos ao interior e somos conduzidos não à sala mas à cozinha, onde Quique Dacosta e Juanfra Valiente, o responsável de criatividade, nos recebem na novíssima sala privada, que durante o dia funciona como cozinha de investigação e à noite se transforma em mesa do chef. O privilégio é grande mas e se as expectativas saírem goradas, como se disfarça o desalento? 

O primeiro prato dissipa de imediato qualquer sentimento de apreensão. Trata-se de um turrón de amêndoa em que folhas de papel comestível (como no turrón de Alicante) cobrem um conjunto constituído por uma gamba (praticamente crua), pedaços de amêndoas, um outro de alho francês e uma gelatina de molho teryaki. Por cima há ainda um pontilhado de creme de amêndoa e pétalas de flor do fruto seco. Resultado: além dos sabores bem definidos e do exemplo perfeito de uma ligação entre Ocidente e Oriente, a conjugação de todos os elementos no prato é de extrema delicadeza. 

Passamos ao segundo acto. Quique Dacosta pousa as mãos sobre uma alga kombu gigante e deixa-as ficar por uns segundos. No meio estão quadrados de barriga de atum rabilho com o seu característico marmoreado de gordura a revelar a qualidade ímpar. A ideia é passar o calor da mão ao peixe de forma a acentuar o seu sabor elegante e ligeiramente doce. Elegância é o termo que se pode também utilizar para falar das ovas de tainha e de maruca com uma ligeira cura em sal. Dacosta apresenta esta última (com cerca de 30cm de comprimento) e levanta a “tampa” cortada no topo, como se fosse um queijo de pasta mole. Depois, com uma colher, retira um pedaço do interior e serve em cima de um papari.

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