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A lampreia, das pesqueiras do rio Minho ao tacho de Ana Luísa

Por Alexandra Prado Coelho

Estamos na época da lampreia e em Melgaço garantem que a da região é a melhor, mais musculada por ter nadado rio Minho acima. Este ano têm aparecido poucas nas redes que os pescadores colocam nas pesqueiras. Fomos conhecer esta arte de pesca, mais antiga do que as memórias de quem a pratica.

Ninguém diria que o senhor António tinha tanta agilidade. Mas assim que se sentou no carrinho improvisado — uma tábua de madeira com um ferro de cada lado presos a um gancho que desliza por um fio de metal — parecia um campeão de uma nova modalidade desportiva. Zás, zás, zás, quase deitado, com a ajuda das mãos agarradas ao fio, fez o carrinho deslizar rapidamente por cima do rio Minho até à pesqueira. Num piscar de olhos já estava do outro lado.

O meio de transporte é uma invenção recente, ao contrário das pesqueiras, cuja origem se perde na história — as primeiras referências documentadas são do século XII. Podem ter sido feitas pelos povos castrejos que habitavam as margens do rio Minho e que já trabalhavam a pedra e o ferro. O que se sabe é que eram utilizadas pelos romanos da mesma forma como continuam a ser utilizadas hoje, para a pesca daquela que é considerada uma das maiores iguarias da região: a lampreia.

São estruturas em pedra, relativamente altas, de um lado e do outro do rio (ou seja, do lado português e do espanhol). É para essa zona mais alta, o piau, que sobem os pescadores para puxar as redes. Entre uma e outra construção, existe o rabo da pesqueira, um conjunto de pedras que forma um obstáculo a meio do rio, impedindo a subida das lampreias.

Os peixes são obrigados a desviar-se, procuram a zona mais favorável para continuar a subida e é precisamente aí que encontram a rede ou botirão. Entram por um canal central e depois passam para outra zona da qual já não conseguem sair, enredando-se na rede. É durante as noites frias de Inverno que António faz as redes. “Ponho-me em casa à quenturinha do fogão e faço crochet”, conta. “Aprendi porque estava no café e via outros a fazer. Inventei até que deu certo”, diz, enquanto explica como são feitos os nós, a distância a que têm que ficar uns dos outros e como se vai aumentando a boca da rede para a lampreia poder entrar.

Estamos em Alvaredo, próximo de Melgaço, com dois pescadores de lampreia, António Araújo, mais velho, e Diogo Castro, que tem 29 anos mas herdou dos tios o gosto por vir até ao rio ver se há lampreias. É uma tradição das gentes daqui desde sempre, inicialmente sobretudo por razões de sobrevivência — no tempo em que, nestes primeiros meses do ano, o rio se enchia de lampreias, quem vivia aqui comia lampreia dia sim, dia sim.

Hoje é diferente. A lampreia, um animal que desperta ódios e paixões — ou se adora ou se detesta, dizem-nos todos com quem falamos —, tornou-se um ícone gastronómico do Minho, encareceu (os pescadores estavam a vendê-la a 25 euros e os restaurantes por vezes a 70 euros) e estamos precisamente nos três meses de degustação de lampreia do rio Minho (entre 15 de Janeiro e 15 de Abril, aos fins-de-semana, nos restaurantes da região).

O problema, explicam António e Diogo, é que este ano há muito pouca lampreia. As redes que são colocadas nas pesqueiras estão muitas vezes vazias quando eles aqui chegam de manhazinha cedo. Há pouco peixe a subir o rio para vir desovar. Isto porque não choveu o suficiente durante o Inverno, não houve cheias, e as lampreias que andam no mar não apanharam as correntes de água doce que as trazem até ao rio Minho.

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