Fugas - Viagens

Luís Maio

Vicenza - A cidade de Palladio

Por Luís Maio

Depois da febre industrial, Vicenza descobriu Palladio e tornou-se no sítio com maior concentração de obras classificadas da UNESCO. A Fugas visitou a cidade-berço do estilo de arquitectura mais popular no mundo inteiro

Toda a gente conhece a arquitectura palladiana, mesmo sem nunca ter posto os pés em Itália, ou sequer ouvido falar de Palladio (1508-1580). A influência da sua obra transcendeu épocas e fronteiras, convertendo-o no único autor que deu nome a um estilo de arquitectura. Um estilo que enformou a construção de todo um escol de edifícios majestosos nos séculos XVII e XVIII, desde o Palácio de Inverno de São Petersburgo, na Rússia, até Monticello e a Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos, passando pela Stowe House, no inglês Buckinghamshire.

O palladianismo persistiu inclusive depois do surto neoclássico, uma constância ilustrada por obras monumentais muito posteriores, como a National Gallery de Washington (1941), ou o mais recente palacete construído pelo magnata Muni El-Masri na Palestina (2000). Portugal não é excepção: o modelo palladiano reconhece-se na maior parte das obras de vulto pós-terramoto, como sejam o portuense Palácio da Bolsa ou o lisboeta Teatro D. Maria II, prevalecendo depois em edifícios públicos como o da Câmara Municipal de Lisboa e o Palácio de São Bento.

O palladianismo é, portanto, universal e duradouro, pelo menos até prova em contrário. Já a actividade de Andrea Palladio se concentrou na área de Vicenza de meados do século XVI, então no centro da expansão interior e agrícola da República de Veneza (por reacção ao declínio do Mediterrâneo, motivado pelos Descobrimentos). A maior parte dos edifícios que projectou ao longo de quatro décadas de actividade conservam-se de pé, contando-se 23 na cidade de Vicenza classificados como Património da UNESCO, desde 1994. Vinte e quatro villas rurais ganharam a mesma distinção, dois anos depois, 16 na mesma região vicentina e o resto nas imediações.

A extraordinária concentração de obras de Palladio faz de Vicenza o lugar com maior número de monumentos protegidos do planeta e isto por causa de um único autor. Daqui também já se depreende que o maior atractivo da cidade no coração da região do Veneto é justamente Palladio, seja pelas obras que produziu seja pelas muitas mais que inspirou. Porque se no centro histórico da cidade nem tudo é obra dele, duplos e derivados estão um pouco por toda a parte, enquanto nas redondezas se contam nada menos de quatro mil villas de factura Palladiana. Nem sempre resulta fácil distinguir os originais das cópias e até pode acontecer gostar-se mais destas que daquelas.

A fama universal de que o arquitecto nascido em Pádua e fixado em Vicenza veio a auferir deve-se a fãs tão célebres como o escritor alemão Goethe e o arquitecto inglês Inigo Jones, mas sobretudo ao sucesso do seu tratado Os Quatro Livros de Arquitectura (1570). Há mesmo quem defenda que a sua obra não foi nem melhor nem pior que a de tantos outros arquitectos da Alta Renascença, tal como ele apostados em ressuscitar os modelos da Antiguidade. A grande diferença, nesta perspectiva, é que ele sistematizou como ninguém os princípios desse generalizado regresso aos clássicos.

O certo é que a "palladiomania", ou melhor, a reconversão de Vicenza na cidade de Palladio é francamente tardia. Na verdade, a cidade viveu a maior parte do século XX investida no desenvolvimento industrial (o famigerado "milagre italiano") e só inflectiu para a exploração do filão palladiano com a candidatura à rede UNESCO em 1994.

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