Fugas - Viagens

Continuação: página 2 de 5

Pontevedra é muito mais do que um caminho

Nada correu como previra. Alfonso estava a passar uma temporada em Barcelona, o bar encerrado para balanço, a verdade é que a noite acabou de manhã e voltámos a casa com a certeza de termos feito uma descoberta improvável.

- É parecido com Guimarães -  lembro-me de alguém ter dito.

É um defeito comum a várias gerações, compararmos o que vemos ao que já conhecemos, ajuda-nos a manter o sentido de orientação. Acabaria por regressar à cidade uma série de vezes ao longo destes dez anos – de dia, com outros olhos, com idade e distanciamento suficientes para perceber que Guimarães tem um património com que a cidade galega dificilmente conseguirá ombrear, apesar de mais populosa (cerca de 52 mil “contra” 82 mil habitantes) –, ainda assim, ainda hoje não consigo deixar encontrar algumas semelhanças entre ambas. E quem diz Guimarães diz Viana do Castelo ou a parte antiga de Braga. Além da arquitectura, da História, da proximidade geográfica, do tempo e da língua, parece haver um fio sentimental que une estas cidades e as torna muito mais próximas entre si do que com as respectivas capitais.

Mas depois há os finais de tarde. A vida de rua. É aí que Pontevedra bate as cidades nortenhas aos pontos. É aí que Espanha bate Portugal aos pontos. Naquele período morto que os portugueses passam na estrada e os espanhóis vivem na rua. (Não haverá mais comparações ibéricas a partir deste parágrafo). Uma constatação também ela pouco original e mil vezes repetida, mas uma realidade demasiado forte para que possa ser ignorada. Sobretudo numa cidade de província – e é sabido que nas cidades de província é suposto nada acontecer.

Se à noite todos os corpos parecem caminhar em direcção à calle Charino, rua em que há quase um bar em cada porta, a mesma onde me perdera há cerca de uma década, ao final da tarde todos os caminhos vão dar às praças do centro histórico.

- Diz-me um sítio onde nos possamos encontrar para comer umas tapas ao final da tarde, proponho a Alfonso no primeiro dia desta minha nova incursão pela cidade. Era essa a condição. Ele trabalhava, eu vivia como um espanhol na sua própria casa.

- Escolhe um café no centro e depois envia-me uma mensagem a dizer onde estás, respondeu-me.

- Um qualquer?

- Sim, um qualquer. Para tapear os bares do centro são todos bons.

- Tens a certeza?

- Tenho.

Assim fiz e escolhi o Rianxo, na Plaza de Leña.

- É fantástica, esta praça, não é? Dá vontade de levá-la para casa.

Desta vez as palavras vêm em língua portuguesa: Maria José e António, dois lisboetas com quem partilho a esplanada por mero acaso. Estão apenas de passagem, claro está.

“Vimos à Galiza pelo menos duas vezes por ano, uma a Santiago de Compostela e outra a Baiona, temos lá amigos, mas esta é a primeira que passamos por Pontevedra. Íamos na auto-estrada, vimos a placa e dissemos, porque não?”

Não sei se chegaria ao ponto de levar a Plaza de Leña para casa, mas seria nesta praça que procuraria casa se por qualquer razão ou acaso acabasse a viver aqui. Uma pequena praça onde, na Idade Média, se comercializava toda a lenha que aquecia e alimentava as habitações e cozinhas da cidade. A praça mais fotografada de Pontevedra, rezam os guias. O lugar perfeito, mais do que um lugar comum. Casas em granito com varandas em madeira, balcões recheados de flores, arcadas, esplanadas com cadeiras em madeira e um cruzeiro do século XVI bem no centro, no coração da praça. As mais distintas características da cidade parecem ter sido reunidas aqui.

--%>