Fugas - Viagens

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Birmânia, para quem ainda sonha com o paraíso

Naturalmente, é enorme a pressão das grandes cadeias de hotéis, cujos restaurantes, como pude comprovar, se encontram às moscas. E, confortavelmente sentado, delicio-me com a comida preparada pelo irmão de Min Ye Tun e decorada com requinte pela mãe, enquanto pouso olhares na delicadeza dos gestos do gerente para com os clientes e no disco laranja que se prepara para mergulhar nas águas dóceis do mar, cujo marulho continuo a escutar, pela noite dentro, no interior do meu quarto com uma frondosa varanda sem janelas.

E chegamos ao paraíso

O chilreio dos pássaros é o primeiro sinal da manhã que rompe bonita, de um céu teimosamente azul. Caminho para o extremo oposto aos restaurantes e deixo-me embalar pela indolência dos pescadores reparando as suas redes, pela beleza das imagens de um cenário magnificente, o fumo insinuando-se por entre as palmeiras, os meninos brincando junto às suas cabanas, um mundo tão distinto do mundo que se esconde para lás das portas dos grandes hotéis. São barbearias de um tempo que não é deste tempo, pequeno comércio de um tempo distante, sorrisos de um tempo ainda mais longínquo. E, já com o sol subindo no céu recortado por palmeiras de um verde intenso, sigo o rasto provocado pelo barco que sulca as águas a caminho da Paradise Beach, a menos de uma hora de Ngapali.

Uma mulher que não se cansa de sorrir coloca um chá à minha frente, o filho brinca com um carrinho de plástico, as galinhas andam por ali, à volta da única casa que se avista, o marido trabalha nas plantações e a outra filha, de seis anos, está na escola e vive permanentemente com uma tia na aldeia, visitando os pais e o irmão apenas nas férias. A casa não lhes pertence mas o proprietário concedeu-lhes o direito de explorar a terra, sem nada exigir em troca. As ondas beijam suavemente as areias, respira-se o silêncio e o ar puro. No cimo de uma montanha, um buda resplandece ao sol. Não há um único turista por perto.

- Há dias em que não aparece ninguém. Às vezes, um ou dois barcos por dia. Vivemos muito felizes aqui, não sentimos falta de nada. Quando precisamos de peixe ou de alguma outra coisa, vamos à aldeia. Mas é muito raro.

Su Cha admite que, no início, o filho tinha medo dos turistas quando se acercavam da praia. Mas já se habituou à sua presença. Pergunto quanto devo pelo chá. Não tenho nada a pagar. O chá faz parte da hospitalidade birmanesa. O filho, Zua Man, segreda qualquer coisa à mãe. Ela sorri. “Ele diz que gosta de nadar e da praia. Mas não gosta de biquínis.” Ambos, sorridentes, me acenam à despedida e, ao fim de uma hora, avisto Ngapali com as suas palmeiras, o seu céu sempre azul, as suas águas límpidas, as suas areias brancas. Na água, uma monja brinca com um grupo de crianças felizes. Todos estão vestidos.

GUIA PRÁTICO

Como ir

São múltiplas as opções para chegar a Rangum, cidade que não tem ligações aéreas directas com Portugal. Com um pouco de paciência — e grande antecedência — pode encontrar voos entre a capital portuguesa e Kuala Lumpur (Malásia) ou Banguecoque (Tailândia) por cerca de 700 euros, devendo fazer uma pesquisa demorada nos sites das companhias Air France, KLM, Lufthansa, Qatar Airways ou Emirates, sendo que esta última, com uma única escala, no Dubai (a Lufthansa, a KLM e a Air France efectuam também apenas uma paragem), oferece quase sempre as melhores condições. A Qatar Airways é uma alternativa a ter em conta mas obriga o viajante a passar por Madrid ou Barcelona antes de viajar para Doha e, desde a capital qatari, para Kuala Lumpur ou Banguecoque. Uma vez numa destas cidades (Singapura é igualmente uma hipótese a considerar mas por norma mais cara), a companhia low-cost Air Asia ou mesmo a Malaysia Airways voam para Rangum por cerca de 100 euros (ida e volta), mais ou menos o mesmo valor que terá de pagar para um voo (por percurso) entre a antiga capital birmanesa e Thandwe, a escassos quilómetros de Ngapali Beach.

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