A visita está a chegar ao fim mas não termina sem uma breve incursão pela ala das traseiras, construída já no início do século XVII, depois da morte do pai de William Shakespeare, numa fase em que a casa funcionou como estalagem, e pela cozinha e arrecadação, também erguidas nessa altura, com o seu forno e um cesto de carvão em brasa e alguns tipos de alimentos que o escritor terá conhecido. Nada disto parece atrair uma criança que caminha pela mão dos pais mas que, uma vez no exterior, se detém demoradamente a observar um mural que, aos olhos dela, se assemelha a um livro de banda desenhada. E por ali vai ficando, percorrendo com o olhar toda a sua extensão. A mãe admira as flores, o pai admira o interesse do filho. “Sábio é o pai que conhece o seu próprio filho.”
Uma jovem, de perna cruzada, respira os prazeres da manhã, a ler um livro, bem próxima do bar anexo à casa onde nasceu William Shakespeare. Um homem, sorridente, de boina vermelha cobrindo-lhe o pouco cabelo, pega num violão e começa a dedilhar nas suas cordas, tornando a atmosfera ainda mais especial. Afinal, este também é um bom lugar para, substituindo a creche, depositar maridos. “O casamento faz de duas pessoas uma só, difícil é determinar qual será.” Assim pensava o bardo de Avon.
GUIA PRÁTICO
Como ir
A Air France voa entre Lisboa e Birmingham, com uma escala em Paris de aproximadamente três horas, por cerca de 270 euros (ida e volta). O aeroporto daquela cidade é o mais próximo de Stratford-upon-Avon, podendo efectuar o trajecto entre as duas, de comboio, com a National Rail, em uma hora e meia (cerca de 15 euros por percurso) ou de autocarro, com a National Express, por menos de dez euros, embora com dois inconvenientes: uma mudança no terminal de Birmingham e não menos de duas horas e meia para chegar a Stratford-upon-Avon. Como alternativa, pode recorrer ao aeroporto de Bristol, mais distante da cidade de Shakespeare mas por vezes (é importante calcular o valor gasto em autocarro, já que entre Bristol e Stratford, por exemplo, não paga menos de 70 euros por viagem) com preços mais em conta. Em Junho, a easyJet proporciona tarifas para um voo de ida e volta entre a capital portuguesa e Bristol próximas dos 110 euros.
Quando ir
A melhor altura para viajar no Reino Unido é durante os meses de Verão, especialmente entre Julho e Agosto, no período em que se regista também uma maior afluência de turistas, com implicações na subida generalizada dos preços. A altura da Páscoa (há sempre um grande número de estudantes a visitar Stratford-upon-Avon na época de férias), Maio, Setembro e início de Outubro são outras hipóteses a considerar.
Onde comer
Uma das formas de se poupar algum dinheiro é prestar atenção aos menus que os restaurantes proporcionam nas horas que antecedem uma ida ao teatro. Uma das ruas mais populares em Stratford-upon-Avon é a Sheep Street, a mesma que abriga um dos mais conceituados espaços gastronómicos, o Lambs (www.lambsrestaurant.co.uk/), aberto de terça a domingo para almoços e diariamente para jantares, com preços por prato entre os 15 e os 20 euros (e com uma soberba lista de vinhos). Menos sofisticado mas mais atmosférico é o Vintner Wine Bar (www.the-vintner.co.uk/), também na Sheep Street, num prédio de início do século XVII e muito procurado pela população local. Se é adepto de comida asiática, talvez valha a pena experimentar o Georgetown (www.georgetownrestaurants.co.uk/), uma vez mais na mesma artéria e com um toque requintado da gastronomia malaia.
Onde dormir
Para quem, mesmo a dormir, pretende estar intimamente ligado ao escritor, uma das melhores opções passa por alojar-se no Shakespeare Mercure Hotel (www.mercure.com/), na Chapel Street, um edifício elegante de finais do século XV em estilo Tudor, cheio de carácter e uma localização perfeita numa cidade que se percorre facilmente a pé. O hotel, alvo de uma profunda renovação em 2011, ostenta esta designação desde 1782, pouco depois de um grupo de historiadores ter descoberto o seu nome num velho registo. Todos os quartos, num total de 78 e a preços a rondar os cem euros, fazem uma alusão à obra de Shakespeare — pode optar por pernoitar no Otelo, no Romeu, no Julieta e por aí adiante. Hospital e prisão militar durante a II Guerra Mundial, o espaço é igualmente famoso pelo aparecimento de alguns fantasmas — se acredita, o melhor é evitar o quarto 203 onde, alegadamente, Lucy, uma jovem mulher, se enforcou após ser atacada por um homem e, desde então, reza pelo menos a lenda, vagueia por ali de quando em quando. Para bolsas menos favorecidas, a alternativa é o também carismático Albergue de Juventude (www.yha.org.uk/), em Alveston, a dois quilómetros do centro da cidade, na Hemmingford House, uma antiga e sumptuosa mansão com mais de 200 anos, oferecendo um conjunto de facilidades (cantina, bar e cozinha) que pode baixar substancialmente o preço da sua estadia em Stratford. Desde a Bridge Street, no centro, os autocarros 18 e 18ª levam-no até Alveston.
Informações úteis: Os cidadãos portugueses apenas necessitam de passaporte (ou bilhete de identidade) para visitar o Reino Unido. Uma libra esterlina corresponde a 1,2 euros.
A visitar
Se, no Vaticano, turistas, crentes ou nem por isso, desejam ver o Papa, em Stratford-upon-Avon é quase um pecado não assistir a uma das produções de William Shakespeare organizadas pela Royal Shakespeare Company (www.rsc.org.uk/), com preços entre os 10 e os 50 euros (mais em conta para jovens, estudantes e idosos). Em Stratford-upon-Avon existem três teatros, o Royal Shakespeare Theatre (ocupando parte daquele que foi o primeiro, totalmente erguido em madeira pelo actor David Garrick em 1769 e totalmente destruído após dois dias de chuvas torrenciais), o Swan Theatre, ambos em Waterside, e o Courtyard Theatre, em Southern Lane. Se é o tipo de pessoa que nada gosta de perder da vivência de Shakespeare na cidade e arredores, não deve deixar de visitar a Anne Hathaway’s Cottage, em Cottage Lane, Shottery, onde a mulher do dramaturgo viveu antes de se casar — a celebração teve lugar em Worcester, em Canterbury, tinha ele 18 anos e ela 26 (estava grávida da sua primeira filha, Susanna, e mais tarde tiveram gémeos, Judith e Hamnet, acabando este por falecer aos 11 anos, de causas desconhecidas). A pequena aldeia de Shottery está situada a menos de dois quilómetros do centro de Stratford-upon-Avon e, mais distante (cinco quilómetros), na Station Road, em Wilmcote, o viajante encontra outra das reminiscências de William Shakespeare, a Mary Arden’s Farm, a quinta onde a mãe viveu a sua infância, firmemente mantida entre a família e com exibições que retratam a vida do país ao longo dos séculos.