Fugas - Viagens

Malta: Olívia diz que é uma ternura a pequena aldeia do Popeye

Por Sousa Ribeiro (texto e fotos)

As casas rústicas de madeira, com tonalidades fortes, projectam-se sobre as águas da Anchor Bay, um cenário perfeito para crianças e adultos, mas mais para estes últimos que, fazendo uma retrospectiva da vida, viajam através da memória ao encontro do marinheiro rezingão, dotado de um bom coração e de um estômago onde nada mais cabia do que espinafres.

A pequena Sandy corre para os braços da mãe e, escondendo a cara emoldurada por fartos caracóis loiros, não consegue reprimir as lágrimas. De quando em vez, volta a plantar o olhar na direcção de onde saiu Brutus, com os seus óculos escuros, a sua barba negra, o seu fato preto, como um corvo brilhando sob os raios tépidos da manhã. A mãe afaga-lhe o cabelo e o pai fala com ela pausadamente, com uma ternura que parece reflectir-se na expressão de Olívia Palito.

As poucas e inofensivas nuvens ora sobem em espiral, ora se estendem para um e para outro lado, como quem pretende imitar os músculos de Popeye depois de comer mais uma lata de espinafres. Vista do alto do penhasco, espraiando-se para lá das águas revoltas e de diferentes tonalidades de azul de Anchor Bay, a aldeia do marinheiro vive na sua indolência matinal, vozes repercutindo-se sem que se distingam as palavras.

Sandy parece recuperada do susto inicial e fita sem qualquer receio Popeye e Olívia Palito, evitando aquela personagem negra como o carvão que agora se afasta. Os pais não lhe largam a mão, para a tranquilizar.

- Popeye é o nosso herói, garante David Mundy, natural de Liverpool, enquanto Doreen abana a cabeça, dando crédito às palavras do marido.

À hora marcada, com uma pontualidade britânica, Antoine Cauchi, vestido despretensiosamente, vem ao nosso encontro. Sentados numa esplanada, escutando o marulho das águas do Mediterrâneo e o alegre chilrear dos pássaros, vamos assistindo à chegada dos primeiros visitantes do dia, na sua maioria adultos.

- Os mais velhos cresceram com os cartoons do Popeye, há uma ligação sentimental muito forte com o personagem que, sem qualquer exagero, faz parte das suas vidas, das suas recordações da infância e da adolescência.

Ao longe avisto Sandy, ao colo do pai, olhando o azul intenso da baía. Antoine Cauchi, responsável pelo complexo, pede dois cafés ao empregado.

- Durante três ou quatro anos vesti, diariamente, a pele do Popeye. Como é uma figura sossegada, divertida e espontânea, provido de uma linguagem gestual cativante, qualquer criança se sente de imediato tentada a aproximar-se. O mesmo se passa com Olívia Palito e com o seu sorriso dócil mas com Brutus, por ser muito grande e louco, os mais pequenos tendem a antipatizar. No fundo, expressam o mesmo sentimento que nos acompanhava quando começámos a ver os desenhos animados na televisão.

Num tempo em que a tecnologia conquista, de forma inequívoca, os mais novos, Antoine Cauchi mostra-se sensível ao problema, assumindo a dificuldade em atrair as crianças para um cenário que, mesmo sendo uma manifestação óbvia de beleza, com as suas casinhas de madeira projectando-se sobre as águas, nada lhes diz por não estarem identificadas com as histórias do marinheiro.

- Esse é um problema com o qual nos temos debatido nos últimos tempos: por um lado, queremos manter viva a essência da aldeia mas, por outro, sentimos necessidade de evoluir para outros patamares. Terá de haver um equilíbrio e, nesse sentido, temos um plano que, sem descaracterizar a estrutura do complexo, irá permitir que as crianças foquem mais a sua atenção nos personagens através da utilização do iPad.

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