Fugas - Viagens

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O salto quântico dos cruzeiros é um navio inteligente

Pavilhão desportivo, tenda de circo, feira popular, discoteca — e ainda salão de jogos, em recantos da mezanine (vejam-se os matraquilhos, o air hockey, pingue-pongue, e até XBox, onde se pode jogar em rede): “Quisemos criar a melhor experiência para todas as idades”, explica Joshua, o responsável da área de Guest Activities, apresentado como “o cérebro” por detrás da ideia, que tinha de ser “multigeracional” e de “natureza transformativa”.

Recanto multifacetado, portanto, bem junto ao triângulo “radical” — a novidade da queda livre, secundado pelos já habituais nos navios da Royal Caribbean simulador de surf e parede de escalada, de certo modo abrigada pelo urso vermelho gigante, instalação artística que é incontornável referência visual. É aqui que Luís dos Reis, 24 anos, está a trabalhar hoje. “Somos polivalentes. Eu estou no North Star, no Sea Plex, no pára-quedismo, aqui...”. Licenciado em Desporto, desempregado em Portugal, trabalhou em estufas de flores na Holanda até que ouviu falar da feira de cruzeiros de Londres. Foi e ficou. “Pelo menos dois contratos”, define Luís, estreante neste mundo. “Estou entusiasmado, mas ainda há muito a ajustar.”

No vizinho RipCord, tudo já parece bem ajustado. Conseguimos inscrever-nos num dos muitos grupos que fazem com que a fila seja omnipresente ao longo de todo o dia e entrar nesta espécie de linha de montagem de saltos em queda livre que neste segundo dia se tornou numa quase obsessão nossa. Começamos pelo treino, com explicação básica sobre qual deve ser a nossa postura na “queda” (o corpo como peso-morto, braços a desenharem meios círculos ao redor da cabeça, pernas ligeiramente afastadas e queixo levantado) e aprendizagem de sinais de comunicação com o instrutor (dedo levantado significa levantar o queixo, dedos encolhidos significa levantar braços e pernas, por exemplo); passamos pelo vestiário para nos enfiarmos nos fatos de salto, colocarmos óculos, tampões e capacete até desembocarmos nesse convés, mar por diante e a vertigem do vazio por objectivo.

Na antecâmara, o grupo senta-se esperando a sua vez de entrar no cilindro e nós temos a sorte, o azar, de ser dos últimos. A ansiedade sobe, mas desce o medo de perder o controlo do nosso corpo num voo indisciplinado (não pela segurança, pelo ridículo, confessamos, afinal sabemos bem que o exterior é plataforma de mirones). Uma vez a voar, a luta para controlar o corpo é tão grande que só realmente olhamos o mar e o vazio quando subimos com a ajuda do instrutor; e quando achamos que finalmente estamos confortáveis já estamos a dar o salto para sair.

No domingo de manhã, bem cedo, quando abandonamos o Quantum of the Seas o sentimento é semelhante. Agora que os espaços nos começam a parecer familiares e já nos conseguimos mover quase sem olhar as indicações e plantas do navio, somos conduzidos à saída. Tal como se tivéssemos tido um treino de preparação para usufruir deste navio — ou melhor, desta “experiência de férias”, como preferem os responsáveis — a 100%. Quem se atreve?

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